quarta-feira, 26 de outubro de 2022

Agência Pública Como Lira usou o Bolsolão para ajudar o próprio pai

 

Como Lira usou o Bolsolão para ajudar o próprio pai
por Bruno Fonseca
 
“Não voto em corrupto” é talvez uma das falas mais comuns que saem da boca dos brasileiros durante as eleições. Também pudera, corrupção significa tirar dinheiro da saúde, da educação, de obras públicas, e colocar no bolso de quem consegue abocanhar os recursos do Estado para aumentar ainda mais seus privilégios.

Ninguém que espera na fila por exames e cirurgias, que separa dinheiro pra passagem de ônibus, que compra comida — cada vez mais cara — fica feliz em saber que um empresário rico ou um político abastado embolsou dinheiro público para si.

Justamente por isso é surpreendente que hoje o Brasil corra o risco de reeleger um governo que gestou um esquema bilionário de ocultamento do envio de dinheiro público: o Bolsolão.

Simplificando: o Bolsolão é um esquema para enviar verbas por meio de acordos com o relator do orçamento e o governo federal. Deputados, senadores e outros políticos combinam com essas figuras o tamanho da fatia que cada um vai poder indicar de um bolo bilionário – já foram indicados R$ 12 bilhões em 2022 – e como ela será gasta. Essas são as chamadas "emendas do relator" e, em 2022, o relator em questão foi o deputado do centrão Hugo Legal, do PSD do Rio.

Acertos feitos, esse dinheiro roda o Brasil, mas a divulgação das emendas — que precisou ser exigida pelo Supremo Tribunal Federal — não carrega a assinatura do político que a pediu. É segredo, como admitiu o próprio presidente Bolsonaro.

Pois bem, a repórter Alice Maciel e eu fomos atrás desses dados e, qual a surpresa: o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), é o segundo político que mais indicou emendas neste ano eleitoral e R$ 1,7 milhão delas foram parar na prefeitura comandada pelo pai dele, Benedito de Lira (PP-AL).

Enquanto recebia a benesse do filho, que caiu no Fundo de Saúde do município, a prefeitura de Barra de São Miguel (AL) conseguiu a façanha de aumentar e muito os atendimentos de saúde na cidade. Neste ano, até agosto, foram registrados quase 100 mil atendimentos para pouco mais de 8 mil habitantes. É como se, em 2022, cada morador da cidade já tivesse sido atendido nos postos de saúde mais de uma vez por mês. Em todo o ano de 2021, foram 65 mil atendimentos. Em 2020, só 17 mil. 

O diretor da Pública, Thiago Domenici, foi bastante didático quando escreveu a fórmula: orçamento secreto é = Bolsolão = corrupção. Isso porque o esquema alimenta, ao mesmo tempo, dois caminhos para a corrupção.

De um lado, o orçamento secreto coloca na mão de parlamentares aliados do governo a decisão sobre quanto de dinheiro público será destinado para onde. Com esse instrumento em mãos, Lira pode beneficiar o pai — e a si mesmo — em ano eleitoral, já que tem o capital político de ser o principal fiador de Bolsonaro no Legislativo.

De outro lado, o esquema põe a autoria dessas emendas sob sigilo, dificultando que nós, jornalistas, órgãos de fiscalização e você saibam exatamente quem combinou a troca de favores.

Na Agência Pública, denunciamos a corrupção porque ela também é uma forma de violar direitos humanos. O direito à saúde é um deles, e precisa ser respeitado independentemente de qual político está sentado na presidência, no Congresso ou em cada canto do Brasil.

 
Bruno Fonseca é editor e repórter multimídia da Agência Pública.

Rolou na Pública
 

Mais uma indicação! Nosso Mapa dos Conflitos é finalista na categoria visualização do prêmio Cláudio Weber Abramo de jornalismo de dados! Na ferramenta, fruto de uma parceria com a Comissão Pastoral da Terra (CPT), fizemos uma análise inédita de dados para investigar as ocorrências de conflitos no campo na Amazônia Legal na última década (2011-2020). Navegue pelo mapa clicando aqui

Perseguição a pastores. A Pública conversou com pastores e lideranças evangélicas que relataram sofrer represálias por declararem voto no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nestas eleições. Eles representam um grupo dissidente dentro do eleitorado evangélico, no qual Jair Bolsonaro (PL) lidera. A reportagem foi republicada no Nexo, no Brasil de Fato e no Projeto Colabora e repercutida na newsletter Brasis, da Associação de Jornalismo Digital (Ajor).

Publicidade do governo em TV evangélica. A emissora de televisão Rede Super – que pertence à Igreja Batista da Lagoinha, em Minas Gerais, e tem o pastor André Valadão como sócio – recebeu R$ 756 mil por campanhas de comunicação pagas durante o governo Bolsonaro. Deste total, R$ 217 mil foram pagos neste ano eleitoral. A reportagem foi republicada na Carta Capital, no Jornalistas Livres e repercutida na Revista Fórum.  

Feminicídio armamentista. Reportagem da Pública mostra como armas de fogo com maior potência, liberadas pelo governo Bolsonaro, têm sido usadas para matar mulheres. A matéria foi republicada no Sul21 e no Brasil 247

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