06/03/2016 - Copyleft
Eric Nepomuceno, para o diário La Jornada
Ordem de captura contra Lula sacode o Brasil
Lula é o primeiro alvo do golpe contra Dilma Rousseff. 'Foi um gesto de prepotência do juiz Sérgio Moro', qualifica o ex-presidente.
Pouco antes das 7 da manhã de
anteontem, a Polícia Federal se apresentou no apartamento onde reside o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em São Bernardo, região
industrial da Grande São Paulo. Pouco antes, a escolta que Lula tem
direito como ex-mandatário havia chegado ao local pouco antes, e o
advertiu sobre a presença dos policiais. Foi o próprio Lula que abriu a
porta.
Cumprindo ordem do juiz de primeira instância Sérgio Moro, a Polícia Federal conduziu Lula até o aeroporto metropolitano de São Paulo, onde ele permaneceu na sala reservada às autoridades – uma gentileza concedida à figura política de maior importância no Brasil –, e prestou declarações durante quase quatro horas.
Em mais uma ocasião, Lula se irritou com as perguntas dos comissários da Polícia Federal. Por exemplo, quando lhe perguntaram sobre as garrafas de vinho –algumas importadas –, encontradas na casa de campo que o ex-presidente frequenta nos fins de semana. Também sobre os dois barquinhos que sua esposa comprou para os netos do casal. “Vocês não têm nada mais para fazer do que perguntar sobre essa estupidez?” – alfinetou Lula, em conversa com seus interrogadores.
Um advogado que acompanhou o interrogatório contou que Lula contestou todas as perguntas sem titubear um só instante.
A notícia de que o ex-presidente foi alvo de uma ordem de condução coercitiva para prestar testemunho teve imenso impacto em todo o país. Durante a tarde, Lula e a presidenta Dilma Rousseff manifestaram sua indignação pela medida adotada pelo juiz Sérgio Moro. Marco Aurélio Mello, ministro do Supremo Tribunal Federal, também criticou o abuso da medida determinada pelo responsável pelas investigações da chamada Operação Lava Jato, que investiga o esquema de corrupção descoberto na estatal Petrobras.
Figura prominente do PSDB, o principal partido de oposição, José Gregori foi ministro da Justiça e também comandou a Secretaria de Direitos Humanos durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, e denunciou o que considera “um evidente abuso do juiz de Curitiba”. O economista Luis Carlos Bresser Pereira, um dos fundadores do PSDB, foi ainda mais contundente, ao afirmar que “já é hora de que o Supremo Tribunal Federal faça uma intervenção na Operação Lava Jato, para impedir que sigam ocorrendo violações como detenções temporárias ou a condução coercitiva de um ex-presidente que sequer havia sido convocado a declarar”.
Durante a tarde, Lula deu entrevista coletiva, na qual foi contundente. “Não era necessário que Moro enviasse agentes na minha casa e na dos meus filhos, ou na dos meus companheiros de militância”, disse com ar indignado, recordando que somente este ano já compareceu em três ocasiões para prestar declarações. “Foi um gesto de prepotência”, agregou.
Lula recordou que durante seus dois mandatos (entre 2003 e 2010) se concedeu autonomia à Polícia Federal e independência ao Ministério Público. “Fizemos isso porque acreditamos na democracia. O Moro, não. Muito antes do Moro, eu já era um democrata. Enquanto ele não fazia nada, nós já lutávamos para devolver a democracia ao país”, disse ele.
O ex-presidente se declarou indignado pela afronta e criticou o operativo da Polícia Federal, o tribunal de Moro e os grandes meios de comunicação: “às 7 da manhã, quando meus advogados não sabiam de nada, e eu menos, alguns meios já anunciavam o operativo.
Os argumentos da Polícia Federal e do Ministério Público para solicitar a condução coercitiva de Lula, prontamente acatados pelo juiz Moro, se referem de maneira vaga às contribuições de grandes empresas ao Instituto Lula. Ademais, se insinua que as palestras realizadas por Lula no Brasil e em outros países eram um disfarce para lavar o dinheiro supostamente desviado da Petrobras.
Lula também é acusado de ter ocultado patrimônio, em especial um apartamento no decadente balneário de Guarujá e um sítio localizado a uma hora e meia de São Paulo. Os dois imóveis seriam fruto da propina desviada para Lula.
O ex-mandatário já assegurou reiteradamente que não é dono do apartamento na praia, nem do sítio, que pertence a um antigo companheiro de militância, seu amigo há mais de 40 anos.
Lula explicou que nas suas palestras no exterior, pelas quais cobra até 200 mil dólares – “tudo isso está devidamente declarado à receita”–, as perguntas do público sempre se referem às conquistas sociais alcançados pelo Brasil após sua chegada ao governo. “Por que o Bill Clinton pode vir ao Brasil, como veio há pouco, e falar na Confederação Nacional da Indústria cobrando um milhão de dólares, e eu não posso contar aos amigos africanos ou latino-americanos como nós fizemos para diminuir a miséria neste país de injustiças que eram consideradas eternas”?
Lula anunciou que está pronto para correr o país defendendo sua história e a do PT. “Queriam matar a jararaca, mas em vez de bater na cabeça bateram na causa. E a jararaca está viva e preparada para voltar, disse ele, em clara referência às eleições de 2018.
O mais grave dessa história, entretanto, é que exibiu que o esquema formado entre o juiz Moro, a Polícia Federal, o Ministério Público e a grande imprensa hegemônica encontrou seu ponto ideal.
A detenção de Lula sugere que Moro é um magistrado sem limites, e que atua em perfeita harmonia com o calendário golpista, acossando Lula e Dilma. Com isso, fortalece o debilitado processo de impugnação, que dorme na Câmara dos Deputados. Tudo isso faltando pouco mais de uma semana para as manifestações convocadas pela direita mais radical para o domingo 13 de março.
A euforia registrada no mercado financeiro – o dólar caiu fortemente, o índice Bovespa disparou como um foguete: 4.2% – mostra quem são os que se alegram com a perspectiva da defenestração de Dilma Rousseff e a degradação de Lula.
Tradução: Victor Farinelli
Cumprindo ordem do juiz de primeira instância Sérgio Moro, a Polícia Federal conduziu Lula até o aeroporto metropolitano de São Paulo, onde ele permaneceu na sala reservada às autoridades – uma gentileza concedida à figura política de maior importância no Brasil –, e prestou declarações durante quase quatro horas.
Em mais uma ocasião, Lula se irritou com as perguntas dos comissários da Polícia Federal. Por exemplo, quando lhe perguntaram sobre as garrafas de vinho –algumas importadas –, encontradas na casa de campo que o ex-presidente frequenta nos fins de semana. Também sobre os dois barquinhos que sua esposa comprou para os netos do casal. “Vocês não têm nada mais para fazer do que perguntar sobre essa estupidez?” – alfinetou Lula, em conversa com seus interrogadores.
Um advogado que acompanhou o interrogatório contou que Lula contestou todas as perguntas sem titubear um só instante.
A notícia de que o ex-presidente foi alvo de uma ordem de condução coercitiva para prestar testemunho teve imenso impacto em todo o país. Durante a tarde, Lula e a presidenta Dilma Rousseff manifestaram sua indignação pela medida adotada pelo juiz Sérgio Moro. Marco Aurélio Mello, ministro do Supremo Tribunal Federal, também criticou o abuso da medida determinada pelo responsável pelas investigações da chamada Operação Lava Jato, que investiga o esquema de corrupção descoberto na estatal Petrobras.
Figura prominente do PSDB, o principal partido de oposição, José Gregori foi ministro da Justiça e também comandou a Secretaria de Direitos Humanos durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, e denunciou o que considera “um evidente abuso do juiz de Curitiba”. O economista Luis Carlos Bresser Pereira, um dos fundadores do PSDB, foi ainda mais contundente, ao afirmar que “já é hora de que o Supremo Tribunal Federal faça uma intervenção na Operação Lava Jato, para impedir que sigam ocorrendo violações como detenções temporárias ou a condução coercitiva de um ex-presidente que sequer havia sido convocado a declarar”.
Durante a tarde, Lula deu entrevista coletiva, na qual foi contundente. “Não era necessário que Moro enviasse agentes na minha casa e na dos meus filhos, ou na dos meus companheiros de militância”, disse com ar indignado, recordando que somente este ano já compareceu em três ocasiões para prestar declarações. “Foi um gesto de prepotência”, agregou.
Lula recordou que durante seus dois mandatos (entre 2003 e 2010) se concedeu autonomia à Polícia Federal e independência ao Ministério Público. “Fizemos isso porque acreditamos na democracia. O Moro, não. Muito antes do Moro, eu já era um democrata. Enquanto ele não fazia nada, nós já lutávamos para devolver a democracia ao país”, disse ele.
O ex-presidente se declarou indignado pela afronta e criticou o operativo da Polícia Federal, o tribunal de Moro e os grandes meios de comunicação: “às 7 da manhã, quando meus advogados não sabiam de nada, e eu menos, alguns meios já anunciavam o operativo.
Os argumentos da Polícia Federal e do Ministério Público para solicitar a condução coercitiva de Lula, prontamente acatados pelo juiz Moro, se referem de maneira vaga às contribuições de grandes empresas ao Instituto Lula. Ademais, se insinua que as palestras realizadas por Lula no Brasil e em outros países eram um disfarce para lavar o dinheiro supostamente desviado da Petrobras.
Lula também é acusado de ter ocultado patrimônio, em especial um apartamento no decadente balneário de Guarujá e um sítio localizado a uma hora e meia de São Paulo. Os dois imóveis seriam fruto da propina desviada para Lula.
O ex-mandatário já assegurou reiteradamente que não é dono do apartamento na praia, nem do sítio, que pertence a um antigo companheiro de militância, seu amigo há mais de 40 anos.
Lula explicou que nas suas palestras no exterior, pelas quais cobra até 200 mil dólares – “tudo isso está devidamente declarado à receita”–, as perguntas do público sempre se referem às conquistas sociais alcançados pelo Brasil após sua chegada ao governo. “Por que o Bill Clinton pode vir ao Brasil, como veio há pouco, e falar na Confederação Nacional da Indústria cobrando um milhão de dólares, e eu não posso contar aos amigos africanos ou latino-americanos como nós fizemos para diminuir a miséria neste país de injustiças que eram consideradas eternas”?
Lula anunciou que está pronto para correr o país defendendo sua história e a do PT. “Queriam matar a jararaca, mas em vez de bater na cabeça bateram na causa. E a jararaca está viva e preparada para voltar, disse ele, em clara referência às eleições de 2018.
O mais grave dessa história, entretanto, é que exibiu que o esquema formado entre o juiz Moro, a Polícia Federal, o Ministério Público e a grande imprensa hegemônica encontrou seu ponto ideal.
A detenção de Lula sugere que Moro é um magistrado sem limites, e que atua em perfeita harmonia com o calendário golpista, acossando Lula e Dilma. Com isso, fortalece o debilitado processo de impugnação, que dorme na Câmara dos Deputados. Tudo isso faltando pouco mais de uma semana para as manifestações convocadas pela direita mais radical para o domingo 13 de março.
A euforia registrada no mercado financeiro – o dólar caiu fortemente, o índice Bovespa disparou como um foguete: 4.2% – mostra quem são os que se alegram com a perspectiva da defenestração de Dilma Rousseff e a degradação de Lula.
Tradução: Victor Farinelli
Créditos da foto: Ricardo Stuckert/ Instituto Lula
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