terça-feira, 19 de abril de 2022

Agência Pública: Seria este homem o Queiroz de Arthur Lira?

 

Seria este homem o Queiroz de Arthur Lira? 
por Alice Maciel

Em novembro do ano passado, recebi uma denúncia de que acontecia a prática da rachadinha no gabinete do deputado federal Arthur Lira (PP-AL) em Maceió. Ou seja, suspeitava-se que alguns dos funcionários do presidente da Câmara dos Deputados tinham que devolver parte de seus salários. “Não tem esse negócio de rachadinha que falam do Bolsonaro? No escritório do Arthur Lira é a mesma coisa. Já tem uma lista das pessoas que, no dia seguinte que recebem o salário, entregam uma parte para o Djair”, ouvi de uma fonte. 

Djair Marcelino da Silva é o chefe de gabinete do escritório de Arthur Lira em Maceió desde maio de 2020, e também foi chefe de gabinete quando Lira era deputado estadual na Assembleia Legislativa de Alagoas de 2001 a 2010. Djair é amigo do deputado desde o final da década de 1980 e “seu braço direito”, conforme me contaram pessoas próximas a eles: “Ele é o homem de confiança do Arthur”; “Ele faz tudo para o Lira, até reunião de escola ele ia quando os filhos do deputado eram pequenos”; “Ele cuida das finanças no escritório do deputado”; “O Djair sabe da vida do Arthur Lira mais do que o próprio Arthur Lira”, foram algumas das frases que ouvi. 

Em 2018, Djair Silva foi apontado pelo Ministério Público Federal como operador de um esquema de rachadinha na Assembleia Legislativa de Alagoas, que teria sido liderado por Lira quando ele ainda era deputado estadual, segundo a denúncia dos procuradores. Os investigadores identificaram que parte dos recursos que teriam sido desviados de 2001 a 2007 saía do salário de funcionários fantasmas e que, supostamente, Djair seria o responsável por retirar o dinheiro na boca do caixa. Lira e Djair negam as acusações. 

A informação que chegou até mim em novembro passado foi a de que os dois estariam repetindo a prática na Câmara dos Deputados desde 2011 – quando o político assumiu seu primeiro mandato em Brasília – e que os servidores envolvidos estariam lotados no escritório do parlamentar na capital alagoana. 

De mochila nas costas, papel e caneta nas mãos, desembarquei em Maceió pela primeira vez em dezembro. Procurei algumas pessoas que trabalham e trabalharam para Arthur Lira, mas ninguém confirmou a prática da rachadinha, alguns se negaram a falar, e outros se recusaram a me atender. Nessa viagem, no entanto, descobri que alguns parentes de Djair haviam passado pelo gabinete do deputado federal ao longo de seus três mandatos na Câmara.

Levantei a lista de todos os funcionários e ex-funcionários contratados por Arthur Lira na Câmara dos Deputados, e, a partir daí, descobri que o político empregou sete parentes do amigo Djair Silva entre 2011 e 2021: dois filhos, três sobrinhos, a ex-mulher e uma prima. Na hora, a descoberta me remeteu ao caso da família Bolsonaro. Por coincidência, o ex-assessor Fabrício Queiroz também emplacou sete parentes nos gabinetes de Carlos, Flávio e Jair Bolsonaro, conforme revelado pelo jornal O Globo

Investigando mais um pouco, descobrimos indícios de que um dos sobrinhos do Djair possivelmente é funcionário fantasma, assim como as denúncias envolvendo os familiares de Fabrício Queiroz. Luciano Lessa está lotado no gabinete de Arthur Lira em Maceió desde 2011, mas também é dono de uma gráfica na cidade desde 2010. Eu e a repórter Aliny Gama estivemos diversas vezes em sua loja, sempre aberta em horário comercial.
 
Aliny conversou com Luciano em fevereiro e ele disse que “cuida da comunicação visual” do gabinete de Lira, que seu negócio é ficar “correndo atrás de gráfica” e “fazer a ponte entre o que a agência de publicidade manda de layout e as gráficas”. Acontece que, nos últimos quatro anos, não há nenhum gasto com material impresso ou gráficas na prestação de contas do gabinete do presidente da Câmara. 

Em nota, o deputado ainda contradisse o que seu funcionário falou para a Pública. Segundo Lira, Luciano “exerce o trabalho de base junto à comunidade, com acompanhamento e monitoramento da mídia local” – nada disso foi mencionado pelo servidor na entrevista que fizemos com ele. Em relação aos outros parentes de Djair, Arthur Lira afirmou que “alguns foram servidores, em cargo de confiança, em épocas distintas e já totalmente desligados” e que Djair “trabalha no gabinete local do deputado em Maceió prestando funções relacionadas ao cargo que ocupa”. 

Afinal, “todo político tem que ter as pessoas que ele possa confiar”, me disse o próprio Djair numa manhã de sexta-feira, 25 de março, no escritório de Arthur Lira localizado na orla da capital alagoana. 

O líder do Centrão atualmente é apontado por muitos analistas políticos como o homem mais poderoso da República. Além de ocupar a presidência da Câmara dos Deputados, estão em suas mãos bilhões do Orçamento da União e o destino de Jair Bolsonaro – foi Lira quem segurou ao longo dos últimos anos os 143 pedidos de impeachment contra o presidente. Em ano eleitoral, mais do que nunca é preciso estar de olho nos passos de Arthur Lira. Já revelamos os seus “fantasmas” e que verbas do orçamento secreto do MEC vão parar na empresa do pai de um vereador de Maceió que é amigo e aliado do parlamentar. Fiquem ligados que em breve traremos mais informações.

 
Alice Maciel é repórter da Agência Pública em Brasília

Rolou na Pública
 

Em família. A empresa do pai do vereador de Maceió João Catunda (PP/AL) — aliado político e amigo de Arthur Lira (PP/AL) — recebeu verba do orçamento secreto do MEC, como revelamos nesta investigação exclusiva. A reportagem foi republicada no UOL e no Brasil de Fato, e repercutida na Folha de S. Paulo. A história foi capa da Folha de Alagoas

De olho no ATL. Indígenas de todo o Brasil ocupam Brasília em defesa de seus direitos e territórios no 18º Acampamento Terra Livre (ATL). A repórter Laura Scofield conversou com lideranças e relatou como tem sido a mobilização desde o primeiro dia, com registros da fotojornalista Andressa Anholete. O ensaio fotográfico foi republicado na Revista Galileu, no Cimi, no Brasil de Fato e em Amazônia.org

iFood investigado. A investigação sobre a máquina oculta de propaganda do iFood, publicada na semana passada, teve grande repercussão. O deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP) acionou a Procuradoria-Geral da República (PGR) e o Ministério Público do Trabalho (MPT) contra o iFood e agências de publicidade contratadas pela empresa. A vereadora Luana Alves (PSOL), da Câmara Municipal de São Paulo, pediu convocação das agências de publicidade na CPI dos Aplicativos. Ontem, a CPI fez diligência na sede do iFood para acompanhar o caso. O Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) comunicou que abriu processo investigatório para apurar se o iFood infringiu o código brasileiro de publicidade. Nesta semana, a reportagem foi repercutida na Folha de S. Paulo, no O Globo, no Extra e no Valor Econômico.

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