Sérgio Barroso
Conforme análise acurada do economista
marxista britânico Michael Roberts, a situação da economia global pode ser
assim resumida:(i) novo impulso especulativo nas bolsas de valores, ao lado do
crédito farto e barato; (ii) preços baixos da energia (petróleo);(iii) aumento
do endividamento empresarial privado; (iv) desaceleração do crescimento
econômico e queda dos investimentos e lucros. “Alguma coisa tem que acabar
explodindo”, assevera ele.
No mesmo texto, Roberts informa que,
segundo o novo economista-chefe do FMI Maurice Obstfeld, a queda global nos
preços de petróleo podem levar a uma onda de calotes no pagamento das dívidas
públicas (títulos soberanos) e privadas mundo afora. Assim, estimular a demanda
econômica global e reformar o sistema financeiro seriam medidas agora “ainda
mais urgentes”. [1]
Ora, no cenário traçado por Roberts
deve-se necessariamente acrescer a cíclica volatilidade – nenhuma tendência
fixa, por óbvio – nos mercados bursáteis globais como parte integrante das
incertezas e fuga de risco que devem intensificar-se na medida em que o quadro
internacional tende efetivamente a se agravar.
Assim, noticiou-se nesta quarta-feira
(6/4/2016): a) para o estrategista da Nomura Securities, do grande truste
financeiro japonês de Nova York, “Há claramente um elemento de fuga de risco
presente nos movimentos do mercado no começo de abril”; b) o que veio
acompanhado a notícia de que o PMI (índice geral de compras para indústria e
serviços) da Zona do euro ficou estável apesar do anúncio do BCE (Banco Central
Europeu) injetar enormes novos estímulos monetários; assim como o PMI da
Alemanha, carro-chefe da economia europeia, registrou em março o menor
crescimento em oito meses; c) evidente sinal de que pode estar no horizonte
nova tormenta financeira é o anúncio do FED (Banco Central dos EUA) de que não
vai elevar a taxa básica de juros em abril. [2]
Mais ainda. Nesse 07/04/2016
informou-se, em reunião a “porta fechadas”, [3] em Berlim, com Lagarde (FMI),
Merkel, Azevedo (OMC), Kim (Banco Mundial), Gurría (OCDE) e Ryder (OIT)
concluiu-se que: 1) o crescimento econômico mundial “continua medíocre, frágil
e permanecerá abaixo das tendências históricas do pós-guerra, ninguém sabe por quanto
tempo”. 2) E que neste 2016 mais 2,3 milhões de trabalhadores serão
desempregados, somando “quase” 200 milhões deles.
Mergulho
sistêmico da produção industrial
Refletindo o cumulativo processo de
desaceleração da economia mundial, em curso, a indústria de transformação
mundial [4] no quarto trimestre de 2015 cresceu 1,9% em relação ao mesmo
período de 2014, mantendo tendência de desaceleração iniciada no segundo
trimestre de 2014 (países desenvolvidos como nos emergentes e em
desenvolvimento). As principais razões apontadas: a fraca retomada da demanda e
em especial, dos investimentos mundiais. Em comparação a julho-setembro, a
fabricação de manufaturas caiu 0,5% em outubro-dezembro de 2015.
Ratificando a desaceleração, relativamente a
2014, “emergentes” e em desenvolvimento obtiveram expansão de 4,6% da indústria
de transformação no quarto trimestre de 2015 puxada por China e América Latina.
Neste quadrimestre a produção de manufaturas chinesa embora tenha crescido
6,5%, isto representou a menor taxa desde 2005.
Já a indústria de transformação da América
Latina assinalou variação negativa de 4% em outubro-dezembro de 2015, frente ao
mesmo período de 2014, tendo sido a retração de 2,9% em julho-setembro nesta
comparação (exceto o México +2,2%). A produção de manufaturas no Brasil caiu
12,4% neste período, Argentina -0,9%, Chile -1,5%, Colômbia -0,4% e Peru -0,8%.
Os principais fatores da queda seriam: a) baixa dos preços das commodities; b) a desaceleração chinesa;
c) o arrefecimento das dinâmicas nacionais do crescimento econômico.
A
“vertigem” chinesa
Ocorre que a China – enfatize-se vez por
todas – vem reafirmando, sob vários ângulos, seu reposicionamento geopolítico
mundial. Conforme estudo de Chandrasekhar e Gosh, com base nos dados do World Economic
Outlook do FMI (outubro de 2015), houve queda expressiva na participação das
economias desenvolvidas, de 83% para 60% do PIB global nos últimos 30 anos. O
período de 2002 a 2013 abarcou uma queda de 80% para 62%. A ascensão
historicamente vertiginosa da China significou o crescimento de sua
participação de 3% para 15% no PIB mundial, isto representando 87% da queda de
presença dos países referidos entre os anos 1980 e 2015. [5]
No plano imediato, simultaneamente ao
processo de desaceleração de sua economia, que sabidamente retifica sua
estratégia de desenvolvimento, a China bateu fulminante recorde em fusões e
aquisições no primeiro trimestre deste ano. Segundo o Financial Times, as
compras por empesas chinesas de estrangeiras somaram US$ 101 bilhões, quase 15%
do total dessas. ChenChina, Dalian Wanda e AbangInsurance destacaram-se no
movimento que somou US$ 682 bilhões no mundo inteiro nesses três meses. Em
contraposição, para fontes do FT “impressiona ver a queda de atividade nos
EUA”. [6]
Capitalismo
neoliberal “drogado”
Na direção do assinalado acima por
Roberts, o oligopólio financeiro JP Morgan calcula que a taxa de investimento
de capital cresceu a menos de 1% ao ano, em termos mundiais, no primeiro
trimestre deste ano. Ano passado, o
investimento das empresas caíra 2,1% no último trimestre de 2015, a primeira
queda trimestral em mais de três anos.
Evidente que a situação da economia
mundial continua sendo marcada nitidamente por um longo processo de estagnação
– depressão para inúmeros pesquisadores – do centro capitalista, desde 2013
agora afetando duramente as economias periféricas e não possuidoras de moeda
conversível.
Provavelmente, a melhor definição para o
atual estágio da crise gestada em 2007-8 foi explicitada pelo banqueiro Dick Fischer
(09/03/2016), nada menos que antigo presidente do Banco Central dos EUA), de
Dallas: “Nós injetamos cocaína e heroína no sistema” para criar um efeito
riqueza e “agora estamos a mantê-lo com Ritalina” (medicamento para tratar
déficit de atenção, também antidepressivo). [7]
Fisher reconhece assim – cinicamente –
que o tratamento para a economia com cocaína e heroína não funcionou “apesar do
seu êxito em elevar preços de ativos”.
O ex-diretor do Banco Central dos Estados Unidos confirmou – e repetiu –
então o que outros economistas e organismos multilaterais do mainstream: “O FED é uma arma gigante à
qual já não restam munições”.
Sim: Fischer representa bem a gangue de
bandidos e loucos que tomaram de assalto o capitalismo “drogado” do farwest americano!
NOTAS
[1] Ver em:
http://www.sinpermiso.info/textos/el-dinero-barato-los-precios-del-petroleo-bajos-y-la-deuda-de-las-empresas
[2] Em: “Incertezas voltam a incomodar mercados”, José de Castro, Valor
Econômico, 06/04/2016.
[3] Em: “Líderes globais têm visão pessimista para os próximos anos”,
Assis Moreira, Valor Econômico, 07/04/2016.
[4] Dados e informações do IEDI (Instituto de Estudos para o
Desenvolvimento Industrial), em “Produção da Indústria de Transformação Mundial
no Último Trimestre de 2105: Tombo na América do Sul”, 25 de Março de 2016 – nº
725.
[5] Dados em: “Assim é (se lhe parece)!, L. Belluzzo e G. Galípolo,
Valor Econômico, 05/04/2016.
[6] Ver: “Fatia da China em fusões e aquisições globais é recorde”,
Valor Econômico, 1/04/2016.
[7] Ver: orig:
http://www.zerohedge.com/news/2016-03-09/former-fed-president-we-injected-cocaine-and-heroin-system-create-wealth-effect
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