sábado, 22 de abril de 2017

CARTA DO ADVOGADO CRISTIANO ZANIN AO JORNALISTA MERVAL PEREIRA

CARTA DO ADVOGADO CRISTIANO ZANIN AO JORNALISTA MERVAL PEREIRA


São Paulo, 21 de abril de 2017
Ao
Merval Pereira
Colunista de O Globo
Membro do Conselho Editorial da Globo

Senhor jornalista:

Verdadeiro “segredo de Polichinelo”, título de sua coluna de hoje (Edição 21/04/2017), é a participação ampla, direta e ilegítima das Organizações Globo na perseguição ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com o intuito de prejudicar ou inviabilizar sua atuação política. A aliança entre a Globo e os agentes públicos que integram a Lava-Jato - hoje alçados à condição de artistas de um filme estarrecedor, que viola os mais elementares direitos fundamentais do investigado – já foi mais discreta. Hoje, a Globo dita as acusações contra Lula e disponibiliza os seus veículos de comunicação para colocá-las em pé.
A história do chamado tríplex do Guarujá é um bom exemplo disso.  Foi a Globo, em 2010, que iniciou essa farsa de que Lula seria o proprietário do apartamento 164-A do Condomínio Solaris. Deu holofote a três promotores de Justiça de São Paulo que promoveram um grande espetáculo midiático, transmitido ao vivo pela emissora. Na sequencia, o assunto do Guarujá foi parar em Curitiba, nas mãos de uma nova instituição criada no país à revelia da Constituição Federal – a chamada Força Tarefa da Lava-Jato. E, mais uma vez, o tríplex foi alvo de coletiva transmitida ao vivo pela emissora, com ajuda de um anedótico PowerPoint.
Mas o que dizem os fatos? Após 24 audiências e o testemunho de 73 depoentes compromissados com a verdade, ruiu a acusação de que Lula teria recebido a propriedade desse apartamento como contrapartida de três contratos firmados entre a OAS e a Petrobras. No rol de testemunhas estavam funcionários da OAS que afirmaram não ser Lula o proprietário e que o ex-presidente visitou o local uma única vez, para afirmar se tinha interesse na compra, mas rejeitou.
A Globo e seus aliados não se rendem à verdade. E isso pode ser bem observado ontem. O jornal Valor Econômico, hoje 100% de propriedade do grupo, publicou 3 horas antes do depoimento de Léo Pinheiro ao Juízo de Curitiba, o script da audiência de ontem. Antecipou a troca dos advogados que iria ocorrer, considerando retomada de negociações em busca de uma delação premiada. E deixou claro que o executivo da OAS iria acusar Lula – sem provas – como condição de ver a sua delação aceita pelo Ministério Público Federal. Foi o que ocorreu. Léo Pinheiro deu aos procuradores da República a sonhada narrativa contra Lula – na contramão dos 73 depoimentos anteriormente colhidos – e com isso viu crescer a chance de sair da prisão ou obter outros benefícios.
As afirmações de Léo Pinheiro, que é  corréu na ação e por isso depôs sem o compromisso de dizer a verdade, foram, no entanto, suficientes para que sua coluna concluísse que “Lula é o verdadeiro dono do tríplex e do sítio de Atibaia”. E o senhor foi além: fez ataques diretos e levianos a mim e ao advogado Roberto Teixeira.
Avalio que o senhor sequer assistiu ao vídeo da audiência. Se tivesse assistido, saberia que Léo Pinheiro respondeu às minhas perguntas dizendo que Lula jamais teve as chaves ou usou o imóvel; jamais manteve qualquer pertence pessoal no local; jamais usou ou teve qualquer título de propriedade do apartamento. Ou seja, Léo Pinheiro ao responder às minhas questões – independentemente da versão que havia combinado para ter sua delação premiada aceita – reconheceu que o ex-presidente jamais praticou qualquer ato que pudesse indicar posse, uso ou gozo do apartamento, que são os atributos necessários para a configuração da propriedade segundo o artigo 1.228 do Código Civil.
Léo Pinheiro ainda reconheceu que deu o mesmo tríplex que afirmara ser de Lula em garantia para obtenção de recursos para a OAS, o que torna risível a tese por ele sustentada sobre a propriedade do imóvel em garantia, em sucessivas operações, para captar dinheiro no mercado! A situação, portanto, é bem diversa daquela apresentada aos seus leitores.
Registro igualmente que Léo Pinheiro negou quando perguntado se algum recurso utilizado no tal tríplex era proveniente da Petrobras. A Folha de S. Paulo, por exemplo, registrou isso nas suas páginas na data de hoje. Mas o senhor preferiu mentir aos leitores, dizendo que Léo Pinheiro teria afirmado que “o apartamento foi pago com a propina que o PT obteve com obras na Petrobras”.
Na tentativa de agrediu minha atuação profissional, o senhor disse que “o advogado de Lula tentou uma última cartada, que acabou comprometendo ainda mais o cliente”. E narra a seguir que eu teria denunciado a Sergio Moro a prática de um crime praticado por Léo Pinheiro: “Segundo Zanin, se o apartamento é de Lula, a empreiteira cometeu um crime ao dizer-se dona do apartamento”. Todavia, efetivamente, quem assistir a gravação da audiência verá que não fiz qualquer afirmação nesse sentido. Por má-fé ou imprudência, o senhor comete até mesmo erros factuais em suas análises, e esse é um deles.
Quem de fato fez tal colocação foi o ilustre advogado José Roberto Batochio, ex-presidente da OAB Nacional, com o qual tenho a honra de atuar, afirmando – corretamente, ao meu ver – que as colocações mentirosas de Léo Pinheiro poderiam, em tese, configurar o crime previsto no artigo 171, § 2º, inciso 1º, do Código Penal. O senhor, portanto, errou a pessoa e o tema na sua análise.
Ainda na tentativa de desqualificar a mim e a defesa do ex-presidente Lula, o senhor fez a seguinte afirmação: “O amigo de Lula, Roberto Teixeira, sogro do advogado Cristiano Zanin, chamou-o [Alexandrino Alencar] em seu escritório e combinou fazerem notas frias para regularizar despesas”. Essa situação, todavia, jamais existiu e não tem amparo sequer na delação do executivo da Odebrecht, que jamais fez referência a “notas frias”. Isso é criação sua, com evidente intenção de caluniar o advogado Roberto Teixeira, ex-presidente da OAB/SBC e que tem uma história ilibada de 47 anos de advocacia.
A propósito, se o senhor e a Globo realmente tivessem interesse na delação da Odebrecht, deveriam começar explicando a tal “sociedade secreta” que Emílio Odebrecht afirmou ter mantido com a emissora para influir em decisões de governo na era do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, no tocante à privatização da área de telefonia e petróleo. Houve apenas lobby? Tráfico de influência? Por que a Globo até hoje não se manifestou sobre esses graves fatos apontados por Emílio Odebrecht? Prepotência? Falta de uma versão convincente?
Avalio, Merval, que o senhor jamais conseguirá esconder um outro verdadeiro “segredo de Polichinelo” – o mal que a Globo faz ao País e à democracia.


Cristiano Zanin Martins

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