Ditadura Constitucional, de Temer-Alckmin
Roberto
Amaral
A concentração na Avenida Paulista, domingo último
(4), reuniu algumas dezenas de milhares de pessoas. Algo muito distinto dos 40
"gatos pingados" da aritmética frívola do presidente em doce
vilegiatura. Tanta gente que nenhum veículo de imprensa ousou anunciar seu
número. O Datafolha desta feita, precatado, não se interessou por apresentar
estimativa. Da Paulista, essa multidão ordeira, composta majoritariamente de
jovens (o que é novo e importante e significativo) caminhando de forma
pacífica, cantando e exibindo cartazes, entoando palavras de ordem como o
atualíssimo "Fora Temer", seguiu, sem incidentes, até o Largo do
Batata, distante uns oito quilômetros, onde a manifestação (cercada por um
aparato bélico sem justificativa) se encerrou, após breve comício. Ao final,
começou a dispersar-se, pacificamente, repito, recebendo dos organizadores a
recomendação de "evitar provocações". De nada, porém, adiantou a precaução,
porque o projeto temerário e irresponsável da PM era espancar, respondendo a
provocações ou não. A velha e cediça e estéril forma de intimidação de que se
valem os Estados policiais. Já distantes do centro da aglomeração, que, repito
se dispersava, ordeira e pacificamente, ao fim de uma marcha democrática,
estávamos — além de mim, os médicos Aitan e Helenita Sipahi, septuagenários
como eu —, o deputado Paulo Teixeira e o senador Lindbergh Farias, que dava uma
entrevista. Foi quando nos vimos atingidos por uma onda de gás lacrimogênio e
eu senti no braço esquerdo um forte impacto seguido de dor aguda. Havia sido
atingido por um projétil de borracha, ou fragmento de uma bomba, de uma das
muitas centenas de bombas lançadas e explodidas contra a massa indefesa,
assustada e tomada por justo pânico. Já era muito difícil respirar, a garganta
ardia, nossas vozes sumiam, os olhos lacrimejavam, a visão se tornara turva e,
sem alternativas, corremos, corremos todos nas mais variadas direções, em busca
de saída que era simplesmente abandonar o teatro das ações e procurar respirar.
Alguns se refugiaram nos vários bares, onde, no entanto, foram atacados pelos
soldados em fúria. Seguimos, eu, Paulo Teixeira e Lindberg, amparados e guiados
por jovens populares que nos levaram pelas estreitas ruas do bairro. Atrás de
nós explodiam bombas de gás lacrimogênio e de efeito moral e lá no fundo jatos
d’água. O cenário me fez retornar aos anos de chumbo da ditadura militar.
Assim se inaugura a "ditadura
constitucional" que é apenas dos produtos do golpe de Estado que depôs
Dilma Rousseff. É apenas o começo. Dias piores virão, pois o Estado autoritário
é a conditio sine qua non para a
implantação do governo antipopular. Meirelles-Serra sucedem Campos-Bulhões e
Temer (com o acento de sua mediocridade pessoal) será a releitura anacrônica de
Castello, que era mais feio por dentro do que por fora.
Quem viver verá.
Fonte: Blog do Roberto Amaral
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