Dilma Rousseff enfrenta golpistas de colarinho branco
Até aqui, nenhuma prova comprometendo chefe de Estado foi apresentada, mas ideia ganhou terreno graças as campanhas dos grandes monopólios midiáticos
Na quinta-feira (25/08) abriu-se em Brasília, no seio do Senado, o processo para a destituição da presidente de esquerda, que dá espaço à sua defesa na segunda-feira (29/08). Para as forças democráticas, a vacuidade das acusações na origem de sua evicção temporária é a prova de um golpe de Estado institucional. O veredito virá em 31 agosto.
Dilma Rousseff não teme o confronto. "Eu jamais tive medo de tudo isso. Eu já aguentei tensões bem piores em minha vida. Isso é um exercício da democracia." Faz meio século, a antiga guerrilheira, encarcerada e torturada durante a ditadura (1964-1985), confrontara seus carrascos sem vacilar. Hoje, o contexto é totalmente outro, mas a adversidade não é menos terrível. É hoje que se abre em Brasília, no seio do Senado, o processo bastante político para a destituição da chefe do Estado, após meses de crise institucional que por vezes transmutaram-se em grotesca ópera bufa. A presidenta irá defender-se perante uma Câmara Alta que, em 12 de maio, já a havia afastado de maneira temporária do palácio do Planalto. Mas qual é a credibilidade desses parlamentares cuja maior parte está em dificuldades com a justiça por casos de corrupção? A oposição de direita busca desbancar a esquerda utilizando-se de todos os pretextos, depois de ter fracassado nas urnas no curso dos últimos quatorze anos.
Pedro França/ Agência Senado
Senadores participam de sessão de julgamento do processo de impeachment de DIlma Rousseff
Senadores participam de sessão de julgamento do processo de impeachment de DIlma Rousseff
Conhecerá Dilma Rousseff a mesma sorte dos presidentes hondurenho Manuel Zelaya e paraguaio Fernando Lugo, vítimas de golpes de Estado parlamentares em 2009 e 2012? Um após o outro, detratores e partidários da dirigente do Partido dos Trabalhadores (PT - esquerda) se sucederão a partir de hoje na tribuna do Senado, transformada nesta ocasião em um tribunal presidido pela Suprema Corte. A chefe de Estado indicou que ela própria apresentará, segunda-feira, a sua defesa ao seu processo de destituição, cujo veredito é esperado para 31 de agosto. Um processo muito político, inédito na história desse país continental. "Resistamos todos juntos," exortou na terça-feira (23/08) a presidente diante dos militantes reunidos em São Paulo. "Eu lutei toda a minha vida: contra a tortura, contra um câncer... E eu vou bater-me agora contra toda injustiça," assegurou ela.
Algumas horas mais tarde, a Suprema Corte opunha-se a receber um recurso apresentado por seus advogados, visando anular o voto dos senadores em 10 de agosto, que abriu a via ao seu julgamento, após havê-la suspendido de suas funções dois meses antes. "O que nós aprendemos com tudo isso, é que a democracia não está garantida, como pensávamos, nós devemos estar sempre alertas para não perdermos aquilo que havíamos ganhado," comentou ela, em alusão à fragilidade do regime, cujas instituições parlamentares estão minadas pela corrupção. Em diversas ocasiões, ela qualificou a sua evicção de Golpe de Estado institucional.
Nada foi poupado à ex-guerrilheira, eleita em 2010 ao comando da oitava potência econômica do planeta, e reeleita autoritativamente no outono de 2014. A oposição, que não cessou de contestar sua liderança sem ser bem sucedida em seus fins, lançou-se em uma campanha de descrédito. Em um primeiro momento, as forças da direita buscaram implicá-la no vasto escândalo de corrupção da gigante petroleira Petrobrás, que enlameia dirigentes políticos, confundindo todos os matizes.
Esta não é a primeira vez que as forças da reação se entregam a esse tipo de maquinação.
"A cada tentativa de redução das desigualdades sociais entre ricos e pobres, as classes dominantes têm reagido de forma violenta. Nos anos 50, acusações de corrupção levaram o presidente Getúlio Vargas ao suicídio (...) antes de serem desmentidas após sua morte. Fora as dezenas de leis que Vargas aprovou em favor dos trabalhadores, os capitalistas brasileiros não lhe perdoaram a criação da Petrobras e a instituição do monopólio estatal, lembra o pesquisador João Oliveira, especialista em assuntos brasileiros. Em 1964, em um contexto semelhante àquele que sacode o país atualmente, os militares conseguiram destituir o presidente João Goulart, acusado de corrupção. (...) Na realidade, os conservadores jamais apreciaram o aumento de 100% do salário mínimo proposto em 1954 por Goulart, quando era então ministro do Trabalho de Vargas."
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Até aqui, nenhuma prova comprometendo a chefe de Estado foi apresentada. Mas a ideia ganhou terreno graças às campanhas dos grandes monopólios midiáticos. A direita, mas sobretudo os antigos aliados governamentais do PT, como o PMDB de Michel Temer, que ocupa no momento a presidência interinamente, determinaram-se a liquidar Dilma Rousseff, acusando-a de "crime de responsabilidade." Eles censuram-lhe uma "pedalada fiscal," malabarismo orçamentário ao qual ela teria recorrido em 2014, ao transferir dinheiro de um ministério a outro a fim de que as despesas públicas parecessem equilibradas. Essa irregularidade nada tem a ver com crime de responsabilidade, segundo numerosos juristas. Um relatório redigido em junho por três especialistas do Senado por conta da Comissão especial encarregada do processo de destituição de Rousseff destaca aliás que a Presidenta não seria responsável, de maneira direta ou nem mesmo indireta, da "pedalada fiscal" de que a acusam. Seus antecessores que tiveram recurso a esse mecanismo contábil jamais foram inquietados pela justiça. Não mais que os onze governadores atualmente em exercício familiarizados com essa prática, como Antonio Anastasia, do Estado de Minas Gerais e relator da comissão senatorial à cargo do processo contra a dirigente de esquerda. Tudo isso cheira a uma cabala política contra Dilma Rousseff e, através dela, contra a esquerda. Quarenta e oito senadores já se declararam favoráveis à sua destituição. Dezenove outros defendem a sua manutenção no cargo. Para que ela seja definitivamente afastada do poder, 54 vozes serão necessárias no seio de uma Câmara Alta dominada pela oposição.
Roberto Stuckert Filho/PR
Presidente brasileira afastada, Dilma Rousseff
Presidente brasileira afastada, Dilma Rousseff
Desde o início da crise política, a presidenta brasileira recebeu o apoio da maioria de seus homólogos latino-americanos. Em Paris, por outro lado, até aqui nenhuma reação. Em 29 de julho último, parlamentares de esquerda dirigiam ao chefe da diplomacia, Jean-Marc Ayrault, uma carta pedindo para a França "sustentar as forças democráticas a fim de evitar que esse país não volte a mergulhar nos anos negros que tanto fizeram sofrer o povo brasileiro." O silêncio permanece ensurdecedor.
"A validade, ou não aliás, do processo de destituição voltado contra a presidente Dilma Rousseff está sendo escrutinizado sob a lupa da Organização dos Estados Americanos (OEA). Este organismo que não pode ser acusado de conivência com a esquerda deste continente exigiu garantias ao Congresso. Ele exigiu dos senadores na origem da eventual evicção da chefe de Estado, pelo arbítrio da Comissão interamericana dos direitos do homem (CIDH), de verificar se o mecanismo respeitou os textos constitucionais. O Congresso imediatamente replicou que a Constituição foi respeitada, mas sem outro detalhe."
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