O
fim do BNDES e o grande golpe do Brasil quebrado
Nos últimos anos, e mais especialmente a partir de
2013, o Brasil tem se transformado, cada vez mais, no país de pequenos e
grandes golpes, canalhas, sucessivos e mendazes. Golpes na economia, golpes na
soberania e na estratégia nacional, golpes contra a democracia, que culminaram
no grande golpe jurídico-midiático-parlamentar de 2016.
Mauro Santayana
Mas, sobretudo, golpes contra
verdade, a consciência popular, a própria realidade e a opinião pública. Com a
criação e disseminação de mentiras, fakes e falsos paradigmas apoiados
mutuamente na fabricação do consentimento para a desconstrução de um sistema
político que, com todos os seus defeitos – aliás, como toda democracia –
funcionava com um mínimo de governabilidade, de estabilidade institucional e de
equilíbrio entre os poderes da República.
Golpes voltados para
sabotagem e destruição de um programa nacionalista e desenvolvimentista que
levou o Brasil da 14ª para a sexta economia do mundo, em 9 anos, a partir de
2003, apoiado no retorno à construção de plataformas de petróleo, hidrelétricas
de grande porte, ferrovias, refinarias, tanques, submarinos, navios, rifles de
assalto, caças, cargueiros aéreos militares, multiplicando o crédito, dobrando
a produção agrícola, triplicando a produção de automóveis.
Da imensa usina de
contrainformação fascista, montada principalmente, a partir de 2013, saíram – e
continuam a sair – milhares de calúnias, seguindo uma estratégia não escrita
que usa pequenas “notícias” cotidianas. A maior parte delas surreal,
disseminada pela má fé, o ódio e a hipocrisia, realimenta permanentemente,
sobretudo nas redes sociais, grandes correntes e paradigmas midiáticos que
adquiriram o ar de certeza para a parcela mais ideologicamente imbecil, quanto
mais apaixonadamente ignorante, da população brasileira.
Uma das principais
pós-verdades vendidas para esse público, hoje já transformada em discurso e
adotado como bandeira e muleta pelo atual governo e boa parte da mídia, é de
que o Brasil estaria totalmente inviabilizado economicamente e, logo,
necessitado de passar por um urgente programa de “reformas” – com venda de
ativos públicos e privados para “sair do buraco”.
Ora, quebrados, ou quase
isso, estávamos no último ano de governo do senhor Fernando Henrique Cardoso.
Em 2002, depois de um nefasto e maior programa de “reformas” e de
“privatizações” (na verdade, de desnacionalização) da economia brasileira em
500 anos, encerramos o ano com um PIB nominal e uma renda per capita em dólares,
segundo o Banco Mundial, menor do que de oito anos antes, no final do governo
Itamar Franco. E uma dívida com o FMI de US$ 40 bilhões.
Hoje o Brasil tem R$ 380
bilhões de dólares – mais de R$ 1 trilhão – em reservas internacionais e é
ainda, com toda a crise, a nona economia do mundo. Entre as 10 principais
economias do planeta, grupo em que nos incluímos depois de 2002, pelos menos
sete países – Estados Unidos, Japão, Reino Unido, França, Itália, Canadá – têm
dívida pública em relação ao PIB maior do que a nossa.
O salário mínimo e a renda
per capita são maiores, em dólares, agora, do que no final de 2002, e as
dívidas bruta, externa e líquida são menores do que eram quando Fernando
Henrique deixou o poder.
208 milhões de idiotas
Mas a mídia, os ministros, os
“especialistas” e “analistas” do “mercado” insistem em afirmar a todo o momento
exatamente o contrário. Que estamos redondamente quebrados e que a dívida
nacional explodiu por terem, talvez, na verdade, a mais descarada certeza de
que conseguiram nos transformar impunemente, nos últimos quatro anos, a todos
os brasileiros em uma populosa nação de 208 milhões de idiotas.
Afinal, há muita diferença
entre dificuldades fiscais momentâneas, causadas entre outras coisas, por um
programa de desoneração fiscal equivocado, mas que deixou um déficit muito
menor do que o de hoje – agravado por volumosos aumentos de salários para o
Judiciário e o Ministério Público aprovados depois que Temer chegou ao poder –
e os dados macroeconômicos de um Brasil que já emprestou dinheiro ao FMI e
ocupa o posto de quarto maior credor individual dos Estados Unidos. (Basta
pesquisar na página oficial do Tesouro norte-americano procurando a expressão
mayor treasuries holders no Google.)
A razão pela qual o governo e
o sistema de contrainformação fascista, na internet principalmente, não
alardeiam para a maioria da população o excelente nível de reservas
internacionais é óbvia. Essa informação contradiz o mito de que Lula, Dilma e
os governos do PT quebraram o Brasil, a ponto de deixar o país de chapéu na
mão.
E anula, praticamente, a
justificativa que está por trás de um programa apressado, antidemocrático –
porque a sociedade não está sendo ouvida – e antipatriótico de privatizações
que está entregando o Brasil a toque de caixa e preço de banana podre aos
estrangeiros. Como ocorreu, por exemplo, com a venda da maior refinaria de
resina PET da América Latina, recém-inaugurada pela Petrobras (na qual foram
investidos R$ 9 bilhões) por apenas R$ 1,3 bilhão para capitais mexicanos, no
final do ano passado, provocando um prejuízo, apenas nesse caso, três vezes
superior àquele que teoricamente teria sido gerado por Dilma no caso Pasadena,
se ela já não tivesse, a bem da verdade, sido isentada pelo TCU dessas
acusações.
Ou da entrega – por meio de
um discurso entreguista tão hipócrita quanto calhorda – de reservas de petróleo
do pré-sal para empresas 100% estatais de outros países como Noruega e China,
enquanto, para consumo interno, defende-se a “desestatização” da Eletrobras e a
própria Petrobras, com a alegação de que o capital privado seria mais honesto e
competente.
Tudo isso em um país em que,
paradoxalmente, com base em uma campanha jurídica eivada de primeiras, segundas
e terceiras intenções políticas, se acaba de destruir cinicamente – e em alguns
casos, desnacionalizar – a base do capital privado nacional e da megaengenharia
brasileiras, por serem consideradas, as duas, fontes de corrupção e muito
dependentes do governo.
BNDES poderoso e eficiente
São essas mesmas razões – a
mentira e a manipulação e a necessidade de sustentar o mito de que o PT quebrou
o país – que fazem com que o governo e a mídia deixem de mencionar, ou tentem
esconder da maior parte da população, que Temer e Meirelles herdaram dos
governos Dilma e Lula, quando assumiram o poder depois do golpe de 2016, um
BNDES muito poderoso e eficiente, com centenas de bilhões de reais em caixa.
Recursos que eles estão
raspando dos cofres do nosso maior banco de fomento, enviando-os
“antecipadamente” para o Tesouro, com a desculpa de estar diminuindo a dívida
pública, quando ela é menor hoje do que em 2002 e esse dinheiro fará quase ou
nenhuma diferença em percentual de dívida com relação ao PIB, ao fim desse
estúpido e gigantesco austericídio.
Não é preciso lembrar ao
ministro da Fazenda – que recebeu mais de R$ 200 milhões em “consultoria” no
exterior nos últimos três anos – que o BNDES foi criado, em 1952, no segundo
governo Vargas, para promover o desenvolvimento econômico e social do país, e
não para gerar recursos para o pagamento de uma dívida pública que ainda se
encontra em uma classificação mediana do ponto de vista internacional.
Como não é preciso recordar
que bancos precisam de dinheiro para funcionar, retirar deles recursos, nesse
caso, capitais públicos, equivale a fechar as suas portas. Tampouco é preciso
lembrar que, assim como no caso da justificativa imbecil da queda de Dilma por
“pedaladas” fiscais, o dinheiro que está no BNDES, ou no Tesouro, pertencem ao
mesmo dono – o povo brasileiro –, que o que importa não é ficar fingindo que se
tratam de coisas diferentes, mas, no frigir dos ovos, gerir esses recursos,
economizados nos últimos anos, em benefício de todos os cidadãos e não de
firulas contábeis para se posar de bons moços para o “mercado”.
Isso tudo em um momento em
que o país, com mais de 14 milhões de desempregados, padece com centenas de
bilhões de dólares em projetos importantíssimos – muitos deles estratégicos –
paralisados irresponsavelmente por decisão da Justiça nos últimos três anos. E precisa
desesperadamente recuperar suas maiores empresas, e de mais infraestrutura e
vagas de trabalho.
A intenção de acabar, na
prática, com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social,
estrangulando-o enquanto principal instrumento estratégico para a
competitividade brasileira, não atende apenas aos interesses de nossos
concorrentes externos.
Faz parte da mesma estratégia
de enfraquecer também o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal para
justificar privatizações, ou, no mínimo, “equilibrar” o “mercado”, favorecendo
bancos privados nacionais e estrangeiros no sistema financeiro nacional.
Não por acaso, o
ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco acaba de declarar, em seminário
em Belo Horizonte, que o Banco do Brasil está pronto para privatização. Franco
presidiu o Banco Central no primeiro mandato de FCH, entre 1997 e 1999, era das
grandes privatizações. Não é também por coincidência que contratos do Minha Casa Minha Vida têm sido
sistematicamente atrasados pela Caixa. Anunciou-se nesta semana que o
financiamento de imóveis usados na Caixa agora só chegará, no máximo, a 50% do
valor do bem a ser adquirido.
A classe “média”,
principalmente, aquela parcela que se assume como vanguarda do fascismo nas
redes sociais, ou está engolindo a seco, ou deve mesmo estar satisfeita com
essas notícias, e também com outras novidades desse “novo” Brasil, ordeiro e
progressista, como a volta dos frequentes, quase semanais, aumentos do preço
dos combustíveis da Petrobras para as distribuidoras, rapidamente repassados
pelos postos, tão comuns na última década do século passado.
Fonte: RBA
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