segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

O QUE PODEMOS ESPERAR E COMO NOS PREPARAR PARA O BRASIL DE 2019?

O QUE PODEMOS ESPERAR E COMO NOS PREPARAR PARA O BRASIL DE 2019?

Durante três dias, um grupo de 30 brasileiros discutiu neste final de semana, durante encontro de grupos de oração, os possíveis rumos do país no próximo ano e de que forma podemos nos preparar para o ano que virá.
Entre orações, meditações, silêncios e leituras de textos, repetimos o ritual de sempre nos retiros, como acontece faz 40 anos, a serem completados em 2019.
A partir da iniciativa pioneira de psicanalistas do Rio reunidos em torno de Hélio Pellegrino, em 1979, que queriam aprofundar sua espiritualidade, sob a orientação do dominicano Frei Betto, grupos de orantes foram surgindo também em São Paulo e Belo Horizonte, a partir dos anos 80.
Em São Paulo, participei da formação do primeiro grupo de oração, formado por jornalistas que fizemos uma entrevista com Frei Betto para o “Pasquim”, de saudosa memória.
Para celebrar o aniversário desta grande confraria espiritual, marcamos um retirão para junho, no feriadão de Corpus Christi, em São Lourenço(MG), e estamos agora convidando dezenas de companheiros que passaram pelos grupos durante este período.
O clima generalizado de insegurança, medo de um retrocesso institucional e de perseguições políticas, já anunciadas em diferentes manifestações da nova ordem, pode ser resumido na dúvida lançada por uma professora ligada a movimentos sociais de educação popular:
“Mas será que vai ser possível fazer o retirão no ano que vem?”
Alguns até acharam graça no temor da colega, mas havia boas razões ali para pensarmos juntos em caminhos possíveis para enfrentar os novos desafios que certamente virão.
Nós estávamos preocupados com o que poderia acontecer a Frei Betto, a alma e o coração desses grupos, que foi nominalmente citado como um dos “vermelhos” a ser abatido pelo ministro nomeado por Bolsonaro para a Educação, o colombiano Vélez Rodrigues, indicado por Olavo de Carvalho.
Betto tratou de tranquilizar todo mundo e deixar bem claro: “Aconteça o que acontecer, eu não vou sair do Brasil. Já passei quatro anos preso durante a ditadura, sei o que é isso, mas prefiro ficar preso aqui do que ir embora”.
Quer dizer, se depender dele, vai ter retirão o ano que vem, de qualquer jeito.
Como a maioria dos integrantes dos grupos é formada por profissionais liberais, genericamente classificados de esquerda, jornalistas, advogados e professores, ouviram-se vários testemunhos dando conta de que o cerco já começou, embora falte ainda um mês para a posse do novo governo.
Para se contrapor a essa ofensiva, cada um na sua área também relatou a formação de núcleos de defesa da liberdade de cátedra e de expressão, iniciativas que vão se multiplicando pelo país, sem que haja uma coordenação ou programa comum.
“É preciso fazer alguma coisa antes que seja tarde”, ouvi de vários companheiros nos intervalos de lazer e durante as refeições.
Fazer o quê exatamente, aonde, como, com quem?
Com o gradativo esvaziamento de tradicionais movimentos sociais ligados às igrejas, universidades e sindicatos, dos quais muitos de nós participamos, desde a redemocratização do país, pela qual todos lutamos, parece que os velhos militantes de outrora andam ainda meio perdidos, diante do cenário de ameaças às liberdades democráticas que se avizinha.
Na verdade, nenhum de nós poderia sequer imaginar a repetição de um drama que vivemos, especialmente nos anos 60 e 70 do século passado, no auge da ditadura militar, quando ainda não havia grupos de oração.
Até os grupos de jovens que se formaram nos anos seguintes já têm hoje orantes de cabelos brancos e, os mais veteranos, apenas esperavam viver em paz o tempo de vida que lhes resta.
Uns se preocupam com os filhos ainda pequenos; outros, com o futuro dos netos.
Agora, é preciso reunir forças para começar tudo de novo e não perder os nossos direitos de cidadania, tão duramente reconquistados, nem faz tanto tempo.
Saber que não estamos sozinhos, cada um no seu quadrado, e que as seguidas demonstrações de intolerância ameaçam a todos igualmente, é o primeiro passo para sairmos do imobilismo e nos organizarmos em defesa dos mais vulneráveis.
Com a falência dos partidos e das lideranças da chamada sociedade civil, que entraram em prolongada hibernação faz tempo, o quadro que se desenha à nossa frente é ainda mais preocupante do que no tempo em que nos juntamos todos em defesa das eleições diretas para presidente da República, em 1984.
Quem sabe surjam agora os novos líderes para substituir a geração 68 surgida nas lutas pela redemocratização do país.
Vivemos um final de ciclo, em todas as áreas, e é nestes momentos que se revelam também novos caminhos e lideranças capazes de nos unir novamente em torno do bem comum.
As forças nem tão ocultas, daqui e de fora, que se opõem à democracia e defendem medidas de exceção, são as mesmas que se uniram e venceram em 1964, e nos afundaram na longa noite do arbítrio.
Para quem não quer ver esse filme de novo, só tem um jeito, além de rezar bastante: em primeiro lugar, vencer o medo e, aos poucos, ir criando novas formas de organização no mundo digital dos algoritmos, para podermos lutar com as mesmas armas que decidiram as eleições de outubro.
A dificuldade é maior para dinossauros analógicos como eu, mas, enquanto puder continuar escrevendo aqui, vou cumprindo meu papel de denunciar o que está acontecendo e alertar para o que ainda pode vir pela frente.
Faltam apenas quatro semanas para o dia 1º de janeiro de 2019.
Vida que segue.

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