Paulo Henrique
Amorim entrevista o deputado FEDERAL Jorge Solla
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PHA: O deputado
federal Jorge Solla (PT-BA) apresentou à Procuradoria Geral da República e ao
Tribunal de Contas da União uma denúncia contra o Ministro da Saúde, Ricardo
Barros, pela compra ilegal de medicamentos junto à Blau Farmacêutica, em
detrimento da Fundação Oswaldo Cruz. Deputado, por que essa denúncia?
Jorge Solla: Nós temos alguns
medicamentos que a partir do Governo Lula passaram a ser alvo de uma política
de incorporação de tecnologia e de produção local. O primeiro deles foi a
chamada Alfaepoetina, um medicamento usado em determinados casos de anemia. E a
transferência de tecnologia veio a partir do laboratório cubano para a fundação
Oswaldo Cruz. A Fundação Oswaldo Cruz é parte do Ministério da Saúde. Para
nossa surpresa, o atual Governo tomou a decisão de, em vez de utilizar a
produção feita pela Fiocruz, fazer uma compra no mercado privado. Tentaram
fazer uma licitação, o Tribunal de Contas derrubou a licitação - e a sensação
de impunidade é tão grande que mesmo assim fizeram a compra emergencial,
alegando dispensa de licitação, alegando, veja só, Paulo Henrique,
desabastecimento! O pessoal da Fiocruz disse que tinha 4 milhões de frascos em
estoque. Eu fui lá pessoalmente verificar. Documentamos, fotografamos... Foram
comprados 3,9 milhões de frascos de um medicamento que tem no estoque do
ministério (4 milhões de frascos, suficientes para quatro ou cinco meses de
abastecimento para todo o país!). Isso aconteceu também com a Ribavirina, que é
um outro medicamento produzido pela Fiocruz. Então, está claro que há um
interesse do Governo Golpista de destruir a política de incorporação
tecnológica, a política de desenvolvimento produtivo, que é tão importante para
melhorar nossa balança comercial e ampliar o acesso da população brasileira a
vacinas e medicamentos - e, obviamente, beneficiar interesses, porque, não por
acaso, é o mesmo laboratório privado que está ganhando todas as compras
emergenciais do Ministério da Saúde: a Blau Farmacêutica.
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PHA: Mas,
deputado, vamos nos deter por um instante no caso da Alfaepoetina: quanto o Ricardo
Barros gastou para comprar esses 4 milhões de doses da Alfaepoetina?
J.S.: Olha, eu não estou com
esse número aqui agora, mas a Ribavirina, o outro medicamento denunciado, saiu
ao custo de 17 centavos a unidade. Eles compraram a R$ 5,19, ou seja, 3000% a
mais do que o custo de produção dentro do laboratório da Fiocruz. Insisto: é do
próprio Ministério da Saúde!
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PHA: O que é a
Ribavirina? Serve para quê?
J.S.: É um medicamento
utilizado no conjunto do tratamento de hepatite. É um dos medicamentos alvos de
transferência de tecnologia e, neste caso, o desabastecimento ocorreu, só que
ocorreu programado. Porque eles deixaram de fazer as ordens de produção durante
todo o ano passado - desde que o Governo Golpista assumiu - e, quando o estoque
acabou, o Governo foi fazer uma compra emergencial. E quem ganhou a compra
emergencial? A Blau Farmacêutica.
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PHA: Quem é essa
Blau Farmacêutica?
J.S.: É um laboratório
privado... eu não conheço os seus proprietários. E, coincidentemente, já tem
pelo menos quatro compras emergenciais que o Ministério da Saúde fez.
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PHA: Em algum
momento o Ministro Ricardo Barros entrou em contato com a Fiocruz, com esse
complexo Bio-Manguinhos, no Rio, para pedir uma redução de custos ou insistir
no abastecimento desse produto, a Ribavirina, que estava provisoriamente sem
estoque?
J.S.: Olha, no caso da
Ribavirina, como eu falei, o desabastecimento foi programado, mas no caso da
Alfaepoetina não existiu desabastecimento. Os fracos estão lá - inclusive, é um
negócio criminoso, porque os 4 milhões de frascos que estão lá vão perder
validade no meio do ano que vem. Terça-feira da semana passada, foi feita uma
audiência pública no Ministério da Saúde para preparar uma licitação para
comprar 15 milhões de frascos, ou seja, o Ministério da Saúde está dizendo que
não vai usar os 4 milhões de frascos que estão lá. E mais: esse trabalho que o
Ministério da Saúde começou no início do Governo Lula, em 2003, tinha uma
política de conteúdo nacional, da mesma forma que foi feito na Petrobras e em outros
setores da Economia brasileira, em que se passou a procurar incorporar
tecnologia, desenvolver Ciência e Tecnologia, investir na formação de recursos
humanos e na incorporação tecnológica no nosso país... na Saúde, isso também
começou. O então ministro, Humberto Costa, assinou um primeiro protocolo da
transferência de tecnologia que foi desse medicamento, chamado aqui na Fiocruz
de Alfaepoetina. A fábrica do princípio ativo, que foi inaugurada pelo Ministro
Ricardo Barros no final do ano passado (ou seja, ele não pode dizer que
desconhece, porque foi lá, viu e inaugurou a fábrica), é a última fase da
transferência de tecnologia, está em plena operação. É a maior fábrica de
medicamentos biológicos da América Latina! É um investimento de mais de R$ 500 milhões,
em prédio, equipamentos, capacitação de recursos humanos... E, se fizerem essa
compra de 15 milhões de frascos, vão destruir esse projeto, porque a fábrica
vai ficar parada! O primeiro medicamento de que a fábrica vai produzir o
princípio ativo - a chamada IFA - é exatamente a Alfaepoetina. E não vão ter
como produzir, porque o Ministério da Saúde não está investindo mais na
produção própria da Alfaepoetina, para poder comprar no mercado privado. Além
de perder 4 milhões de frascos, a fábrica atual permite uma produção de 140 mil
frascos por dia... vai jogar por terra um investimento de mais de R$ 500
milhões na maior e mais moderna fábrica de medicamentos biológicos da América
Latina.
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PHA: O senhor
acredita que o objetivo do Ministro Ricardo Barros é fechar o complexo de
Bio-Manguinhos?
J.S.: Se não é, ele está
caminhando para isso. E não é diferente do que está acontecendo com a Hemobrás.
Você se lembra de que foi feito investimento também para a produção de
hemoderivados, que são medicamentos produzidos a partir de componentes do
sangue humano. A fábrica da Hemobrás, segundo informações que nós já coletamos
dentro do Ministério da Saúde, está ameaçada. O Ministro Ricardo Barros está
fazendo um consórcio com a Tecpar, do Paraná, uma empresa privada, para
passarem a ser fornecedores dos hemocomponentes. Isso significa que o
investimento feito em Pernambuco na fábrica da Hemobrás irá para o lixo, assim
como irá o feito em Bio-Manguinhos, no Rio de Janeiro, se essa política for
preservada, se os órgãos de controle não tomarem nenhuma providência. Eu fico
impressionado com essa sensação de que eles são impunes, porque tentaram uma
licitação, o Tribunal de Contas não aceitou e fizeram a compra emergencial
direta! E mesmo depois da denúncia que fizemos eles vão soltar um edital para
fazer uma licitação para 15 milhões de frascos! E essa licitação adivinha quem
vai ganhar? Eu antecipo: quem vai ganhar é a Blau Farmacêutica. Porque esse
edital que o TCU barrou foi justamente porque a única empresa que atendeu às
exigências que o edital estabelecia era a Blau Farmacêutica, ou seja, um edital
direcionado para um único candidato.
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PHA: O senhor
pensou em denunciar à Polícia?
J.S.: Já fizemos também à
Polícia Federal. Fomos pessoalmente, entreguei em mãos ao presidente do
Tribunal de Contas da União, que nos recebeu muito bem e, prontamente,
encaminhou para o setor que acompanha a área de Saúde. Encaminhamos a denúncia
à PGR, encaminhamos a denúncia para a chefia da Polícia Federal... espero que
desta vez investiguem, porque em 2015 - eu estava na CPI da Petrobras - recebi
um conjunto imenso de provas de corrupção na Odebrecht no final dos anos 1990
com o uso de códigos, com os codinomes dos corruptos, mais de 400 agentes
públicos, recibo de depósito em banco em paraíso fiscal... fui lá pessoalmente
entregar ao dirigente da Polícia Federal e não fizeram nada, nada! Espero que
desta vez não aconteça da mesma forma.
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PHA: Qual foi o
investimento feito na construção da Hemobrás?
J.S.: Olha, eu não estou com
esse dado aqui, mas ele não está concluído, diferente da fábrica de
Bio-Manguinhos, que está pronta, está na fase chamada de pré-operação, quando
vão ligando o sistema de ar, o sistema de água... Para entrar em operação uma
fábrica dessa, leva alguns meses. Mas, só para você ter ideia da importância
disso: o front da tecnologia de medicamentos no mundo está migrando da química
para os medicamentos biológicos. E essa é primeira grande fábrica de biológicos
do Brasil - e a maior da América Latina. Com a tecnologia transferida, o
Brasil, através de uma fundação do próprio Ministério da Saúde, tem o que há de
mais moderno no mundo em tecnologia de medicamentos. É bom lembrar, também, que
graças a essa política de conteúdo nacional e de parcerias de desenvolvimento
produtivo, nós temos hoje o maior programa de vacinação do mundo! Nós não
teríamos como vacinar nossas adolescentes contra o HPV, que causa câncer de colo
de útero, se fôssemos só importadores de vacinas. Não teríamos como ter
erradicado e reduzido a ocorrência de várias doenças. Não teríamos, em suma, o
maior programa de vacinação do mundo se não tivéssemos parcerias com a Fiocruz,
o Instituto Butantan, em São Paulo, incorporado tecnologia e criado produção
local. Então, é impressionante o que está fazendo esse Governo! Incoerentes
eles não são: destruíram Ciência sem Fronteiras...
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PHA: E vão
destruir agora o crédito imobiliário com FGTS, que é a linha mais barata depois
do "Minha Casa, Minha Vida". Está caindo ponto por ponto...
J.S.: Na área de tecnologia,
eles acabaram com o Ministério de Ciência e Tecnologia, acabaram com o Ciência
sem Fronteiras do Ministério da Educação, cortaram o orçamento de todas as
políticas de Ciência e Tecnologia para 40% do que era no passado, estão
destruindo a política de conteúdo nacional na Petrobras, acabando com a
Indústria Naval, acabando com projetos estratégicos, tentando privatizar
projetos estratégicos como o satélite brasileiro e, na área de Saúde, a mesma
coisa: tentando destruir a Hemobrás e destruir os investimentos da Fiocruz. É
impressionante como são coerentes no entreguismo e na destruição do patrimônio
nacional.
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PHA: Como diria o
Hamlet, deputado, a loucura tem uma lógica...
J.S.: Tem, tem, com
certeza...
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PHA: O senhor,
por favor, nos mantenha em contato, para que possamos dar cobertura sistemática
a essa tentativa de fechar não só o complexo de Manguinhos, como também a
Fiocruz, o que seria a continuação dessa política...
J.S.: Você sabe que esse
Ministro aí está entalado com a Fiocruz, porque ele não queria que a presidente
eleita tomasse posse... No final do ano, ela foi a mais votada e eles tentaram
evitar que ela fosse empossada.
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PHA: Quem sabe ele
consegue colocar lá o presidente da Blau Farmacêutica...
J.S.: Com certeza.
Barros vai levar o presidente
da Blau à presidência da Fiocruz?
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