domingo, 2 de outubro de 2022

Brasil perde 800 bibliotecas públicas entre 2015 e 2020

 

Brasil perde 800 bibliotecas públicas entre 2015 e 2020

Número pode ser ainda maior, segundo especialistas; descontrole do Estado e extinção do MinC impedem prognósticos mais precisos

Foto: Alfons Morales on Unsplash

Brasil perde 800 bibliotecas em cinco anos de desmonte da cultura e da educação

Da Rede Brasil Atual

O Brasil perdeu quase 800 bibliotecas públicas entre 2015 e 2020, segundo o Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas (SNBP). Mas de acordo com especialistas do setor o número pode ser ainda maior. A falta de informação está relacionada com a extinção do Ministério da Cultura (MinC), pelo presidente Jair Bolsonaro, e o descontrole do Estado.

A professora Cibele Araújo, do curso de Biblioteconomia da Escola de Comunicação e Artes (ECA) da USP, afirma que os dados reforçam as denúncias de descaso dos últimos governos com a cultura e a educação. “As bibliotecas públicas em muitos municípios são um elo fundamental da cultura, para a formação do indivíduo, para o desenvolvimento da sua cidadania”, afirma.

As bibliotecas promovem, frequentemente, atividades como saraus literários, recitais, musicais e peças de teatro. “Esses espaços promovem a divulgação segura de informações, a cultura, a formação educacional das pessoas e a preservação da memória histórica. Cada tipo de biblioteca – pública, escolar ou circulante –, atende a necessidades informacionais e culturais específicas da sociedade”, aponta a jornalista Ana Paula Medeiros, que entrevistou Cibele Araújo para o Jornal da USP.

Mais afetados

O comprometimento do setor atinge, em especial, a população mais vulnerável. Isso porque os equipamentos públicos garantem fácil acesso a livros, muitas vezes restritos a esse público por seu preço. Cibele ressalta que “as bibliotecas públicas também são importantes para a memória brasileira por guardarem literatura, informação e história locais a partir dos livros físicos e de projetos internos para contar e recitar histórias”.

“A gente tem que ter uma pauta de defesa perante os prefeitos, governadores, vereadores e deputados. Investimento na cultura não é custo, é benefício puro para ter uma sociedade mais desenvolvida (…) Um trabalho quase de formiguinha, de fazer a defesa dessas instituições, olhando a biblioteca com uma importante instituição de informação e cultura”, completa a professora.

Em 2010, durante o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), foi aprovada a Lei 12.244, que prevê a que escolas públicas devem ser equipadas com bibliotecas. Especialmente após o golpe que retirou a presidenta Dilma Rousseff (PT), em 2016, o caminho para atingir o objetivo ficou mais longo. “Em 2010, a gente tem que propor uma lei para exigir a existência de bibliotecas nas escolas. Isso já é uma coisa alarmante”, afirma a também professora da ECA Ivete Pietruccini. Doze anos depois, além de inconcluso o objetivo, o fechamento dos equipamentos públicos evidenciam o descaso com o tema.

Formação cidadã

O professor Valdir Heitor Barzotto, vice-diretor da Faculdade de Educação da USP, reafirma a importância das bibliotecas públicas para a formação cidadã. “Quanto menos acesso a essa memória que está no conhecimento acumulado pela humanidade, quanto menos acesso às bibliotecas a juventude tem, mais ela se torna desconectada do mundo que ela vive”, afirma.

“Não há outro espaço mais livre do que a biblioteca. A biblioteca garante que esse conhecimento seja de acesso ao público e que não vire mercadoria (…) “Cada vez mais tem esse investimento do mercado em transformar um conhecimento em mercadoria e é importante fechar a biblioteca. Essa ‘mercadorização’ do conhecimento, a transformação do conhecimento em objeto de consumo mediante pagamento, faz com que o leitor, agora transformado em consumidor, não se sinta mais desafiado a entender a dimensão de uma unidade que está nele, de se comprometer em deixar um conhecimento mais avançado para as gerações que virão, a produção de novos conhecimentos ou de uma transformação da sua própria prática”, conclui.

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