Desde 2018, o Intercept Brasil tem uma editoria chamada Vozes, e eu sou a responsável por ela. Vozes é a seção que utilizamos para publicar histórias relevantes e que têm pouco espaço em veículos tradicionais. São relatos em primeira pessoa que revelam experiências, modos de vida e situações que se tornam importantes porque contribuem para a compreensão da sociedade, suas desigualdades e desafios.
O Vozes não é feito por reportagens de fôlego – aquelas que você está acostumado a encontrar no TIB. Mas a editoria segue os mesmos princípios de tudo que fazemos. Buscamos relatos de impacto, que levem os leitores a conhecer novas realidades e encarar problemas que se erguem sutilmente na sociedade. Por isso, o universo temático dos textos é muito amplo. Em uma semana, você pode ler sobre a instigante história do rapaz que teve os estudos custeados pelo pai traficante e, na outra, descobrir como é a dura vida dos garotos que, pelo sonho de jogar futebol, precisam suportar as categorias de base de grandes clubes.
O que fazemos no Vozes reafirma ainda algo que o Intercept persegue de maneira incansável. O jornalismo também é feito com histórias do cotidiano. É possível olhar para as microrrelações e encontrar nelas fundamentos que nos inspiram. É por isso que nos orgulhamos de contar ensaios com perspectivas únicas que você certamente não leria por aí, como a experiência da Stéfani, aluna de um colégio militar em Passo Fundo, Rio Grande do Sul. O relato dela sobre os abusos que os estudante sofrem na escola é chocante. Este foi um texto que causou enorme revolta entre os leitores, e a mobilização pode dar origem a um núcleo de apoio para os alunos de colégios militares com a intenção de colher relatos e apoiá-los diante da violência que sofrem.
A mobilização por conta do texto da Stéfani não é um caso isolado. Como eu disse, o que nós queremos é impacto! É por isso que você estão conosco nessa, não é mesmo?
Outra boa história que contamos é a do Houssan Nour, refugiado que trabalhava por mais de 14 horas como motorista de aplicativo com o objetivo de juntar dinheiro e trazer sua família da Síria para o Brasil. Depois da publicação, leitores criaram uma vaquinha para Houssan que arrecadou R$ 4 mil com o objetivo de ajudar nos trâmites da viagem.
Mas talvez o caso mais emblemático tenha sido o do professor Pedro Mara. Ele estava na lista das pessoas pesquisadas por Ronnie Lessa, o PM acusado de matar a vereadora Marielle Franco e seu motorista, Anderson Gomes.
Pedro tem uma história de luta na educação do Rio de Janeiro e diante das ameaças buscou apoio na Comissão de Direitos Humanos da Alerj, na OAB e no Sepe-RJ. Apesar do apoio desses órgãos, o professor passou a enfrentar um processo de exoneração por ter faltado duas semanas de aula na qual cumpria um protocolo de segurança. Correndo sério risco de vida, Pedro ficou afastado da escola e sem salário.
Nós o convidamos para compartilhar sua história, que foi inclusive contada em vídeo. A repercussão foi bastante positiva e contribuiu para a luta que Pedro já enfrentava. Semanas depois ele foi reintegrado aos quadros da secretaria estadual de educação, e o processo, extinto.
É gratificante fazer parte do Intercept Brasil por essas e muitas outras histórias. O Brasil tem muito para nos contar e queremos ser o megafone. Quem sabe ainda contamos a sua história?
Em tempos tão difíceis como estes que estamos vivendo, o que me motiva é fazer um jornalismo que preza pelos ideais democráticos, de justiça social e igualdade. Porque não há jornalismo sem democracia – e vice-versa. Não é à toa que a imprensa é a primeira a ser atingida quando regimes autoritários assumem o poder.
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