domingo, 25 de outubro de 2015

LULA, FHC E A DESIGUALDADE SOCIAL

José de Oliveira Costa*
Quando Fernando Henrique pronunciou aquela nova profissão de fé política, ao dizer: “esqueçam o que escrevi”, passamos alguns momentos de perplexidade. E agora? Pensávamos nós, iludidos que estávamos por sua falação e escrita de professor com fama de intelectual comprometido com as causas populares e a justiça social. Para muitos, ele e Lula formavam a parceria ideal para juntar a doutrina e a prática social, num modelo ótimo de praxis política para enfrentamento à avalanche neoliberal que começava a se estender pelo mundo. Ledo engano. Fernando Henrique não só abdicara dos seus livros, mas também de suas crenças.Viu ele que o capital é mais forte do que ele pensava e não era daqueles de jogar sacrifícios fora. Abraçou a socialdemocracia do PSDB para fazer de conta que alguma flama socialista lhe restava. Não foi longe com esta camuflagem. Aliou- se ao PFL (hoje, DEM) que trazia todos os resíduos e excrementos da Arena/PDS, sustentáculo da ditadura que tantas amarguras e crueldades custou aos brasileiros. A partir daí, ficou claro: abandonou as causas da solidariedade social pelo Poder. Não causa surpresa ter feito o jogo sorrateiro que fez por mais quatro anos de presidência.
Cobrado para mostrar uma marca social do seu governo, inventou aquela “vitrine” que foi a “ bolsa educação”. No fim do seu governo, disse em entrevista que o problema da inclusão social teria que ficar à espera que a economia espontaneamente resolvesse porque o governo não tinha capacidade financeira para fazê-lo.
 Depois disso, chegam Lula e Dilma e entre 2001 e 2013 fazem cair a pobreza extrema no país de 64%. Hoje os extremamente pobres (no limiar da fome ) é de apenas 4,9% da população. Este posicionamento contrastante de dois ícones da política brasileira, surgidos da mesma nascente ideológica, é o que mais impressiona.
Lula usou o sentimento, a intuição e a sua própria história para sedimentar a sua crença de que a solidariedade social é o valor maior. O seu sofrimento no ambiente nordestino forneceu-lhe a couraça para enfrentar os desafios. Já FHC teve ambiente diferente, o que não lhe deu forças para lidar contra a estrutura dominante. As suas convicções não foram forjadas no sentimento, apenas assimilação dos esquemas teóricos que se dispersaram na personalidade calcada pela indiferença própria da classe média paulistana.
A energia política não prospera sem emoção. As convicções do acadêmico FHC se desvaneceram na primeira dificuldade. Na sua cultura familiar e de classe, o poder era o maior referencial. E não havia como vislumbrar poder naquela aventura de enlouquecidos por liberdade e justiça. Já Lula guardava a têmpera de quem lutou desde criança na desigualdade. Moldou sua coragem na cultura de quem lutava contra o destino. Tinha alma lapidada das histórias de Antônio Conselheiro e dos saques que as secas ensinaram aos pobres tomarem dos ricos o necessário para não morrer de fome.
Temos hoje claramente uma cultura plasmada na desigualdade com a qual nos acostumamos. Temos na nossa sociedade um divisor marcado por três mazelas: de um lado, a desigualdade, a corrupção e a indiferença; do outro, os inconformados, os lutadores e também os sonhadores e até fanáticos das boas causas. O cenário poderá continuar assim por muito tempo, mas sempre em marcha na busca da felicidade coletiva que é o destino e o carisma da humanidade.
 
* Engº agrônomo, mestre em economia, profº. aposentado da UFPB.

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