Carta ao
ministro da Justiça
Fui preso comum. Sim, a ditadura, que
não respeitava direitos, me transferiu da prisão política para a comum. Em dois
anos, passei pela Penitenciária do Estado de São Paulo, Carandiru e
Penitenciária de Presidente Venceslau (SP), a mesma que hoje abriga o comando
do PCC.
Frei Betto*
É verdade, faz tempo que vivi em nosso
sistema prisional. Mas de lá pra cá pouco mudou. Só piorou. E os governos do
Brasil democrático tomaram uma única medida, a mesma que Temer anunciou há pouco:
construir novas cadeias. Agora mesmo, frente ao massacre no Amazonas, já
conhecido como “Carandiru 2”, o que fez o governo federal?
Propôs a construção de mais duas
penitenciárias naquele estado.
Hoje o Brasil abriga 660 mil presos. A
continuar a enxugar gelo, ou seja, aliviar os efeitos da criminalidade sem
combater as causas, daqui a pouco serão 1 milhão.
A solução é polvilhar nosso território
de presídios?
Há quem proponha entregar o sistema
prisional à iniciativa privada. Aliás, a penitenciária Anísio Jobim, em Manaus,
na qual foram trucidados 56 presos, funciona em parceria público-privada. Esse
modelito, adotado nos EUA, vem sendo revisto pelo Tio Sam.
Como a empresa
recebe do Estado segundo o número de detentos que administra, quanto mais
lotada a prisão, maior o lucro...
Sou a favor da parceria público-privada
em outros termos. Transformar cada penitenciária em oficina-escola. Tirar os
detentos da ociosidade. Em convênio com empresas, fazer funcionar ali dentro
oficinas de fabricação de brinquedos, bicicletas e velocípedes, material
esportivo, artesanato etc., mediante remuneração salarial. E aulas de ensino
fundamental e médio, idiomas, culinária, teatro, dança etc. E, de acordo com a
lei, regressão da pena a cada etapa vencida.
Muitos ingressariam nessas atividades,
inicialmente, movidos pelo interesse de encurtar o tempo entre as grades.
Porém, oficinas e cursos haveriam de mudar-lhes o modo de pensar e agir,
recuperando-os ao convívio social.
Utopia? Não, experiência.
Basta analisar o índice de reincidência
criminal daqueles que, em Presidente Venceslau, passaram pelo curso de ensino
médio e as oficinas de pintura, teatro e estudos bíblicos. Todos administrados
por nós, meia-dúzia de presos políticos, inseridos na massa carcerária.
*Frei Betto é escritor, autor de Batismo de Sangue (Rocco), entre
outros livros.
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