segunda-feira, 11 de julho de 2016

A geopolítica do golpe: as multinacionais contra Dilma


A geopolítica do golpe: as multinacionais contra Dilma

O governo Temer tenta impôr à nação os interesses das empresas que há anos pretendem colocar as mãos nas reservas da área do Pré-Sal.


Darío Pignotti - Direto de Brasília para o Página/12
Roberto Stuckert Filho/ PR
Nacionalista, amigo de Chávez e Dilma, o senador Roberto Requião analisa o golpe institucional através da perspectiva das relações de poder internacionais nas que Brasil é um ator relevante, especialmente por sua importância no cenário latino-americano e sua parceria com o grupo de potências emergentes reunidas nos BRICS – sem contar suas reservas petroleiras.
 
“Com a chegada de Michel Temer ao governo, se iniciou uma tentativa de impor um projeto orquestrado pelos grandes meios de comunicação, com fundamental apoio estrangeiro, que protege os interesses das empresas que há anos pretendem colocar as mãos nas reservas da área do Pré-Sal. Claro que o projeto vai mais além e abre caminho também para uma possível futura entrega das riquezas da Amazônia. Os fatores geopolíticos atuam como um Deus ex-machina, influenciando, conspirando, entregando informações. Eles tem um aliado poderoso, o chanceler José Serra, um entreguista que se opõe aos BRICS”.
 
Segundo Requião, “o capital financeiro também participa, e hoje tem o Brasil de joelhos ante si. Nosso país se transformou numa festa para os rentistas, com um Banco Central que fixa taxas de juros de 14,25%. E quem é o novo responsável pelo Banco Central? Ilan Goldfjan, economista-chefe do Banco Itaú”.
 
Requião manteve uma relação cordial com Hugo Chávez durante ano, e recebeu o Página/12 em seu escritório no Congresso Nacional do Brasil, enquanto a Comissão Especial que investiga o caso do impeachment contra Rousseff apresentava as alegações da mandatária. Além de ser um grande amigo de Dilma, Requião é um antigo dirigente do PMDB, o mesmo do presidente interino Temer.





 
Ele acredita que a gênesis do processo que derrubou provisoriamente a presidenta está no escândalo pela espionagem na Agência Nacional de Segurança norte-americana (NSA), descoberto em 2013, que deteriorou as relações entre Brasília e Washington. Mais que isso: Requião suspeita que parte dos arquivos roubados pela NSA da Petrobras e dos acervos de dezenas de políticos foram cedidos ao juiz Sérgio Moro, o responsável pela causa do chamado “Petrolão”.
 
“É sensato pensar que a NSA entregou informações a Moro, para que avançassem as investigações. Mas cuidado, isso não quer dizer que Moro e os promotores sejam agentes da CIA e da NSA. Eu creio que eles são justiceiros, moralistas, que foram utilizados por aqueles que lhes entregam as informações. Moro não sabe muito bem por quem está sendo manipulado. E tenho a convicção de que a causa judicial pelo escândalo na Petrobras é muito importante, porque foi muito importante prender vários grandes empresários da construção, que são gente da direita”, ponderou.
 
O senador Requião se reuniu recentemente com Dilma para falar sobre a correlação de forças na câmara alta, composta por 81 membros, os quais votarão, no final de agosto, para decidir o veredito definitivo do impeachment. A mandatária eleita permanecerá no cargo se conquistar o apoio de um terço da casa, ou seja, 27 votos.
 
Requião foi o anfitrião de um encontro entre cerca de 30 senadores “éticos”, entre os quais há um grupo que anunciou seu respaldo a Dilma Rousseff, e outro grupo que permanece indeciso, que após aderir ao impeachment em maio, agora poderiam revisar sua posição, devido às evidências de que Temer é sustentado por uma coalizão de corruptos, na qual figuram políticos tão poderosos quanto inescrupulosos, como Eduardo Cunha. “Vou fazer o possível para que Dilma volte, mas isso não significa trabalhar para ela, e sim para que o país não derrape na recessão e no entreguismo, estou trabalhando para um projeto”, afirmou o político paranaense.
 
O senador afirmou também que “a verdade é que Dilma não ajuda muito os que a querem ajudar, porque está perdendo tempo, quando deveria tomar decisões importantes. Eu reconheço que ela tem coragem, mas agora precisa traduzir isso em ações políticas. Enquanto ela vacila, o Temer busca garantir os 54 votos, o dois terços do Senado para aprovar o impeachment, oferecendo cargos e ventagens sem pudor, com uma ânsia pelo poder sem nenhuma posição ideológica ou programática”.
 
– Dilma pode retornar?
 
– Eu sou gramsciano, sou pessimista na análise e otimista na ação. Existem possibilidades para que ela retorne, e é preciso trabalhar ao máximo por elas. Necessitamos de apenas um terço dos votos do Senado, mas não posso me enganar dizendo que isso é fácil de concretizar, Há contradições entre Dilma e o PT, creio que há gente do PT que espera que tudo isso termine logo, gente que pensa que o melhor é voltar a ser oposição, pensando nas eleições de 2018.
 
– Você elogiou a causa judicial do chamado “Petrolão”, mas independente dos argumentos jurídicos, não acha que há motivação política?
 
– Evidente que sim! O fato de eu reconhecer a importância de se investigar a corrupção na Petrobras não significa que eu desconheça suas consequências e os seus antecedentes históricos. O juiz (Sérgio) Moro se inspira na Operação Mãos Limpas, na Itália dos Anos 90, ele mesmo escreveu tese sobre o tema. Se vemos o que ocorreu na Itália depois da operação, descobrimos que ela foi enterrando a todo o sistema político, e daí surgiu Silvio Berlusconi como o salvador da pátria.
 
– O Brasil pode estar vendo nascer o seu próprio salvador da pátria?
 
– É perfeitamente possível que um fenômeno igual aconteça, porque esse tipo de crise favorece o surgimento desses salvadores da pátria. Não sei quem encarnaria esse rol hoje, não creio que seja o juiz Moro, apesar de os meios de comunicação quererem projetá-lo. Ele não tem nenhuma experiência na administração pública. Vivemos numa sociedade do espetáculo, que nos estimula a buscar salvadores e aplaudir os abusos de poder, como os que temos visto ultimamente.
 
– Como quais?
 
– A ação policial no diretório nacional do PT, em São Paulo, que foi rodeado por efetivos com armamento pesado e vestidos como comandos de guerra na selva, como se o PT estivesse escondendo o Chapo Guzmán ou uma célula do Estado Islâmico, a detenção do ex-ministro Paulo Bernardo, esposo da senadora Gleisi Hoffmann, também do PT, invadindo o domicílio de uma parlamentar com foro qualificado, utilizando helicópteros. Foi um abuso total, para intimidar os legisladores que, como Hoffmann, se opõem ao impeachment. Estão criando um clima para manipular o povo, para que as pessoas se enfureçam e tomem o Congresso se não se vota a favor do impeachment. O que se vê é uma espécie de britzkrieg, como os que fazia Hitler, buscando semear o terror. E esse quadro que existe hoje no Brasil começa a ser percebido também em outros países da região, lamentavelmente.
 
Chávez
 
– O Mercosul acabou?
 
– Se depender do chanceler Serra sim, mas eu não seria tão lapidário, creio que esses governos conservadores terão problemas para se manter no poder por muito tempo. A recessão e o desemprego vão causar explosões sociais, saques de supermercados, revoltas. Não tenho a bola de cristal para saber o que acontecerá exatamente, mas não vejo como esses experimentos conservadores poderiam se consolidar.
 
– Você foi amigo de Chávez. Onde o viu pela última vez?
 
– Eu fui amigo dele. A última vez que ele me visitou aqui, neste escritório, ele já estava bastante doente, sabia que não sobreviveria, e estava decepcionado porque Dilma não dava importância ao Mercosul, porque Brasil não apresentava propostas concretas para avançar. Era o tempo em que Dilma estava deslumbrada com o aumento dos preços das matérias-primas, e isso a levou a se desinteressar pela integração regional. Um erro grave.
 
Tradução: Victor Farinelli


Créditos da foto: Roberto Stuckert Filho/ PR




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