O desfecho do depoimento em Curitiba é Lula engolindo
o inquisidor
Mino Carta
A triste, dolorosa encenação a que o
golpe nos obriga a assistir de súbito torna-se pantomima e o herói de um dos
principais atos da peça, o endeusado inquisidor Sergio Moro, mostra-se incapaz
de acender a fogueira do auto de fé ardorosamente ensaiado.
O Narciso de camisa preta ficou escravo
do papel que se atribuiu sem condições de arcá-lo, para exibir redondamente
toda sua pretensão e mediocridade.
O embate de Curitiba previsto pela mídia
nativa, pronta a antecipar vencedor e vencido, assim como o inquisidor escolheu
o culpado antes de definir a culpa, soçobra no desfecho oposto.
De todo modo, refrega não houve, sobrou
apenas a evidência da impossibilidade de condenar sem provas, bem como outra, o
vilão engoliu o mocinho.
De um lado, a figura enfadonha de voz
melíflua a se enredar em sua própria obsessão e em um emaranhado de perguntas
repetidas incessantemente; do outro um cidadão de muitas sutilezas e senso de
humor na ponta da língua e no semblante, disposto de improviso a perguntar:
“Mas... cadê o Dallagnol?” De fato, o pregador da cruzada não estava presente e
nem por isso escapou à flechada irônica.
O tom e o resultado do espetáculo
curitibano são transparentes aos olhos dos espectadores, a não ser para aqueles
que não querem ver, e da mídia nativa, que continua no seu esforço maciço de
sustentar a perseguição a Lula.
A culpa do ex-presidente resume-se no
seu favoritismo nas próximas eleições.
Quem quiser saber dos fatos da quarta 10
de maio leia a imprensa estrangeira. A nossa, esteio do estado de exceção, como
de hábito constrói a sua versão, cada vez mais falaciosa até os limites do
ridículo.
No país da casa-grande, a caçada a Lula
é movida a ódio de classe e a pregação midiática estimula o confronto entre
ricos e pobres.
Os coronéis e seus jagunços são os
verdadeiros subversivos.
Não há carbonários a tramarem a revolta
popular, são os senhores que a insuflam, sem dar-se conta dos efeitos de seu
comportamento.
Há neste enredo um toque espantoso de
desvario, de criminosa insensatez.
Até quando teremos de ler e ouvir a
respeito do tríplex mirrado na praia dos farofeiros? Ainda haveremos de padecer
as histórias do sítio de Atibaia, com vista para a favela, da reforma da
cozinha, do barquinho de lata?
O Brasil sofre com a situação precipitada
pelo golpe de 2016, sofre muito e tudo indica que sofrerá ainda mais, mesmo
porque difícil é imaginar uma saída a curto ou médio prazo.
O governo ilegítimo promete uma
recuperação econômica graças às medidas contra o trabalho solicitadas pelo mercado.
Há quem acredite, gosta de enganar-se.
A solução pacífica e inteligente está na
convocação de eleições antecipadas.
Mas como premiar a sensatez em meio à
crise mental?
www.cartacapital.com.br Editorial 12/05/2017
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