sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

Senhores, o país vive um drama. Pragmatismos depois, por favor

Senhores, o país vive um drama. Pragmatismos depois, por favor

Observo, com tristeza, que boa parte da esquerda, ao contrário do povão, não sabe compreender que a propagação de um sentimento no meio do povo não é imediata como a de uma notícia, falsa ou real, que provoca corrida de pessoas a determinados pontos, sejam caixas de banco ou postos de saúde.
Praça pública é outro departamento.
Não há como deixar de perceber que, na maioria do povo brasileiro há um sentimento de perplexidade e o próprio Lula o registrou,  nas diversas vezes em que se referiu estarmos vivendo uma espécie de “anestesia”, injetada e respirada por uma campanha de mídia como poucas vezes se viu na história brasileira, apenas em tempo em que não era ela, tão intensamente, o instrumento quase único de formação da consciência popular.
Não faria sentido, mesmo que Lula se considerasse numa posição desesperada, sair à procura escancarada de um “Plano B”.
Ninguém se iluda: baixar a guarda, acusar o golpe e sair apontando para quem deverá “herdar” os votos, enquanto vivemos ainda a cena ensanguentada de um homicídio político não é apenas um gesto de oportunismo: é uma falta de sintonia atroz com a população, que só levaria ao aniquilamento eleitoral do campo popular.
Só alguém encharcado do pensamento da direita, de que uma candidatura pode ser um refúgio para resistir a uma ofensiva desta monta pode achar que Lula virou candidato para proteger-se da perseguição judicial. Foi o contrário: o golpe e ela – que não se separam – é que o levaram a aceitar o que não pretendia mais.
Quando participei de uma entrevista com Lula, em 2014, e se ensaiava o movimento “Volta, Lula” para as eleições daquele ano, falei a ele sobre isso e ele o recusava, peremptoriamente. Chegou, aliás, a “fechar a cara” um pouco, sem agressão, mas em evidente desacordo.
Mas agora, que o punhal da politização aguerrida do Judiciário – e não tenham dúvidas que ela só aumentará – se crava em suas costas, querem que ele seja “bonzinho” e “realista”, abandone a defesa de sua dignidade  para ver se, com a cota farta de sua carne os lobos se acalmam e dos deixem escolher “outro” , como se o impedimento de Lula fosse pessoal e intransferível?
É cegueira demais não entender que este é um processo político, onde a hipertrofia e a usurpação de poderes pela Justiça se tornaram uma forma de tutela política da sociedade.
Formou-se um partido, disseminado em milhares de homens e mulheres, bem pagos, sem votos que não precisam ter, mas com o direito de decidir sobre tudo aquilo que caia – ou façam cair – em suas mãos.
De forma inquestionável pela sociedade, submetida apenas à homologação quase automática de seus pares.
Eles próprios cuidam da manutenção de seu status quo e privilégios, enquanto que ao status quo e privilégios da sociedade terceirizam a tarefa imunda de manter: se a Michel Temer ou aos militares – diretamente ou pelo desagradável e anacrônico Jair, que com certo pudor aceitam – são outros 500.
Só os tolos e os vaidosos podem, a esta altura, desejar receber o espólio de quem está vivo e ardendo nas cabeças deste país, sejam as do povo seja a das elites, que só pensam em como retalhar seu corpo e salgar a terra da memória de seus governos.
Não basta dizer que “é uma pena” que tudo isso tenha acontecido, mas seguiremos em frente. É não entender e não estar à altura de uma caminhada em que Lula é a bandeira possível ao povo brasileiro e a única força que, mesmo atingida com tal brutalidade, ainda amedronta e impede a marcha da fascistização do Brasil.

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