Terça-feira, 27 de novembro de 2018
No fim, o Brasil elegeu o poste
Arte: Daniel Caseiro.
Por Almir Felitte
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Durante a campanha presidencial, a grande mídia fez um baita esforço pra que o apelido de “poste” pegasse no então candidato do PT. O apelido nada agradável se referia ao fato de que Haddad seria, supostamente, um mero representante do verdadeiro candidato por trás da campanha: o ex-Presidente Lula, hoje preso em Curitiba.
Entre os eleitores de Bolsonaro, o apelido pegou rapidamente e se espalhou pelas redes sociais. Os incautos, porém, mal sabiam que eles mesmos estavam prestes a eleger como Presidente um dos maiores “postes” que o país já viu. E seu Governo ainda nem começou…
A dificuldade só está em saber a quem este atrapalhado “poste” pertence. Um dos suspeitos de ser dono desse “poste” é, sem dúvidas, o capital dos EUA, seja na figura de seu governo Trump, seja na figura da alta elite financeira e empresarial americana. Mas essa suspeita não vem de hoje e é mais antiga do que a própria cena do “Poste” batendo continência à bandeira americana em Miami.
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Em sua atuação como parlamentar, Bolsonaro tem um histórico no mínimo curioso para alguém que diz ser patriota. Em 2016, por exemplo, ele não pensou duas vezes antes de votar a favor do projeto que entregava de bandeja a exploração do nosso Pré-Sal às indústrias petrolíferas estrangeiras. O Tio Sam agradece.
Foi ainda como parlamentar, também, que Bolsonaro deu uma série de declarações[1] dizendo que gostaria de abrir caminho para que os americanos explorassem os minérios da nossa Amazônia. Uma “parceria” que somente um candidato digno de poste norte-americano poderia propor. Fácil de entender os motivos para Bolsonaro atacar incessantemente os indígenas e os quilombolas, cujas terras tradicionais podem ser um entrave no objetivo do “Poste” em agradar seu dono americano.
Se bem que seu ódio dirigido a essas comunidades tradicionais levanta fortes suspeitas de que, talvez, o “Poste” tenha um outro dono: a grande bancada ruralista. Afinal, a Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), nome chique da bancada, foi uma das primeiras grandes forças políticas do “Sistema” brasileiro a declararem apoio ao então candidato Bolsonaro em sua campanha.
Mas o “Poste” de latifundiário não parou aí. O apoio teve seu preço e Bolsonaro já está loteando seu futuro Governo com ruralistas que vêm pra combater “tudo isso que taí”. A Nabhan Garcia, Presidente da União Democrática Ruralista (UDR), já foi prometida uma futura Secretaria de Assuntos Fundiários, num exemplo clássico de “raposa cuidando do galinheiro”. Na comemoração pelo carguinho, Nabhan já disse que o MST deve tomar cuidado e as promessas de enquadrar o movimento como grupo terrorista mostram que o “Poste” vai realmente fazer de tudo pra agradar os ruralistas.
Mas os agrados não pararam por aí. Há sempre mais um galinheiro aguardando a nomeação de mais uma raposa. Uma das Ministras já confirmadas para o futuro Governo do “Poste” é Tereza Cristina, mais conhecida como “Musa do Veneno” por sua atuação na aprovação do “PL do Veneno”. Mas a nomeação de Tereza levanta mais uma suspeita sobre quem teria a real propriedade do “Poste” na Presidência.
Isso porque Tereza é do DEM, partido que já emplacou 3 Ministros no futuro Governo de Bolsonaro, que veio pra acabar com o “toma lá, dá cá” e com o loteamento de cargos por partidos no Brasil. À nomeação de Tereza, somam-se OnyxLorenzoni (aquele que confessou Caixa 2 em vídeo, mas pediu desculpas ao Moro, então tudo bem) na Casa Civil e Luiz Henrique Mandetta, ex-presidente da Unimed que ficará com o Ministério da Saúde.
Além das 3 nomeações, há, ainda, o flerte entre Bolsonaro e Maia, dando pinta de que a Presidência da Câmara pode ficar com o DEM também. São fortes indícios de que o DEM, antigo PFL, que é uma dissidência do antigo PDS, que nada mais era do que o sucessor da Arena (partido da Ditadura Militar) possa ser o verdadeiro dono do “Poste” que assumirá em 2019. Mas, falando em Arena, lembro que, mesmo com tantos nomes, o DEM ainda não é o grupo político com mais representantes no futuro Governo.
Quem parece dar as cartas mesmo e mandar e desmandar no “Poste” são os homens de farda. Já são 4 militares escalados para terem status de Ministro: General Carlos Santos Cruz (Secretaria do Governo), General Augusto Heleno (GSI), General Fernando Azevedo e Silva (Defesa) e Tenente-Coronel Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia).
Fosse apenas um Governo COM militares, a situação já seria problemática, mas, ao que parece, a vontade de Bolsonaro é mesmo formar um Governo DE militares. Já tem virado rotina a imprensa fazer matérias com declarações no mínimo estranhas dos militares que integrarão a cúpula do Governo falando de forma “quase carinhosa” sobre o Golpe de 64 e a Ditadura de 21 anos que se desenrolou dali.
Os valores da caserna também parecem ter voltado de vez ao Palácio do Planalto. E um símbolo da expressão desses valores pode ter sido a nomeação do novo Ministro da Educação, o colombiano Ricardo Vélez Rodríguez. Mais um encarnado na luta contra o “perigo vermelho”, ele já disse que o golpe de 1964 deveria ser motivo de comemoração para o país. Apesar de estrangeiro e não-militar, Ricardo tem suas ligações com a caserna, onde é professor emérito da Escola de Comando e Estado Maior do Exército.
Adepto de teorias “não lá muito científicas”, é mais um nome indicado pelo também “não muito científico” Olavo de Carvalho, alguém que só poderia ganhar relevância em um país que passa por uma grave crise de “não se levar a sério”. O outro nome é o de Ernesto Araújo, futuro Chanceler que já fez o país virar motivo de piada na imprensa mundial pelas teorias conspiratórias estapafúrdias sobre as quais ele costuma escrever em um tosco blog pessoal.
Questionado sobre Bolsonaro ter aceitado suas indicações, Olavo respondeu: “sou irrestível”, emendando que “eles (família Bolsonaro) leem as coisas que eu escrevo e levam a sério”. Nós também ficamos atônitos em ver que a família “Poste” leva a sério, Olavo. Nós também…
Seria, então, Olavo o dono do “Poste”? Talvez. Ou talvez o “Poste” Bolsonaro tenha mais de um dono.
Mas, entre o Governo e a elite dos EUA, os ruralistas, o DEM, os militares ou o Olavo de Carvalho, uma coisa é certa: o “Poste” Bolsonaro não foi colocado lá pra atender a interesses populares. E quando o povo brasileiro constatar que os bons resultados de uma agenda liberal de austeridade e privataria jamais chegarão, certamente haverá revolta. E é nessa hora que veremos que nenhum dos donos do “Poste” têm muito apego pela democracia.
Almir Felitte é bacharel pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.
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