quinta-feira, 14 de abril de 2016

Crise capitalista global persiste em cenário sombrio



Crise capitalista global persiste em cenário sombrio

Sérgio Barroso

Conforme análise acurada do economista marxista britânico Michael Roberts, a situação da economia global pode ser assim resumida:(i) novo impulso especulativo nas bolsas de valores, ao lado do crédito farto e barato; (ii) preços baixos da energia (petróleo);(iii) aumento do endividamento empresarial privado; (iv) desaceleração do crescimento econômico e queda dos investimentos e lucros. “Alguma coisa tem que acabar explodindo”, assevera ele.

No mesmo texto, Roberts informa que, segundo o novo economista-chefe do FMI Maurice Obstfeld, a queda global nos preços de petróleo podem levar a uma onda de calotes no pagamento das dívidas públicas (títulos soberanos) e privadas mundo afora. Assim, estimular a demanda econômica global e reformar o sistema financeiro seriam medidas agora “ainda mais urgentes”. [1]

Ora, no cenário traçado por Roberts deve-se necessariamente acrescer a cíclica volatilidade – nenhuma tendência fixa, por óbvio – nos mercados bursáteis globais como parte integrante das incertezas e fuga de risco que devem intensificar-se na medida em que o quadro internacional tende efetivamente a se agravar.

Assim, noticiou-se nesta quarta-feira (6/4/2016): a) para o estrategista da Nomura Securities, do grande truste financeiro japonês de Nova York, “Há claramente um elemento de fuga de risco presente nos movimentos do mercado no começo de abril”; b) o que veio acompanhado a notícia de que o PMI (índice geral de compras para indústria e serviços) da Zona do euro ficou estável apesar do anúncio do BCE (Banco Central Europeu) injetar enormes novos estímulos monetários; assim como o PMI da Alemanha, carro-chefe da economia europeia, registrou em março o menor crescimento em oito meses; c) evidente sinal de que pode estar no horizonte nova tormenta financeira é o anúncio do FED (Banco Central dos EUA) de que não vai elevar a taxa básica de juros em abril. [2]

Mais ainda. Nesse 07/04/2016 informou-se, em reunião a “porta fechadas”, [3] em Berlim, com Lagarde (FMI), Merkel, Azevedo (OMC), Kim (Banco Mundial), Gurría (OCDE) e Ryder (OIT) concluiu-se que: 1) o crescimento econômico mundial “continua medíocre, frágil e permanecerá abaixo das tendências históricas do pós-guerra, ninguém sabe por quanto tempo”. 2) E que neste 2016 mais 2,3 milhões de trabalhadores serão desempregados, somando “quase” 200 milhões deles.

Mergulho sistêmico da produção industrial

Refletindo o cumulativo processo de desaceleração da economia mundial, em curso, a indústria de transformação mundial [4] no quarto trimestre de 2015 cresceu 1,9% em relação ao mesmo período de 2014, mantendo tendência de desaceleração iniciada no segundo trimestre de 2014 (países desenvolvidos como nos emergentes e em desenvolvimento). As principais razões apontadas: a fraca retomada da demanda e em especial, dos investimentos mundiais. Em comparação a julho-setembro, a fabricação de manufaturas caiu 0,5% em outubro-dezembro de 2015.
 Ratificando a desaceleração, relativamente a 2014, “emergentes” e em desenvolvimento obtiveram expansão de 4,6% da indústria de transformação no quarto trimestre de 2015 puxada por China e América Latina. Neste quadrimestre a produção de manufaturas chinesa embora tenha crescido 6,5%, isto representou a menor taxa desde 2005.

 Já a indústria de transformação da América Latina assinalou variação negativa de 4% em outubro-dezembro de 2015, frente ao mesmo período de 2014, tendo sido a retração de 2,9% em julho-setembro nesta comparação (exceto o México +2,2%). A produção de manufaturas no Brasil caiu 12,4% neste período, Argentina -0,9%, Chile -1,5%, Colômbia -0,4% e Peru -0,8%. Os principais fatores da queda seriam: a) baixa dos preços das commodities; b) a desaceleração chinesa; c) o arrefecimento das dinâmicas nacionais do crescimento econômico.

A “vertigem” chinesa

Ocorre que a China – enfatize-se vez por todas – vem reafirmando, sob vários ângulos, seu reposicionamento geopolítico mundial. Conforme estudo de Chandrasekhar e Gosh, com base nos dados do World Economic Outlook do FMI (outubro de 2015), houve queda expressiva na participação das economias desenvolvidas, de 83% para 60% do PIB global nos últimos 30 anos. O período de 2002 a 2013 abarcou uma queda de 80% para 62%. A ascensão historicamente vertiginosa da China significou o crescimento de sua participação de 3% para 15% no PIB mundial, isto representando 87% da queda de presença dos países referidos entre os anos 1980 e 2015. [5]

No plano imediato, simultaneamente ao processo de desaceleração de sua economia, que sabidamente retifica sua estratégia de desenvolvimento, a China bateu fulminante recorde em fusões e aquisições no primeiro trimestre deste ano. Segundo o Financial Times, as compras por empesas chinesas de estrangeiras somaram US$ 101 bilhões, quase 15% do total dessas. ChenChina, Dalian Wanda e AbangInsurance destacaram-se no movimento que somou US$ 682 bilhões no mundo inteiro nesses três meses. Em contraposição, para fontes do FT “impressiona ver a queda de atividade nos EUA”. [6]

Capitalismo neoliberal “drogado”

Na direção do assinalado acima por Roberts, o oligopólio financeiro JP Morgan calcula que a taxa de investimento de capital cresceu a menos de 1% ao ano, em termos mundiais, no primeiro trimestre deste ano.  Ano passado, o investimento das empresas caíra 2,1% no último trimestre de 2015, a primeira queda trimestral em mais de três anos.

Evidente que a situação da economia mundial continua sendo marcada nitidamente por um longo processo de estagnação – depressão para inúmeros pesquisadores – do centro capitalista, desde 2013 agora afetando duramente as economias periféricas e não possuidoras de moeda conversível.

Provavelmente, a melhor definição para o atual estágio da crise gestada em 2007-8 foi explicitada pelo banqueiro Dick Fischer (09/03/2016), nada menos que antigo presidente do Banco Central dos EUA), de Dallas: “Nós injetamos cocaína e heroína no sistema” para criar um efeito riqueza e “agora estamos a mantê-lo com Ritalina” (medicamento para tratar déficit de atenção, também antidepressivo). [7]

Fisher reconhece assim – cinicamente – que o tratamento para a economia com cocaína e heroína não funcionou “apesar do seu êxito em elevar preços de ativos”.   O ex-diretor do Banco Central dos Estados Unidos confirmou – e repetiu – então o que outros economistas e organismos multilaterais do mainstream: “O FED é uma arma gigante à qual já não restam munições”. 

Sim: Fischer representa bem a gangue de bandidos e loucos que tomaram de assalto o capitalismo “drogado” do farwest americano!

 NOTAS

[1] Ver em: http://www.sinpermiso.info/textos/el-dinero-barato-los-precios-del-petroleo-bajos-y-la-deuda-de-las-empresas
[2] Em: “Incertezas voltam a incomodar mercados”, José de Castro, Valor Econômico, 06/04/2016.

[3] Em: “Líderes globais têm visão pessimista para os próximos anos”, Assis Moreira, Valor Econômico, 07/04/2016.

[4] Dados e informações do IEDI (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), em “Produção da Indústria de Transformação Mundial no Último Trimestre de 2105: Tombo na América do Sul”, 25 de Março de 2016 – nº 725.

[5] Dados em: “Assim é (se lhe parece)!, L. Belluzzo e G. Galípolo, Valor Econômico, 05/04/2016.

[6] Ver: “Fatia da China em fusões e aquisições globais é recorde”, Valor Econômico, 1/04/2016.

[7] Ver: orig: http://www.zerohedge.com/news/2016-03-09/former-fed-president-we-injected-cocaine-and-heroin-system-create-wealth-effect



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