Sobre
condenados e esquecidos
Celso Vicenzi*
Veja se você consegue lembrar: Quem condenou
Tiradentes à forca? Quem condenou Sócrates a beber a taça de cicuta? Quem
executou Che Guevara?
O juiz vaidoso que não
esconde suas frustrações pessoais nos mínimos gestos e comportamentos é mais um
condenado a desaparecer na história, enquanto a figura de Luís Inácio Lula da
Silva irá permanecer para sempre nos livros de história, de ciência política,
de sociologia, em biografias, em poesias, na literatura de cordel, em peças de
teatro e tantas outras formas de imortalidade.
Verdade ou mito, não importa,
Lula será símbolo. De um Brasil que ousou retirar milhões da miséria e sonhar
com mais igualdade, alçar voo entre os maiores do mundo, antes de ser abatido por
mais um golpe.
É assim com os grandes
personagens da história da humanidade. Já aos seus algozes, que cumpriram
papéis ordinários, coube o esquecimento. Ou, talvez, para que não esqueçamos
jamais, figurem como exemplos de injustiça e ignomínia.
Moro agiu em fina sintonia
com os mais potentes veículos de comunicação do país, sob o manto da
cumplicidade de seus superiores, para torturar um cidadão e sua família
diuturnamente com injúrias, calúnias e difamações.
À história caberá demonstrar,
com mais clareza, o que significou a Operação Lava-Jato para consumar o golpe
no Brasil. Da mesma forma que, passadas algumas décadas, hoje sabemos muito
sobre os bastidores do golpe de 64. Para quem gosta tanto de “indícios”, são
fartos aqueles que nos levam a suspeitar de um golpe
jurídico-midiático-parlamentar-policial-empresarial contra a presidenta Dilma.
Com know-how, tudo indica, de quem fala muito bem essa língua.
O golpe, que ainda prossegue,
destituiu uma presidenta sem crime para promover um assalto ao poder que
consuma o maior retrocesso aos direitos trabalhistas da história nacional e que
deve completar-se com outros ataques: aos direitos humanos, à soberania do
país, à educação, às mulheres, aos negros, à população LGBT, aos movimentos
sociais e à população mais pobre.
Que Moro não se engane. A
história é pródiga em transformar heróis em vilões e vice-versa.
O golpe avança para
entronizar duas das forças mais nefastas que tomaram conta do país: a de
pastores políticos de igrejas que, se não fosse o álibi da religião poderiam
ser enquadrados como estelionatários, e a do fascismo liderado por Bolsonaro,
capaz de capitalizar o ódio de milhões de brasileiros que foram às ruas e às
janelas bater panelas contra Dilma, Lula e o PT pelo que representavam como projeto
de país, porque a corrupção nunca os incomodou, como agora, aumentada e
escancarada, não provoca nenhuma reação.
Que Moro não se iluda com o
brilho fugaz das telas de TV e com a sua aparente fama, porque será lembrado
como infame.
Ao condenar Lula a nove anos
e meio de prisão, numa alusão aos nove dedos do ex-presidente, Moro prova que é
um juiz perverso. E medíocre. Produziu uma sentença que será objeto de estudo e
escárnio, um case do que a justiça não pode ser.
A condenação de Lula é mero
pretexto, porque a sentença é contra um projeto de nação, que aos poucos vai
sendo subjugada em sua soberania, entregue às forças do mercado, ávidas por
lucros obscenos no país que já é um dos 10 piores em distribuição de renda.
Há muitos casos na história
de acusações e condenações espúrias, como as de Nicolas Sacco e Bartolomeo
Vanzetti, nos Estados Unidos, a do capitão Alfred Dreyfus, na França, ou a de
Nelson Mandela, na África do Sul.
Condenações que sempre
serviram a propósitos políticos.
Luís Inácio Lula da Silva,
que já colocou o seu nome na história por promover a maior ascensão social da
população mais miserável do país, que liderou – com todos os problemas – um
projeto de inserção do Brasil entre as maiores nações do planeta, terá seu nome
ainda mais cultuado diante da injusta perseguição que sofre.
A tortura a que é submetido,
por acusações não comprovadas contra ele e seus familiares foram engendradas em
dezenas de capas de revistas e jornais, e incontáveis minutos em emissoras de
rádio e TV, certamente o alçarão à condição também de perseguido político. De
uma nova forma de perseguição política, mais sofisticada, nem por isso menos
cruel.
Moro condenou Lula, mas
condenou-se também. Lula permanecerá uma lenda viva na história do Brasil.
Tanto maior quanto mostrarem-se infundadas, no futuro, as acusações e as
manobras que certamente vão impedi-lo de ser candidato e derrotar o golpe pela
via democrática, se eleições houver em 2018.
Moro, o juiz que se comporta
muito mais como um acusador seletivo, que é moroso com corruptos golpistas e
sem morosidade com quem apoiou Lula, Dilma e o PT, condenou-se a ser, muito em
breve, um nome a ser esquecido no pé de página da história, um mero instrumento
de forças maiores que consumaram o golpe. Alguém, no máximo, a ser lembrado de
forma pouco digna como exemplo do que a justiça não pode ser, caso queira ter
esse nome.
* Celso Vicenzi é jornalista,
ex-presidente do Sindicato dos Jornalistas/SC.
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