Moniz Bandeira*
Insisto, em nada tenho
ilusão. Sei que tudo pode acontecer, se houver uma intervenção militar. Mas o
fato é que, se Dilma Rousseff foi deposta por um golpe de Estado, e de fato
foi, não mais existe Estado de Direito nem democracia no Brasil.
Acabou a Constituição.
O governo, que só conta com a
simpatia de cerca de 4% da população, realiza reformas para as quais não teve
mandato.
O Congresso, corrompido e
desmoralizado, assumiu poderes constituintes para os quais não foi eleito.
Nada do que ocorreu e está a
ocorrer é constitucional.
Nada tem legitimidade.
E o golpe de Estado foi dado
exatamente para a execução de tais reformas: trabalhista, previdenciária,
terceirização, redução do Estado, com a venda das empresas públicas, impedir os
gastos públicos por 20 anos etc. E as forças econômicas, nacionais e estrangeiras,
que estão por trás do presidente de fato Michel Temer e do seu sinistro
ministro da Fazenda, o banqueiro Henrique Meirelles, farão tudo para que não
haja retrocesso na execução do seu projeto, modelado pelo Consenso de
Washington.
Falar em Constituição, agora, é que é uma
grande ilusão. As liberdades são relativas, como durante o regime militar,
porém nem imprensa alternativa existe mais como naquele tempo. Toda a mídia
repete o mesmo e o alvo é o ex-presidente Lula, com judiciária a condená-lo,
sem provas, apenas para efeito de repercussão na imprensa e desmoralizá-lo.
Quanto mais ele cresce nas pesquisas mais me parece que as poderosas forças
econômicas nacionais e estrangeiras, que sustentaram o golpe do impeachment da
presidente Dilma Rousseff, tentarão tirá-lo de qualquer forma das eleições.
Tenho até dúvidas de que as
eleições ocorrerão.
Temer e demais cúmplices
sabem que, ao descer a rampa do Planalto, sem imunidade, podem ser presos e
enviados para a Papuda.
A insatisfação no meio
militar é enorme, conforme exprimiu o Antônio Olímpio Mourão. E teve toda razão
o deputado Aldo Rebelo, do PCdoB, quando recomendou o diálogo com os militares.
O proto-nazifascista Jair
Bolsonaro não é representativo das Forças Armadas. É minoria.
A intervenção militar pode
ocorrer. Como se desdobrará é difícil imaginar. O ideal seria que fosse como a
do general Henrique Teixeira Lott em 1955. Mas não creio, em face do Congresso
que aí está. O importante é impedir que o patrimônio nacional - Eletrobrás,
Eletronuclear, Petrobrás e pré-sal, bancos estatais - seja dilapidado, entregue
aos gringos: é evitar que o desenvolvimento do Brasil, com a inclusão, não seja
interrompido; é impedir a entrega aos gringos de uma parte da Amazônia maior
que a Dinamarca.
Claro que não defendo regime
de exceção, mas regime de exceção é o que já existe no Brasil, com um verniz de
legalidade.
O que ocorreu no Brasil, com
a derrubada da presidente Dilma, foi golpe de Estado, como, na Ucrânia, com a
destituição do presidente Wiktor Yanukovytch, na madrugada de 21 para 22 de
fevereiro de 2014, por uma decisão de um congresso comprado.
A Constituição deixou de
existir.
Ilusão é pensar que, após
realizar as reformas pretendidas pelo capital financeiro e o empresariado
nacional, as forças, que se apossaram do poder, vão deixá-lo sem ser por um
golpe de força. E, infelizmente, as forças populares já demonstraram a sua impotência.
A nada reagiram.
Não desejaria que ocorresse
intervenção. Todos sabem como começa, mas não quando termina. Porém, não estou
a ver outra perspectiva no Brasil. É necessário impedir o desmonte do Estado
nacional. E há de chegar um momento em que o impasse político, com o
agravamento da situação econômica e social, terá de ser pela força.
* Moniz Bandeira é professor universitário,
cientista político e historiador, especialista em política exterior do Brasil e
suas relações internacionais, principalmente com a Argentina e os Estados
Unidos, sendo autor de várias obras, publicadas no Brasil e na Argentina, bem
como em outros países. Atualmente encontra-se radicado na cidade alemã de
Heidelberg, onde é cônsul honorário do Brasil.
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