A degradante atuação do Congresso brasileiro ao aplicar um golpe em
nome da República dos Corruptos, liderada por Eduardo Cunha, teve grande
repercussão internacional.
Segundo The Intercept, o site mantido pelo jornalista GlenGreenwald a
partir do Rio de Janeiro, a oposição despachou para os Estados Unidos o senador
Aloysio Nunes, que se encontrará com integrantes do poderoso Comitê das
Relações Exteriores do Senado, com o subsecretário de Estado Thomas Shannon e
com um grupo de lobistas ligados à ex-secretária de Estado Madeleine Albright,
diplomata influente desde o governo Reagan e que representa dinheiro grosso nos
Estados Unidos.
Greenwald não lembra o fato de que a ex-embaixadora dos Estados Unidos
no Paraguai, que assistiu ao golpe suave contra Fernando Lugo lá, foi
transferida em seguida para o Brasil.
Trata-se de uma viagem, a de Aloysio Nunes, no mínimo curiosa, já que
Dilma Rousseff continua no poder no Planalto e o Brasil mantém relações
diplomáticas normalizadas com os Estados Unidos, enquanto o senador tucano está
prestes a se engajar na batalha do impeachment no Senado, em um papel central.
Texto
do Intercept:
Muitos na esquerda brasileira acreditam que os EUA estão planejando
ativamente a instabilidade atual no país com o propósito de se livrar de um
partido de esquerda que se apoiou fortemente no comércio com a China, e colocar
no lugar dele um governo mais favorável aos EUA que nunca poderia ganhar uma
eleição por conta própria.
Embora não tenha surgido nenhuma evidência que comprove essa teoria,
uma viagem aos EUA, pouco divulgada, de um dos principais líderes da oposição
brasileira deve provavelmente alimentar essas preocupações. Hoje — o dia
seguinte à votação do impeachment — o Senador Aloysio Nunes do PSDB estará em
Washington para participar de três dias de reuniões com várias autoridades
norte-americanas, além de lobistas e pessoas influentes próximas a Clinton e
outras lideranças políticas.
O Senador Aloysio Nunes vai se reunir com o presidente e um membro do
Comitê de Relações Internacionais do Senado, Bob Corker (republicano, do estado
do Tennessee) e Ben Cardin (democrata, do estado de Maryland), e com o
Subsecretário de Estado e ex-Embaixador no Brasil, Thomas Shannon, além de
comparecer a um almoço promovido pela empresa lobista de Washington, Albright
StonebridgeGroup, comandada pela ex-Secretária de Estado de Clinton, Madeleine
Albright e pelo ex-Secretário de Comércio de Bush e ex-diretor-executivo da
empresa Kellogg, Carlos Gutierrez.
A Embaixada Brasileira em Washington e o gabinete do Senador Aloysio
Nunes disseram ao The Intercept que não tinham maiores informações a respeito do
almoço de terça-feira. Por email, o Albright StonebridgeGroup afirmou que o evento
não tem importância midiática, que é voltado “à comunidade política e de
negócios de Washington”, e que não revelariam uma lista de presentes ou
assuntos discutidos.
Aloysio Nunes é uma figura da oposição extremamente importante — e
reveladora — para viajar aos EUA para esses encontros de alto escalão. Ele
concorreu à vice-presidência em 2014 na chapa do PSDB que perdeu para Dilma e
agora passa a ser, claramente, uma das figuras-chave de oposição que lideram a
luta do impeachment contra Dilma no Senado.
Como presidente da Comissão de Relações e Defesa Nacional do Senado,
Aloysio Nunes defendeu repetidas vezes que o Brasil se aproxime de uma aliança
com os EUA e o Reino Unido.
Aloysio Nunes foi fortemente apontado em denúncias de corrupção; em
setembro. Um juiz ordenou uma investigação criminal após um informante, um
executivo de uma empresa de construção, declarar a investigadores ter oferecido
R$ 500.000 para financiar sua campanha — R$ 300.000 enviados legalmente e mais
R$ 200.000 em propinas ilícitas de caixa dois — para ganhar contratos com a
Petrobras. E essa não é a primeira acusação do tipo contra ele.
A viagem de Aloysio Nunes a Washington foi divulgada como ordem do
próprio Michel Temer, que está agindo como se já governasse o Brasil. Temer
está furioso com o que ele considera uma mudança radical e altamente
desfavorável na narrativa internacional, que tem retratado o impeachment como
uma tentativa ilegal e antidemocrática da oposição, liderada por ele, para
ganhar o poder de forma ilegítima.
O pretenso presidente enviou Aloysio Nunes a Washington, segundo a
Folha, para lançar uma “contraofensiva de relações públicas” e combater o
aumento do sentimento anti-impeachment ao redor do mundo, o qual Temer afirma
estar “desmoralizando as instituições brasileiras”. Demonstrando preocupação
sobre a crescente percepção da tentativa da oposição brasileira de destituir
Dilma Rousseff, Aloysio Nunes disse, em Washington, “vamos explicar que o Brasil
não é uma república de bananas”. Um representante de Temer afirmou que essa
percepção “contamina a imagem do Brasil no exterior”.
“É uma viagem de relações públicas”, afirma Maurício Santoro, professor
de ciências políticas da UFRJ, em entrevista ao The Intercept. “O desafio
mais importante que Aloysio Nunes enfrenta não é o governo americano, mas a
opinião pública dos EUA. É aí que a oposição está perdendo a batalha”.
Não há dúvida de que a opinião internacional se voltou contra o
movimento dos partidos de oposição favoráveis ao impeachment no Brasil. Onde,
apenas um mês atrás, os veículos de comunicação da mídia internacional
descreviam os protestos contra o governo nas ruas de forma gloriosa, os mesmos
veículos agora destacam diariamente o fato de que os motivos legais para o
impeachment são, no melhor dos casos, duvidosos, e que os líderes do
impeachment estão bem mais envolvidos com a corrupção do que Dilma.
Michel Temer, em particular, estava abertamente preocupado e furioso
com a denúncia do impeachment pela Organização de Estados Americanos, apoiada
pelos Estados Unidos, cujo secretário-geral, Luis Almagro, disse que estava
“preocupado com a credibilidade de alguns daqueles que julgarão e decidirão o
processo” contra Dilma. “Não há nenhum fundamento para avançar em um processo
de impeachment contra Dilma, definitivamente não”.
O chefe da União das Nações Sul-Americanas, Ernesto Samper, da mesma
forma, disse que o impeachment é “um motivo de séria preocupação para a
segurança jurídica do Brasil e da região”.
A viagem para Washington dessa figura principal da oposição, envolvida
em corrupção, um dia após a Câmara ter votado pelo impeachment de Dilma,
levantará, no mínimo, dúvidas sobre a postura dos Estados Unidos em relação à
remoção da presidente. Certamente, irá alimentar preocupações na esquerda
brasileira sobre o papel dos Estados Unidos na instabilidade em seu país. E
isso revela muito sobre as dinâmicas não debatidas que comandam o impeachment,
incluindo o desejo de aproximar o Brasil dos EUA e torná-lo mais flexível
diante dos interesses das empresas internacionais e de medidas de austeridade,
em detrimento da agenda política que eleitores brasileiros abraçaram durante
quatro eleições seguidas.
ATUALIZAÇÃO: Antes desta publicação, o gabinete do Sen. Nunes informou
ao The
Intercept que não tinha mais informações sobre a viagem dele a
Washington, além do que estava escrito no comunicado de imprensa, que data de
15 de abril. Subsequente à publicação, o gabinete do Senador nos indicou
informação publicada no Painel do Leitor (Folha de S. Paulo, 17.04.2016) onde
Nunes afirma - ao contrário da reportagem do jornal - que a ligação do
vice-presidente Temer não foi o motivo para sua viagem a Washington.
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