segunda-feira, 7 de março de 2016

Bercovici: Garantias constitucionais não existem mais no país


Bercovici: Garantias constitucionais não existem mais no país

O jurista e professor titular da Faculdade de Direito da USP, Gilberto Bercovici, disse, nesta sexta (4), que ocorreu claro “abuso” na condução da 24ª fase de Operação Lava Jato. Ao analisar o atual momento do país, ele afirmou que há “um desrespeito pleno, completo e absoluto” a todas as garantias constitucionais. “A Constituição de 1988 não vigora mais”, declarou. E defendeu que apenas a mobilização popular pode barrar um retrocesso em conquistas democráticas e sociais.

Por Joana Rozowykwiat


  
Para o jurista, as irregularidades ocorrem desde a semana passada, quando detalhes da operação vazaram para a imprensa. “Ocorreu claramente um abuso. Primeiro, porque essa fase da operação vazou desde a semana passada. Eles vazaram para órgãos de imprensa e chegou ao conhecimento do [blogueiro] Eduardo Guimarães. Então você faz um vazamento seletivo, para ter impacto na imprensa”, criticou, em entrevista ao Vermelho.

O professor condenou ainda a forma como foi conduzida a ação da Polícia Federal. Segundo ele, não havia “nenhuma necessidade” de o ex-presidente ser conduzido coercitivamente para depor. “O próprio Lula já havia se colocado à disposição para qualquer esclarecimento. Já havia dito que poderia depor sem problema”, destacou, explicando que a condução coercitiva só deve ser usada em casos nos quais a pessoa se recuse a prestar depoimento.

De acordo com Bercovici, o objetivo de levar o ex-presidente a depor desta forma foi gerar um fato político e imagens para a grande mídia. “O objetivo é arranjar foto para a Folha de São Paulo, para a Globo. Ter a ceninha dele saindo do carro da Polícia Federal. E querer pressionar ainda mais um governo que já está acuado, que é o da presidenta Dilma”, opinou.

Além disso, segundo Bercovici, a Lava Jato passou por cima do Supremo Tribunal Federal, uma vez que há uma petição da defesa do ex-presidente Lula no STF, para que a corte defina a quem cabe investigar os fatos em questão, se o Ministério Público de São Paulo ou o Ministério Público Federal. “Isso está com a ministra Rosa Weber, e a Operação Lava Jato atropelou o Supremo.
Simplesmente ignorou a existência do STF”, apontou.

Bercovici disse ainda que as garantias constitucionais não estão mais asseguradas no país. “Esse país não tem mais isso, né? O próprio Supremo, quando decidiu que as pessoas podem ser presas sem trânsito em julgado, ao contrário do que diz a Constituição, já mostrou que as garantias constitucionais não existem mais no Brasil. A Constituição de 1988 não vigora mais no Brasil, não sei o que vigora, mas não é a Constituição de 1988”, disparou.

Segundo ele, o alerta não é por tratar-se do ex-presidente, mas porque todos têm que ter as mesmas garantias e as mesmas liberdades. “E isso obviamente não está acontecendo”. Para Bercovici, está claro que está em curso um processo político, marcado pela perseguição ao PT e suas lideranças. Sobre os interesses por trás da operação, ele declarou: “A Lava Jato não faz nada sozinha, ela é amparada pela mídia, por setores políticos e econômicos do país - o sistema financeiro, os partidos de oposição e uma série de grupos empresariais”.

O professor avaliou que é preciso que todos os partidos que possam ter cometido irregularidades sejam investigados, mas apontou que, atualmente, apenas o PT é alvo das apurações. “O PSDB, o PMDB, o DEM são todos santos? Todo mundo sabe como funciona o financiamento de campanha no Brasil. Porque só um partido é atacado? Tem que atacar todos. Se há desvio e irregularidades, todos têm que ser investigados e, eventualmente, se forem culpados, punidos. Mas o que a gente vê é que só tem um lado”, condenou.

Ele defendeu ainda que é preciso mobilização popular para frear a investida contra as garantias constitucionais. “Não pode ocorrer uma desmobilização, um sentimento de ‘ah, é isso mesmo, vamos para casa’. Isso significaria que eles podem fazer o que eles querem. E é preciso dar um basta nesta arbitrariedade que o país inteiro está sofrendo”, disse.

O jurista advertiu sobre os riscos à democracia e aos direitos da cidadania. “Se os movimentos sociais não reagirem, vamos ver um retrocesso sobre conquistas básicas da democracia e dos direitos sociais como nunca houve na história desse país. Estão abusando, mostrando que a democracia, as garantias constitucionais e os direitos das pessoas não têm valor”, encerrou.

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