06/03/2016 - Copyleft
Flavio Aguiar, da Cidade do México
O roteiro da 'Operação Congonhas' contra Lula
Uma das hipóteses é que isto tenha sido um balão de ensaio para observar as reações, como a primeira tentativa de golpe no Chile, em 1973.
Interrompo momentaneamente minhas
séries de outros comentários, diante da estripulia que foi a operação
de 4 de março contra o ex-presidente Lula, seus familiares e auxiliares.
Dá para perceber um roteiro na ação projetada e em sua falha.
O
roteiro começa, a longo prazo, com aquilo que Eric Nepomuceno definiu
muito bem: já temos o criminoso, agora precisamos encontrar o crime,
coisa que cabe muito bem nas tradições inquisitórias, nazistas,
estalinistas, mccarthistas, pinochetistas, etc.
Mas teve condimentos adicionados recentemente.
Primeiro,
a ameaça representada pelo pedido de Lula para que o STF se pronuncie
sobre o primado de jurisprudência nas acusações que lhe são feitas. O
juiz Moro e a corte de procuradores e policiais federais que o
acompanham sentiram o acender da luz amarela: tudo pode escapar de
nossas mãos… É preciso agora rápido para garantir as manchetes e o
noticiário, de que fomos nós que “prendemos” Lula.
Segundo,
a mudança no Ministério da Justiça. Isto poderia significar o fim da
impunidade garantida pela inação (para mim inexplicável) do ministro
Cardoso, talvez a substituição do comando da PF… sabe-se lá. O mandato
de segurança impetrado pelo DEM contra a nomeação do novo ministro
enquadra-se nesta alínea da conspirata.
A
partir daí, os acontecimentos, ou melhor, seus agentes, se
precipitaram. A volúpia de ter o comando da ação que, a serviço dos
interesses que exigem a neutralização de Lula não só em 2018, mas para
sempre, e sobretudo do seu passado de melhor presidente do Brasil, tomou
conta de seus protagonistas.
O
juiz Moro autorizou uma ação da PF. Os agentes da PF optaram pela
“condução coercitiva” ou seja lá que nome se dê. No bom tempo era “voz
de prisão”. Montaram o espetáculo megalomaníaco: 200 agentes, detenções
(este é o nome) simultâneas, invasões de domicílio (ilegais, porque não
autorizadas pelo juiz, ou, quem sabe, ele recuou depois), espetáculo
faraônico, e conduziram o ex-presidente para Congonhas.
Estranho,
não? Congonhas? A PF tem sede em S. Paulo. Que eu saiba, não fica em
Congonhas. Houve aí um duplo objetivo: primeiro, como Congonhas é um
ambiente dominado por “coxinhas” e “coches”, é um ambiente propício a
cenas constrangedoras contra o ex-presidente, como aconteceram. Segundo,
se tudo corresse como previsto, o ex-presidente tomaria o avião, preso,
para a República de Curitiba, sob aplauso da caterva, ou melhor, da
manada do coxinhas lá presentes. Um sucesso midiático!
Fora
das quatro linhas, na arquibancada, o senador Aécio Neves - um Eduardo
Gomes dos anos 50, mas desfibrado - e Eliane Catanhêde - uma candidata a
Lacerda, mas descorada - comemoravam o fim de Lula e do PT.
Mas…
Faltou
combinar com o resto do país. O PT e adjacências anda meio adormecido,
mas o povo pró-Lula acordou. Acorreu ao aeroporto de Congonhas. UM amigo
meu me escreveu, lembrando o brado coxinha de antanho: “Ficou parecendo
uma rodoviária”… Reações na mídia se multiplicaram, inclusive de
tucanos sérios e respeitáveis, como José Gregori, denunciando a
arbitrariedade da situação. O ministro Marco Aurélio Mello, do
Supremo, condenou a ação de Moro. Governadores se pronunciaram.
Manifestações se programaram. Haveria confrontos…
Enfim, o esquema recuou. Não deu certo, pelo menos desta vez.
Lula
saiu reforçado do evento, inclusive por seu magistral depoimento
transmitido ao vivo. A Globo, Moro, estes membros da PF foram
derrotados. Desta ve. Não vão desistir.
Uma
das hipóteses é que isto tenha sido um balão de ensaio. Como a primeira
tentativa de golpe no Chile, em 1973. Para observar a reação das forças
legalistas. Pode ser.
Mas há duas coisas certas: eles vão tentar de novo; e não contavam com a pronta reação que houve.
Que fazer?
Manter
a calma. Não desembarcar da luta. Não cair em provocações. Manter uma
enorme quantidade de informação circulando, fora das linhas da velha
mídia que está inteiramente comprometida com o golpe. Deixar de lado
quezílias e manter firme da defesa das liberdades democráticas e da
legitimidade constitucional.
Créditos da foto: Fernanda Cruz / Agência Brasil
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