quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Diário de uma ocupação n°7 - A (Des)cobertura Midiática

09/11/2016 12:57 - Copyleft

Diário de uma ocupação n°7 - A (Des)cobertura Midiática

O consumo de informação, especialmente nas classes mais populares da população, é fortemente moldado pelos grandes grupos de mídia brasileiros.


Equipe de Comunicação Internacional dos Estudantes do OCUPA IGC
reprodução
A última edição do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), ocorrida durante os últimos dias 5 e 6 deste mês, rendeu aos meios de comunicação nacionais um repleto leque de possibilidades no que se refere à cobertura jornalística do fato. Desde as inúmeras possibilidades temáticas para a redação da edição até matérias de cunho cômico e debochado - bases para os chamados memes das redes sociais - em relação a atrasos de inscritos com os horários oficiais das provas, o assunto - quase unânime - da mídia brasileira durante o fim de semana foi o ENEM. Era sabido, por parte de tais meios de comunicação, dos órgãos institucionais responsáveis pelo exame e pelas lideranças dos institutos educacionais ocupados, que vários locais de realização das provas eram também locais de ocupação e resistência do movimento estudantil, e a mídia, no alto de sua posição enquanto transmissora de fatos e acontecimentos, tratou de tornar pública a realidade de oposição entre o governo e o movimento das ocupações. Essa, talvez, tenha sido a primeira vez que as ocupações tenham tomado o âmbito nacional de discussões e cobertura.
 
O consumo de informação, especialmente nas classes mais populares da população, de onde emana a força política e de coesão do movimento, é fortemente moldado pelos grandes grupos de mídia brasileiros. Desde o mais pequeno jornal até o mais assistido dos telejornais e programas interativos da televisão, a grade de conteúdos e temas apresentada por esses grupos é constituída a direcionar o leitor, o telespectador, o ouvinte ou qualquer outro de condição assimiladora da informação a ter um ponto de vista em relação ao fato, ponto de vista esse que, na maioria dos casos não está de acordo com a verdadeira realidade de tais fatos. O movimento de ocupações e os trâmites políticos da PEC 241/55 são exemplos nítidos desse tendenciamento midiático. É de comum consenso entre os ocupantes, de todas as nossas comissões, que o entendimento da população sobre os objetivos e formas institucionais da PEC é, senão raso, totalmente nulo. Em relação às ocupações, tem-se do senso comum da população um sentimento de inutilidade, como se o movimento fosse um atentado à moral e os bons costumes do país e não uma luta pelos direitos futuros das classes mais baixas e por que não da própria classe média, pelo menos de muitos que acreditam ser classe média ou de pessoas que consideram-se estáveis em seus trabalhos e em sua vida. Em nossas experiências através da comissão de ruas, responsável pelo diálogo com o ambiente externo a ocupação, a percepção dessa realidade foi bastante clara.
 
Conversando com uma colega, percebemos o quão a população está apática quanto ao futuro do país. Essa colega se mostrou contrária às ocupações e indagou que estaríamos perdendo um semestre com esses atos. Quando afirmamos que preferimos perder um semestre do que 20 anos, ela questionou: “Vinte anos? Como assim?”. Foi aí que percebemos que ela não entendia o perigo da PEC 241/55, e que ela representa toda uma camada popular, que está sendo manipulada para que não compreenda a real situação do país e desta forma não questione. Explicando para essa colega o porquê da ocupação, o motivo de nossa luta e o que significa os vinte anos, ela compreendeu e quando ela compreendeu, ela se indignou, e por fim nos apoiou.
 
O desconhecimento popular em relação ao conteúdo político-social envolvido na PEC e, num contexto mais amplo, o jogo político promovido pelo governo golpista torna a capacidade de entendimento de tais processos mais difícil. É uma situação cotidiana em que a população brasileira é envolvida. Os canais de comunicação posicionam-se, através de suas notas e slogans, de forma imparcial, acima de qualquer posicionamento ideológico ou político. Entretanto, impedem que movimentos como o nosso, que tem uma proposta e direcionamento claros, tenham visibilidade. Ao contrário, dissimulam a ideia de que nossa ocupação é ilegítima, na medida em que impede o direito de ir e vir, fazendo assim uma manipulação com ideias democráticas e persuadindo nós, consumidores dessa informação, a concordar com tal crítica. Isso em nada é imparcial. 





 
Em uma nação como a nossa, que se intitula democrática em sociedade e por suas instituições públicas, o direito de diálogo e de manifestação é fundamental. O posicionamento em relação às ações de governo não deve, apenas, ser feito pelo olhar de um único lado da situação. Se hoje existe um movimento de ocupação de escolas e universidades como o nosso, ele deve ser entendido, questionado e debatido em âmbito social e nacional, assim como as medidas governamentais de regulação política, social, econômica e institucional. Não é prudente e saudável que ataques e mais ataques ao nosso movimento sejam feitos sem o direito de resposta, sem que haja um diálogo com a sociedade. Os opositores dizem que o objetivo é uma “Escola sem Partido”, um “Brasil Livre”. Porém onde está a liberdade quando apenas um lado é ouvido? Onde está a imparcialidade quando se parcializa apenas um aspecto da situação? Sem partido não significa neutralidade. Significa ignorância. O posicionamento em relação a algo não induz alguém a ser contra ou a favor a ideias e movimentos, mas sim permite o entendimento dessas. Como ser imparcial no meio de tantas parcialidades? Precisamos debater, urgentemente!!!


Créditos da foto: reprodução




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