Brasil será denunciado na OEA por violar direitos dos povos indígenas
24 de maio de 2017 Destaque, Racismo Ambiental Combate Racismo
Ambiental
Cerca de 28 organizações denunciam na Comissão Interamericana de
Direitos Humanos os retrocessos nos direitos dos povos indígenas
Por Izabela Sanchez, no De Olho nos Ruralistas
Cerca de 28 organizações de apoio aos povos indígenas denunciam o
Brasil, nesta quarta-feira (24/05), na Organização dos Estados
Americanos (OEA). O grupo entrega em Buenos Aires um documento com as
denúncias, durante uma audiência – “Mudanças em políticas públicas e
leis sobre povos indígenas e quilombolas no Brasil” – com o
secretário-executivo da Comissão Interamericana de Direitos Humanos,
Paulo Abrão.
As denúncias à Comissão relatam os ataques no campo e o desmonte da
Fundação Nacional do Índio (Funai). O país pode ser julgado e condenado
pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, já que é signatário e
fundador da OEA.
O documento discute o atual governo e destaca legendas como PSC, PP e
PMDB por protagonizarem retrocessos. E observa que o tema foi objeto de
vasta análise pelo Conselho Nacional de Direitos Humanos, que realizou
missão em 2016 para levantar a situação dos direitos humanos dos povos
indígenas nos Estados de Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul:
– O Conselho Nacional de Direitos Humanos identificou um padrão de
violações e conflitos exacerbados, travados por políticos que têm como
bandeira a negação dos direitos indígenas, o que se repete em diversas
regiões do país, notadamente Sul, Nordeste e Centro-Oeste.
DESMONTE DA FUNAI
O documento elaborado pelas organizações explica que hoje a Funai tem
2.142 funcionários, em contraste com o total de cargos autorizados pelo
Ministério do Planejamento: 5.965.
Os grupos criticam a nomeação do deputado federal Osmar Serraglio (PMDB)
para o Ministério da Justiça, que coordena a Funai, e relembram que ele
foi relator da Proposta de Emenda Constitucional 215 (PEC 215), cujo
objetivo é transferir do Executivo para o Legislativo a palavra final
sobre demarcações de territórios indígenas, quilombolas e unidades de
conservação ambiental.
Assessor jurídico da Articulação dos povos indígenas do Brasil (Apib), o
Terena Luiz Eloy lembra que a OEA já foi acionada diversas vezes. Mas
desta vez as organizações dão destaque aos retrocessos nas políticas
públicas. “Uma das temáticas que sensibilizaram a Comissão foi
justamente esses retrocessos de direitos”, conta. “A audiência foi
solicitada com foco nas mudanças de políticas públicas e legislativas
que estão afetando os povos indígenas”.
O advogado Terena lembra que o país é signatário do pacto São José da
Costa Rica, assinado em 22 de novembro de 1969 e ratificado em setembro
de 1992. Para Luiz Henrique Eloy, enquanto vários Estados americanos
avançam na proteção de direitos humanos “o Estado brasileiro está indo
na contramão, está retrocedendo”.
GOVERNO RURALISTA
Luiz Henrique Eloy diz que hoje não há bancada ruralista, mas governo
ruralista:
– Eles tomaram conta de todas as instâncias. Direitos que já foram
conquistados e consagrados na Constituição Federal hoje estão sendo
ameaçados, diante de interesses políticos e econômicos de classes
dominantes no Brasil.
O documento observa que as demarcações de terra no Brasil estão
paralisadas desde 2012, e a Funai se arrasta para concluir cerca de 241
processos. Para as organizações, a questão ocorre pela relação de
cumplicidade entre o agronegócio, o governo federal e os governos
estaduais.
Os defensores de direitos também destacam a tese do marco temporal,
jurisprudência consolidada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) após o
julgamento da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Esse entendimento
jurídico afirma que só podem ser demarcadas as terras que tiveram
efetiva ocupação indígena no ano da promulgação da Constituição, em
1988.
As organizações afirmam que a tese tem sido tomada como parâmetro pelo
governo, desde 2013, o que identificam como um ponto crítico. Elas dizem
que as condicionantes do caso Raposa Serra do Sol e a tese do marco
temporal passaram a orientar a Advocacia Geral da União no sentido de
limitar a defesa judicial dos direitos indígenas. E isso leva a um
cenário jurídico altamente desfavorável:
– Nos últimos anos também cresceu o número de ordens judiciais
determinando o despejo de comunidades indígenas de suas próprias terras,
a paralisação e até a anulação de processos de demarcação de terras, com
base na tese do marco temporal, mesmo que em contextos totalmente
distintos da Raposa Serra do Sol.
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