Caso
Sheherazade do SBT
Jandira Feghali
O governo federal estuda suspender a verba publicitária que repassa à
terceira maior emissora de TV do país, o Sistema Brasileiro de Televisão (SBT).
O caso é examinado pela equipe do ministro Thomas Traumann, da Secretaria de
Comunicação Social da Presidência da República, a pedido da líder do PCdoB na
Câmara, Jandira Feghali(RJ).
A deputada acusa a emissora de ter praticado apologia e incitação ao
crime, à tortura e ao linchamento ao exibir comentários da apresentadora Rachel
Sheherazade que, segundo a parlamentar, exaltavam a ação de chamados
“justiceiros” no Rio de Janeiro contra um jovem de 16 anos, acusado de furto.
“A Secom me deu um primeiro retorno dizendo que concorda com o conteúdo do
nosso pedido e que estuda quais providências tomar”, disse Jandira Feghali ao
Congresso em Foco.
A assessoria da Secretaria de Comunicação da Presidência confirmou que
a pasta estuda o assunto, mas afirmou que só o ministro Thomas Traumann poderia
confirmar se concorda ou não com a suspensão da verba. A reportagem aguarda
retorno da Secom desde ontem (18) à tarde.
Em 2012, o SBT recebeu R$ 153,5 milhões em publicidade de verba
publicitária do governo federal. Ficou atrás apenas da Globo (R$ 495 milhões) e
da Record (R$ 174 milhões). O valor destinado à TV de Silvio Santos corresponde
a 13,64% do bolo publicitário das emissoras. “Como o governo pode subsidiar um
canal que tem uma editorialista que incita à violência e à justiça com as
próprias mãos?”, questiona Jandira Feghali.
"Na edição do telejornal SBT Brasil, do último dia 4 de fevereiro,
Rachel disse que era “compreensível” a ação de um grupo de pessoas que
acorrentou a um poste um adolescente acusado de furto no bairro do Flamengo, na
Zona Sul do Rio. O jovem foi acorrentado, nu, pelo pescoço com uma trava de
bicicleta. Ele teve parte da orelha cortada e só foi solto após a intervenção
de uma moradora.
Para Rachel, a ação dos “justiceiros” se justifica por causa do clima
de insegurança nas ruas e da ausência de Estado. Ela também criticou a atuação
de militantes dos direitos humanos. “Faça um favor ao Brasil. Leve um bandido
para casa”, declarou. Dias depois de ser acorrentado e solto, o adolescente foi
detido novamente, desta vez por tentar assaltar um turista na cidade. Até o mês
passado, o menor acumulava três passagens pela polícia.
Perda da concessão
A líder do PCdoB na Câmara trabalha em duas frentes contra o SBT. Além
do ofício enviado diretamente à Secom, no dia 20 de fevereiro, ela também
apresentou umrequerimento à Procuradoria-Geral da República (PGR) em que pede a
abertura de inquérito contra a TV e Rachel Sheherazade e o corte da verba
enquanto durarem as investigações. Como mostrou o Congresso em Foco, em caso de
condenação, Jandira solicita que o SBT perca até o direito à concessão pública.
Caberá ao procurador-geral, Rodrigo Janot, dar andamento ou não aos pedidos.
A deputada diz que não há censura em sua iniciativa. Segundo ela, uma
coisa é externar uma opinião, outra é defender um crime como “fazer justiça com
as próprias”. “Não podemos ser coniventes com nenhum crime. O único poder capaz
de julgar a proporcionalidade da punição é a Justiça, que dá direito de defesa.
Temos de defender o estado democrático de direito.”
Compreender, sem aceitar
A reportagem procurou Rachel Sherazade e o SBT por meio da assessoria
de imprensa da emissora. Mas, até o fechamento desta reportagem, ainda não
havia recebido retorno da TV do empresário Sílvio Santos.
Em artigo publicado em 11 de fevereiro, na Folha de S. Paulo, a
apresentadora diz que apenas expressou sua opinião e que não defendeu os
chamados “justiceiros”. “Em meu espaço de opinião no jornal SBT Brasil, afirmei
compreender (e não aceitar, que fique bem claro!) a atitude desesperada dos
justiceiros do Rio”, escreveu Rachel. Em nota divulgada à época, o SBT alegou
que a opinião da apresentadora era de responsabilidade dela, e não da emissora.
Jandira não concorda. Para ela, como concessão pública, a TV tem total
responsabilidade em relação ao que leva ao ar. “A emissora vai ter de assumir.
Não estamos provocando a Rachel Sheherazade, é o SBT que está em questão. Não é
uma questão dela especificamente, mas dela vinculada ao canal. A gente espera
que isso sirva de parâmetro para outras TVs”, disse a deputada.
Em 2000, o SBT chegou a ficar com 20% do “bolo” publicitário do governo
entre as emissoras de TV. Naquele ano, ainda na gestão Fernando Henrique
Cardoso (PSDB), a emissora recebeu R$ 135 milhões para divulgar ações do
governo federal. Na época, era vice-líder de audiência, posto que perdeu, de lá
para cá, para a Record, de Edir Macedo.
Outras representações
Este não é o único caso envolvendo a apresentadora e a emissora que
Rodrigo Janot terá de analisar. Ainda em fevereiro, o Psol acionou a PGR contra
Rachel e o SBT por apologia ao crime, à tortura e ao linchamento. No encontro
com os parlamentares, Janot se comprometeu a designar um procurador para
investigar o caso.
“A violência é feita em palavras pela Rachel Sheherazade tentando
justificar uma violência absurda. E ela diz isto num meio de comunicação que é
uma concessão”, afirmou o líder do Psol na Câmara, Ivan Valente (SP). “A
liberdade de imprensa, que é importante e necessária, não poder ser refúgio de
declarações irresponsáveis”, acrescentou o deputado.
Ainda em fevereiro, a presidente da Comissão de Direitos Humanos e
Legislação Participativa do Senado, senadora Ana Rita (PT-ES), pediu à
Procuradoria-Geral de Justiça de São Paulo que abra procedimento para apurar o
conteúdo do comentário de Rachel. Para a senadora, a apresentadora violou os
direitos humanos e fez incitação à violência. Com o ofício, foi encaminhada uma
nota de repúdio publicada pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais do
Município do Rio de Janeiro sobre as violações de direitos cometidas pela
jornalista.
A assessoria da Secretaria de Comunicação da Presidência disse que o
ministro Thomas Traumann estava em reuniões na Presidência da República e não
poderia poderia confirmar, como disse Jandira Feghali, se ele concorda com a
suspensão da verba do SBT.
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