terça-feira, 12 de maio de 2020

Não tenhamos ilusões: as Forças Armadas apoiarão, sim, um autogolpe de Bolsonaro.

Não tenhamos ilusões: as Forças Armadas apoiarão, sim, um autogolpe de
Bolsonaro.

https://nocaute.blog.br/2020/05/11/nao-tenhamos-ilusoes-as-forcas-armadas-apoiarao-sim-um-autogolpe-de-bolsonaro/

Frente à crescente reprovação de seu governo pela maioria do país e ao
aumento do apoio popular a seu impeachment, Jair Bolsonaro não deixa
dúvidas de que pretende dar um autogolpe de Estado. O militarismo está
de volta e a politização das Forças Armadas será inevitável, se não
reagirmos e não dermos um basta a toda e qualquer ação militar fora
dos marcos da Constituição.

Não há mais dúvidas. De novo nosso Brasil e sua democracia enfrentam o
risco e a ameaça do militarismo. Não se trata apenas de presença de 3
mil militares, inclusive da ativa, no governo federal, mas da tutela
aberta militar sobre o país, da volta do militarismo, da politização
das Forças Armadas.

Não será a primeira vez. Toda nossa história republicana está marcada
pela atuação dos militares como uma força política — no caso armada —,
disputando o poder e os rumos do país. Foi assim na instauração da
República em 1889; nos anos 1920 e 1930 com o tenentismo; em 1937
quando o Estado Maior do Exército apoia o autogolpe de Getúlio do
Estado Novo. Durante toda década de 1950, facções das Forças Armadas
aliadas à direita tentaram dar golpes de Estado: em 1950 para impedir
a posse de Getúlio; em 1955, para impedir a posse de JK; em 1961 para
impedir a posse de Jango como presidente. Se os três primeiros
fracassaram, o quarto golpe, em 1964, foi vitorioso, com a destituição
pela força das armas de um governo constitucional e democrático que
contava com o apoio da maioria do povo.

É preciso registrar que os dois golpes em que os militares assumiram o
poder, de 1937 a 1945, na ditadura do Estado Novo, com Vargas, e de
1964 a 1985, com militares diretamente no comando do país, foram
marcados pela impunidade. São fatos históricos. Os militares
brasileiros que torturaram e assassinaram durante a ditadura militar
jamais reconheceram seus crimes, dos quais, aliás, foram anistiados,
caso único na América Latina.

Não há uma ala militar ou um núcleo militar no governo Bolsonaro. Seja
pela razão que for, o governo é militar, a presidência e o Palácio do
Planalto, oito dos 22 ministérios e cada vez mais militares assumem as
secretarias de outros ministérios como no da Saúde, sem falar das
estatais e autarquias. A cada dia fica evidente que as operações
políticas e planos do governo, como o Pro-Brasil, são realizadas pelos
militares. Suas digitais estão em movimentos como a cooptação do
Centrão para a base do governo na Câmara dos Deputados com
distribuição de cargos, ou a guerra política contra a oposição, o STF
e a imprensa. Estão presentes na orientação das políticas indígena,
ambiental e educacional, e na gravíssima rendição total aos Estados
Unidos na política externa, com a alienação de nossa soberania.

Os militares aderiram e apoiam toda gestão de Paulo Guedes na economia
do país, inclusive o desmonte dos bancos públicos e as privatizações,
a entrega das reservas e da riqueza e renda do Pré-sal, o desmonte da
saúde e da educação pública, das universidades e centros de pesquisa.
Mas, cinicamente, salvaram dos cortes e das reformas as estruturas
militares, o orçamento das Forças Armadas, que não foi contingenciado,
e sua Previdência. Enquanto o povo amarga uma reforma da Previdência
que aumenta anos de trabalho, reduz benefícios e penaliza os pobres,
os militares mantiveram seus privilégios: paridade, integralidade, sem
limite de idade para aposentar, gratificações, verbas, ajudas, aumento
real de vencimentos de 45%. Uma casta.

Tutela militar

Esta tutela se expressa desde o governo Temer. Quando do julgamento do
HC de Lula na Suprema Corte, o então comandante do Exército, general
Eduardo Villas Boas, publicou um twitter expressando que as Forças
Armadas não o aceitariam e, o mais grave, publicou a foto da reunião
do Estado Maior do Exército para demonstrar o apoio que tinha para
praticar aquele crime constitucional. O mesmo Villas Boas que, agora
na reserva, saiu em defesa da secretária da Cultura, Regina Duarte,
que em entrevista recente defendeu a ditadura.

No dia 31 de março deste ano, os três comandantes militares assinaram
uma nota de elogio e apoio ao golpe militar de 1964, sem que os
poderes e as instituições se manifestassem ou coibissem essa escalada
das Forças Armadas rumo ao poder. Mesmo na oposição e na mídia, poucas
vozes se levantaram para protestar.

Frente à crescente reprovação de seu governo pela maioria do país e ao
aumento do apoio popular a seu impeachment, Jair Bolsonaro não deixa
dúvidas de que pretende dar um autogolpe de Estado. De novo vemos a
ilusão política que não haverá golpe de Estado. Não é bom acreditar em
ilusões, quando já temos um governo militar e aqui, na vizinha
Bolívia, foi dado um violento e covarde golpe de Estado com a Polícia
Militar. Para o Exército sobrou a tarefa de exigir a renúncia do
presidente Evo Morales.

É certo que razões políticas não bastam e não devem ser a
justificativa para o impedimento constitucional de um presidente. É
golpe parlamentar, como foi contra a presidente Dilma Rousseff, com a
anuência e conivência da Suprema Corte. Mas todos os dias o presidente
viola a Constituição e manifesta publicamente sua disposição rumo ao
autoritarismo. Está evidente que ele capturou os órgãos de
fiscalização, investigação, seja o COAF, a Receita Federal, o
Ministério Público e agora a polícia judiciária da União, a Polícia
Federal, para evitar exatamente a apuração e as investigações e
processos contra sua família, filhos, partido, campanha e atuação na
presidência, evitando assim um julgamento judicial ou pelo parlamento.

Se não encontra reação, sua estratégia, no curto prazo, continua sendo
a de provocar e avançar sobre os outros poderes. A médio é formar uma
maioria na Câmara, eleger em fevereiro do ano que vem um presidente
alinhado com o governo e ao mesmo tempo esperar as aposentadorias na
Suprema Corte para tentar anular sua ação constitucional. Objetivos
que podem não ser alcançados e seu governo se arrastar até 2022, o que
não seria um problema não fosse a gravíssima crise que o mundo e o
Brasil vivem. A ação de Bolsonaro contra o isolamento social e a
verdadeira sabotagem que ele e seu governo fazem em plena pandemia que
já matou mais de 11 mil brasileiros já são razões mais do que
suficientes para seu afastamento da presidência.

Hora de reagir

A oposição liberal de direita, os partidos PSDB-DEM-MDB e a grande
mídia – ainda que aos poucos seus editoriais revelem o temor de um
golpe – com exceções, não apoiam o impeachment do presidente. Evitam
também a questão militar, preferindo apostar que as Forças Armadas
como instituição não apoiariam um autogolpe. Esquecem as lições da
história e o fato concreto de que Bolsonaro agita os quartéis, apela
aos oficiais com comando e tem nas PMs e empresas de segurança uma
reserva armada à sua disposição, fora suas milícias que hoje ocupam a
Praça do Três Poderes exigindo o fechamento do Congresso Nacional e do
Supremo.

O militarismo está de volta e a politização das Forças Armadas será
inevitável, quase automática, se não reagirmos e não colocarmos um
basta a toda e qualquer ação militar fora dos marcos da Constituição.
E a toda e qualquer ação do presidente quando viola a Constituição
usando as Forças Armadas ou as invocando.

Espero que não acreditemos em notas oficiais dos militares que
repudiam o golpe ou reafirmam sua vocação democrática – incompatível
com o apoio e a louvação ao golpe militar de 1964. A tradicional
aversão militar ao conflito inerente à democracia, seu elitismo de
achar que o povo não sabe votar, sua convicção recebida nas escolas
militares de que eles são os únicos patriotas, seu histórico de
formação positivista como o déspota esclarecido que Geisel bem
representou, seu corporativismo exibido sem pudor na votação da
reforma da Previdência, são ingredientes que apenas devem aumentar
nossa convicção de que os militares têm que estar fora da política.
Não podem ser agentes políticos pela simples razão que a nação os
armou para a defender e não para a tutelar ou para nos submeter à
tirania e à ditadura.

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