Falácias
econômicas da turma da caixinha DE PANDORA
Entre 2012 e 2014, a economia brasileira
sentiu os efeitos da desaceleração do ciclo expansivo que a beneficiou desde
2004. Nesse período, o governo da presidenta Dilma Rousseff cuidou de conceder
isenções fiscais para a turma do Pato, retardou o programa de concessões e
segurou o realinhamento de preços administrados.
No crepúsculo de 2014, os formadores da
opinião midiático-financeira instilaram a pré-verdade econômica nos ares de
Pindorama. O consenso da “turma da caixinha” propalava o desastre: a economia
cresceu apenas 0,5% e apresentou um déficit primário de 0,6% do PIB em 2014.
A vitória de Dilma nas eleições aumentou
a gritaria: desastre!, desastre! Tanto clamaram pelo desastre que a política
econômica da turma da caixinha foi executada com esmero pelo ministro Joaquim Levy.
Dois anos depois, os incautos e crédulos
descobriram que a caixinha da turma era a de Pandora.
Aberta a caixinha, os monstros ficaram à
solta: o choque de tarifas voou lado a lado com o choque de taxa de juros, de
mãos dadas com a forte desvalorização cambial. Para não deixar barato, os
preços desaforados convidaram os cortes em investimentos públicos para mais um
baile da Ilha Fiscal.
A interação entre o choque de tarifas, a
subida da taxa de juros, a desvalorização do real e o corte dos investimentos
públicos determinaram a elevação da inflação em simultâneo à contração do nível
de atividade, e daí à restrição do crédito.
O encolhimento do circuito de formação
da renda levou, inexoravelmente, à derrocada da arrecadação pública.
As fábricas se encharcam de capacidade
ociosa. Endividadas em reais e em moeda estrangeira, as empresas são
constrangidas a ajustar seus balanços diante das perspectivas de queda da
demanda e do salto do serviço da dívida.
Para cada uma delas é racional dispensar
trabalhadores, funcionários, assim como, diante da sobra de capacidade,
procrastinar investimentos que geram demanda e empregos em outras empresas.
Para cada banco individualmente era
recomendável subir o custo do crédito e racionar a oferta de novos empréstimos.
Os consumidores, bem, os consumidores
reduzem os gastos. Uns estão desempregados e outros com medo do desemprego.
Assim, o comércio capota, não vende e reduz as encomendas aos fornecedores que
acumulam estoques e cortam ainda mais a produção.
As demissões disparam. A arrecadação
míngua, sugada pelo redemoinho da atividade econômica em declínio. Isso,
enquanto a dívida pública cresce sob o impacto dos juros reais e engorda ainda
mais os cabedais do rentismo caboclo.
O mergulho depressivo iniciado entre o
crepúsculo de 2014 e a aurora de 2015 pode ser apresentado como um exemplo do
fenômeno que as teorias da complexidade chamam de “realimentação positiva” ou,
no popular, “quanto mais cai, mais afunda”.
As decisões “racionais” do ponto de
vista microeconômico, prestam homenagem às falácias de composição que infestam
os modelos macroeconômicos: o que parece bom para o “agente individual” – seja
ele empresa, banco ou consumidor – é danoso para o conjunto da economia.
Confrontando o trimestre de agosto a
outubro de 2016 com igual trimestre de 2015, os dados do IBGE apontam uma
elevação de 3,0 milhões de pessoas desocupadas na força de trabalho, um
acréscimo de 32,7%. A massa de rendimento real habitualmente recebida pelas
pessoas ocupadas em todos os trabalhos mostrou redução de 3,2%.
De janeiro a setembro de 2016, a
quantidade de pedidos de recuperação judicial cresceu 62%, em comparação com o
mesmo período de 2015, fruto do longo castigo imposto aos fluxos de caixa das
empresas, pela queda na demanda e restrições ao crédito. Nos primeiros nove
meses do ano, foram feitos 1.405 pedidos de falência no País. O número
representa um aumento de 6% em relação ao mesmo período de 2015.
A retração de 0,8% do PIB no terceiro
trimestre de 2016 foi a sétima de uma sequência iniciada no primeiro trimestre
de 2015.
A mídia brasileira espargiu a convicção
da rápida recaptura dos monstros liberados pela turma da caixinha. Até agora,
nada. Um amigo empresário encalacrado em sucessivas negociações com os bancos
sugeriu, entre rilhar de dentes, que não devemos desperdiçar a mitologia grega
com episódios funestos. Disparou: essa turma é do Zé do Caixão.
*Luiz Gonzaga Belluzzo é economista e
professor
Fonte: Carta Capital
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