Nesta quinta-feira (22), em
audiência pública do Senado, o comandante do Exército, general Eduardo Villas
Bôas, afirmou que o Brasil é uma nação sem consciência da sua própria grandeza
e das riquezas de seu território.
Segundo o comandante Villas
Bôas, projeções feitas pelo Exército calculam em cerca de U$ 23 trilhões o
potencial em recursos naturais existentes na região amazônica. Apesar disso,
não existe nenhum projeto de aproveitamento destas gigantescas riquezas, o que
revela a ausência de um projeto nacional.
Ele concordou com a afirmação
do senador Roberto Requião (PMDB-PR) para quem “o Brasil é grande demais pra
abrir mão de um projeto nacional”.
“É exatamente isso, o Brasil
é um superdotado num corpo de adolescente. A Amazônia continua praticamente
abandonada, falta um projeto e densidade de pensamento”, enfatizou o comandante
do Exército, que voltou a reiterar declarações recentes dadas à imprensa de que
“o Brasil está à deriva, sem rumo”, como consequência de um acúmulo de crises
que iria além de seus aspectos econômicos.
“Se fôssemos um país pequeno,
poderíamos nos agregar a um projeto de desenvolvimento de outro país. Como
ocorre com muitos. Mas o Brasil não pode fazer isso, não temos alternativa a
não ser sermos uma potência. Não uso esse termo na conotação negativa,
relacionada a imperialismo, mas no sentido de que necessitamos de uma densidade
muito grande”, salientou.
Ele reforçou que o Brasil
precisa de um projeto de desenvolvimento nacional com um plano estratégico de
monitoramento de fronteiras e defesa cibernética. “Todos os programas estão
sofrendo restrições e atrasos”, destacou ele, se referindo ao congelamento de
gastos imposto pelo governo de Michel Temer, que cortou os investimentos por 20
anos, colocando em risco esses projetos.
Questionado sobre a
possibilidade de intervenção militar, invocada por setores da direita
conservadora, o general foi categórico: “É muito triste que a população veja
como alternativa uma intervenção militar. Isso está absolutamente anacrônico,
haja vista o que aconteceu na Turquia. Esta hipótese está absolutamente
afastada”.
Polarização política
Em uma análise profunda da
atual conjuntura política, em que a polarização afastou o debate político dando
vazão à antipolítica, Villas Bôas afirmou que um dos equívocos cometidos pela
sociedade brasileira foi deixar-se levar pelas linhas de confrontação
ideológica existentes na Guerra Fria, o que dividiu setores, levou ao abandono
de um projeto nacional e evolui hoje para a “perda da identidade e o
estiolamento da autoestima”.
Sobre os projetos anunciados
pelo governo Temer, que ampliam a liberação para exploração estrangeira em
relação a minérios, assim como também a venda de terras para estrangeiros,
Villas Bôas disse ser contrário à venda de terras nas regiões fronteiriças,
reiterando que se absteria de comentar a questão em relação a outras partes do
território.
Projeto de Temer sobre exploração estrangeira
No entanto, o comandante do
Exército fez questão de reiterar que vê com “preocupação” uma maior abertura
para a exploração das riquezas minerais por empresas estrangeiras. Ele citou
levantamentos feitos pelo Exército que indicam uma “estranha coincidência”
entre a demarcação de terras indígenas com a presença das riquezas minerais.
Segundo ele, a Bolsa de
Futuros relacionada à exploração mineral sedia-se no Canadá, de onde advém
grande parte da pressão internacional pela instalação de unidades de
conservação.
“Eles trabalham no sentido de
neutralizar áreas, amortecer, já que não têm a capacidade de explorar
imediatamente. E ficam esperando certamente momentos oportunos pra buscar estas
oportunidades, então acho que isso tem que ser muito considerado”, denunciou.
Villas Bôas disse ainda que é
preciso entender que não há contradição entre desenvolvimento e preservação
ambiental, no que se refere à Amazônia.
“Morei lá por oito anos e
penso justamente o oposto. O que vai salvar a região amazônica, inclusive a
natureza, é o desenvolvimento. É a implantação de polos intensivos para
empregar aquela grande mão de obra, impedindo que ela vá viver do desmatamento
extensivo”, argumentou, afirmando que a Amazônia é um reflexo da ausência de um
projeto como um todo para o país e sua “vulnerabilidade” à ações externas.
Crítica ao decreto de Temer
O general afirmou que o uso
de militares em atividades de segurança pública é “desgastante, perigoso e
inócuo” e disse que o modelo, usado por meio de decretos presidenciais, deveria
ser repensado.
A afirmação do general Villas
Bôas foi uma crítica à decisão de Temer de convocar as Forças Armadas para
conter manifestações contra as reformas trabalhista e previdenciária, de 24 de
maio, conflagradas por uma greve geral convocada pelas centrais sindicais que
paralisou o país.
Por meio de decreto, Temer
convocou o Exército a fazer a segurança do Distrito Federal por uma semana.
Após uma saraivada de críticas, o governo revogou o decreto em menos de 24
horas após a sua publicação.
“Nós não gostamos desse tipo
de emprego. Não gostamos”, disse o general aos senadores.
Villas Bôas disse que,
internamente, o recurso ao decreto “causou agora recentemente alguma celeuma”.
O general também criticou o
uso das Forças Armadas em operações classificadas como “garantia da lei e da
ordem”, entre as quais a ocupação da Favela da Maré, no Rio de Janeiro.
“Eu, periodicamente, ia até
lá [Favela da Maré] e acompanhava nosso pessoal, nossas patrulhas na rua. E um
dia me dei conta, nossos soldados, atentos, preocupados, são vielas, armados, e
passando crianças, senhoras, pensei, estamos aqui apontando arma para a
população brasileira, nós estamos numa sociedade doente”, relatou.
“Lá [na favela da Maré]
ficamos 14 meses. No dia em que saímos, uma semana depois, tudo havia voltado
ao que era antes. Temos que realmente repensar esse modelo de emprego, porque
ele é desgastante, perigoso e inócuo”, complementou Villas Bôas.
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