O desmonte do Brasil avança a passos largos
A arrecadação federal despenca, a
indústria definha e o desemprego galopa, enquanto o governo Temer se desfaz do
patrimônio nacional.
Pedro Parente, presidente da Petrobras,
já pode comemorar a queda de nossas reservas para o nível de 2001, após a venda
de ativos e a contração dos investimentos em exploração e produção de óleo.
A cada dia que passa, a cada medida que
adota, o governo Temer mais assume, agora sem rebuços, seu projeto mesquinho de
desestruturação do País, por meio do desmantelamento do Estado e da
desconstrução da economia nacional, a serviço de interesses internacionais e do
rentismo. A política recessiva, o neoliberalismo, o monetarismo arcaico não são
fins em si, mas instrumentos de que se vale o situacionismo para destruir o que
ainda sobrevive de projeto de desenvolvimento.
A arrecadação de tributos federais teve
uma queda de 3% em 2016, em comparação com 2015, e o declínio não foi maior
graças ao ingresso dos 46,8 bilhões de reais advindos da receita extra de
impostos e multas da repatriação de recursos ilegais de brasileiros no
exterior. Posta de lado essa receita, a queda sobe para 6%. Na comparação entre
dezembro de 2016 e dezembro de 2015, a queda foi de 1,19%. A retração no início
de 2017 superou 10%, mantendo a expectativa de contração no ano.
Dessa forma, a arrecadação cai pelo
terceiro ano consecutivo e retorna ao nível de 2010. As principais quedas se
dão entre os maiores empregadores de mão de obra, a saber, no comércio, na construção
e na indústria, cujo faturamento caiu 12,1% em comparação com o ano passado.
E o ajuste fiscal?
Enquanto a receita míngua crescem as
despesas. As contas do governo ficaram no vermelho pelo terceiro ano
consecutivo, com um déficit primário de mais de 154 bilhões em 2016, o maior
rombo desde 1997, resultado do aumento de despesas na ordem de 7,2% em 2016
sobre 2015.
A estimativa de crescimento de 0,5% do
PIB foi revisada pelo Fundo Monetário Internacional para 0,2%, e pode ser ainda
menor, enquanto a dívida das famílias cai na proporção em que sobe o gasto com
seu pagamento. O crédito encolhe, o peso dos juros sobe de 41% (média de 2014)
para 48% (novembro de 2016) e a taxa média dos juros ao consumidor chegou a
71,9% no final do ano passado. A contração da economia até 2016 chegou a 9%.
Os reflexos nas vendas do comércio de
varejo são visíveis e imaginável é a queda das encomendas à indústria, com seu
rol de consequências que começa com o desemprego, crescente. Já chegou a 15% e
pode, até o final do ano, atingir 20%. Só no ano passado, foram eliminados três
milhões de empregos com carteira assinada, o que significa três milhões de
famílias de trabalhadores no desespero.
Os Estados, já em crise, enfrentando
quedas crescentes de receita, são, ainda, apenados pela União com a cobrança de
uma dívida pelo menos discutível.
Na impossibilidade de privatizar de uma
só vez a Petrobras, o governo cuida de fragilizá-la ao limite de renunciar às
expectativas do Pré-sal, a maior descoberta de petróleo do planeta nos últimos
30 anos. Parte para a venda fatiada, na Bacia das Almas, de ativos
valiosíssimos de nossa maior empresa, como campos do Pré-sal e outros, de
gasodutos, da Liquigás, de sua indústria petroquímica e tudo isso porque o
projeto de destruição da estatal visa a reduzi-la à condição de mera produtora
de óleo bruto, o que pode ser levado a cabo em pouco tempo.
À irresponsável venda de ativos soma-se
a contração dos investimentos em exploração e produção de óleo, e assim o
senhor Pedro Parente, presidente da
estatal, já pode comemorar a queda de nossas reservas para o nível de 2001. A
atual direção da Petrobras, de forma criminosa, praticamente abandonou a
atividade de exploração (perfuração de novos poços para ampliar reservas), o
que fará com que, em pouco tempo, nosso mercado interno venha a ser atendido na
maior parte pelas petroleiras estrangeiras.
Fica cada vez mais claro que o grande
objetivo é o desmonte do Brasil qual o conhecemos e a entrega de nosso
patrimônio, construído com tanto sacrifício e ao longo de tantos anos, a grupos
internacionais que avançam sobre todos os setores estratégicos da economia
brasileira, principalmente nos setores vitais da indústria de um modo geral, do
comércio, da educação e da saúde.
Coerente com essa política
verdadeiramente de terra arrasada, o governo pretende entregar a empresas
estrangeiras o controle do tráfego aéreo nacional (o que comprometerá até a
aviação militar e os deslocamentos de nossas autoridades).
Pretende liberar a aquisição integral
das empresas brasileiras de aviação a empresas estrangeiras e a política de
‘céus sem fronteiras’ que permitirá a empresas estrangeiras explorar a aviação
comercial doméstica, quando nossas empresas encolheram 5,47% no ano passado, o
pior desempenho desde 2003.
Às empresas estrangeiras é liberada a
captação de fundos públicos, o que contraria a lógica da atração de capitais
estrangeiros, pois, por suposto, viriam eles aumentar a nossa capacidade de
investir. Se nem mais capital têm de trazer, virão simplesmente abocanhar fatia
crescente do capital privado nacional, acelerando, com a ajuda governamental, a
desnacionalização de nossa economia.
Pari passu é autorizada a instalação de
21 Zonas de Processamento de Exportação (ZPES) sem cobrança de contrapartidas,
ao lado de concessões de serviços públicos sem a exigência de conteúdo local.
Enquanto isso segue o esforço da maioria
parlamentar, guiada pelo Planalto, visando à destruição da Consolidação das
Leis do Trabalho (CLT), à perversa precarização do trabalho em meio à recessão
e ao desemprego, e a reforma da previdência que só cuida de prejudicar quem
mais dela depende, o assalariado.
O governo que assim comanda a economia
brasileira, permanentemente na corda bamba, sem credibilidade, carente de
legitimidade e apoio popular, cuida do dia a dia sem saber se terá amanhã, pois
pode e deve ser alcançado pelas delações dos executivos da Odebrecht,
recentemente homologadas pela presidente do STF.
Se salvar-se dessa ameaça, saída
improbabilíssima, o ainda presidente pode ter seu mandato cassado como
consequência da eventual impugnação pelo TSE das contas da campanha de 2014,
embora as chicanas jurídicas do ministro Gilmar Mendes, aquele que não disfarça
sua condição de militante partidário e, agora conselheiro do presidente que
mais tarde julgará, tenta ora desvincular as candidaturas Dilma-Temer, ora
prorrogar ao máximo o julgamento. Enseja ao presidente a renovação de duas ou
mais vagas no plenário, inclusive a substituição do relator, o que lhe daria
absoluto controle da Corte.
Festeja-se a homologação das delações,
mas é de lamentar a manutenção do sigilo, que só contribui para fortalecer
suspeições difusas que são utilizadas para toldar o ambiente já de si tenso
após tanta espera. O recurso ao sigilo, ademais, contraria o principio basilar
da transparência, segundo o qual a publicidade deve ser a regra e o sigilo a
exceção, e só tem servido para o ‘vazamento seletivo’ manipulado nas entranhas
dos inquéritos e seus agentes.
Pelo que se comenta em todos os
bastidores da política e dos templos da Justiça, a delação dos executivos e do
principal acionista da Odebrecht é grave demais, para os destinos da República
e da Lava-Jato, pelos seus aspectos intrínsecos, civis e criminais. De igual
modo é importantíssima pelos suas evidentes implicações políticas e
consequências institucionais, para ser tratada às escondidas, abrindo espaço
para suspeições.
A homologação e o sigilo foram
anunciados quando estávamos nas vésperas da eleição das mesas diretoras do
Senado Federal e da Câmara dos Deputados que definirá, ademais, a linha
sucessória da Presidência da República, podendo eleger futuros réus da Lava-Jato.
O que está posto à toda evidência é que
a conjuntura aponta para uma crise político-institucional potencializada pela
crise econômico-social. Neste momento, os partidos precisam de nitidez
ideológica afirmada em sua fidelidade a princípios e programas.
Vencida pela reação sempre enérgica de
sua brava militância, a bancada do PT na Câmara tende a ficar onde deve e de
onde não pode sair, ou seja, na oposição ao governo títere. Precisa cumprir o
papel – se puder fazê-lo – de aglutinador, sem veleidades hegemonistas, dos
partidos de oposição (PDT, PCdoB, Rede e PSOL) num bloco parlamentar de
resistência ao desmonte do Estado e da economia nacional.
Do movimento social, sindicatos à
frente, a conjuntura exige capacidade de ação, mobilização permanente, dando
sustentação, impulso e vigor à oposição parlamentar. É hora de ampliar nossos espaços
e cuidar de alianças táticas – inclusive com o capital produtivo, que aos
poucos vai descobrindo o erro que cometeu com a solidariedade ao impeachment.
Em tais circunstâncias, a superação da
crise passa por entendimento que antecipe a eleição direta de novo Presidente
da República. Este sim, ungido pelo voto popular, e só nesta condição, terá
legitimidade para dar rumo ao País.
Fonte: Blog do Roberto Amaral
* Roberto Amaral é jornalista,
professor, ex-presidente do PSB e ex-ministro de Ciência e Tecnologia
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