Mais
ou menos médicos?
Emir Sader
A implementação do programa Mais Médicos serviu para trazer à luz
publica o escândalo que é o processo de formação e profissionalização dos
médicos das universidades públicas. O governo teve que apelar para médicos cubanos,
porque os médicos brasileiros, formados gratuitamente nas melhores
universidades brasileiros, se negavam a ir atender as pessoas onde mais se
precisa que eles atendam.
Alegavam que o salário não
era bom, que não havia condições de atendimento naquelas lonjuras etc. etc.
Saíram para as ruas querendo vetar o programa e considerando que teriam poder,
pela influência sobre seus pacientes, para derrotar o programa e a Dilma.
Deram-se muito mal. Apesar
das exibições explicitas de racismo, o povo recebeu imediatamente da melhor
forma possível o fato de que mais de 700 municípios, que nunca tinham tido
médicos, passaram a ter médicos permanentes na sua própria cidade.
Uma médica cearense disse que
"as médicas cubanas se parecem a empregadas domésticas", sem se dar
conta de que fazia um enorme elogio a elas e a Cuba. Pessoas que aqui seriam
empregadas domésticas, em Cuba são médicas.
As universidades públicas
brasileiras formam grande quantidade de médicos, de que a grande maioria não
tem compromisso algum com a situação de saúde do país. Sem contrapartida
alguma, saem dos melhores cursos de medicina do país, que cursaram
gratuitamente, para abrir consultórios em bairros ricos das grandes cidades
brasileiras, atender clientela chique, que paga os tubos pelas consultas.
Formados em universidades públicas, fazem da sua profissão uma fábrica para se
enriquecerem, da medicina uma atividade mercantil.
Olhem onde está trabalhando a
grande maioria dos médicos brasileiros e onde está a grande maioria de doenças
no pais? Há distancia abismal. O médico deveria se ocupar das dores e dos
sofrimentos das pessoas. Os médicos cubanos podem não ser melhores médicos do
que os brasileiros, mas são certamente muito melhores cidadãos. Têm consciência
de a quem tem que atender prioritariamente.
Para vergonha das faculdades
de medicina públicas no Brasil, gente atendida pelos médicos cubanos diz que
eles "olham pra gente", "tocam na gente", o que significa
que aqueles que apareciam às vezes por lá não olham pros pacientes, não tocam
nos pacientes.
A composição atual do
programa Mais Médicos incorporou uma
grande maioria de médicos brasileiros, que não consideram que a remuneração é
insuficiente, que vão atender as cidades e os pacientes que antes não eram
atendidos. Mesmo com o governo golpista querendo terminar ou diminuir o
programa, a população e os prefeitos cujos municípios passaram a ser atendidos,
não o permitem.
Mas os cursos de medicina, na
sua grande maioria, continuam a formar, nas universidades públicas, médicos
para atender a população rica, ganhando fortunas. A política de cotas começa a
dar frutos, formando as primeiras gerações de médicos negros, pobres. Porém,
isso se dá com grande dificuldade, por requerer que os estudantes dediquem 6
anos em tempo integral ao curso, com livros caros. Tratava-se de apoiá-los com
bolsas de estudo, mas o governo atual cortou esse apoio.
A própria imagem do médico
como um tipo branco, de avental engomado, alto, bonito, nas mãos de quem fica o
destino dos pacientes, ficou questionado. No inicio do Mais Médicos, só saíam às ruas gente de direita, para questioná-lo.
O pessoal de esquerda parece que se sentia constrangido. Mas o governo teve uma
grande vitória – especialmente pela ação da presidente Dilma e do ministro
Padilha -, hoje a maioria esmagadora, sempre acima de 90%, da população, apoia
o programa e não quer mais ficar sem ele.
Agora, o governo golpista
atende demanda elitista de setor dos médicos e proíbe a criação de novos cursos
de medicina. Como se o Brasil não precisasse de mais médicos, mas o
"mercado" quer manter a reserva para aqueles privilegiados que podem
fazer cursos nas faculdades existentes e atender os pacientes que podem pagar
as consultas que eles cobram.
É um crime de lesa
humanidade. Reitera a imagem de que o governo golpista governa para os ricos.
Forma médicos ricos, que atendem os ricos. E a saúde pública, o SUS, o Mais Médicos, que se danem.
Mais do que nunca um
referendo revogatório se torna condição indispensável do resgate da democracia
no Brasil. Que não se resume ao povo recuperar o direito de eleger o presidente
da República, mas de ter seus direitos elementares atendidos, entre os quais a
saúde de qualidade, gratuita, em todos os lugares do país, é um deles.
O Brasil precisa de mais e
melhores médicos e não de menos médicos. Precisa de médicos formados com
recursos púbicos para atender a massa da população, aquela que mais requer
atenção. Dinheiro público para formar médicos para o povo. Quem quiser atender
clientela rica, que busque faculdades privadas e pague por seu curso.
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