A direita mostra os dentes. Como (re)agir?
TYPOGRAPHY
- MEDIUM
- DEFAULT
- READING MODE
A direita mostra os dentes. Como (re)agir?
Por Antonio Martins
Do Outras Palavras
Do Outras Palavras
O fantasma da intervenção militar esvoaçou sobre o Brasil esta semana. O general Martins Mourão, da ativa, prometeu na sexta-feira passada “derrubar este troço todo”, se o Congresso e o Judiciário não retirarem de cena “esses elementos envolvidos em todos os ilícitos”. Seus superiores – o comandante do Exército, Eduardo Villas Bôas e o ministro da Defesa, Raul Jungmann – recusaram-se a puni-lo. Em São Paulo, a Rota, tropa mais brutal da PM, fez exercícios de repressão política, simulando uso de munição real, em plena Avenida Paulista. Uma nova sondagem pré-eleições presidenciais mostrou Jair Bolsonaro consolidado em segundo lugar, abaixo apenas de Lula e à frente de todos os conservadores tradicionais. Como tem sido comum há meses, muitos, entre a esquerda, reforçaram sua convicção fatalista de que “o pior está por vir” e de que “não haverá 2018”.
Os motivos para alarme são reais: os grupos de direita estão claramente testando limites, para ver até onde podem chegar. Mas o derrotismo, como de costume, expressa não apenas um estado melancólico. Revela também uma incapacidade de ver a conjuntura – ou seja, o conjunto dos elementos que compõem o cenário político.
Leia mais:
O fator mais óbvio, que muitos preferem não enxergar, é: se a direita militarista se alvoroça, é principalmente porque o golpe parlamentar de 2016 fracassou. Milhões de pessoas que encheram as ruas, há um ano e meio, estão perplexas e frustradas. Um sonho pueril, segundo o qual bastaria sanear o país dos “petralhas” para convocar de novo a felicidade, despedaçou-se. Há desemprego e gente morando e pedindo em cada esquina. Os negócios da classe média naufragam, as dívidas bancárias espreitam. A Rede Globo, que almeja ser o eleitor maior nas eleições do ano que vem, afastou-se há meses de Temer – que agora terá de lidar com um novo processo. A casta política entende-se apenas quando se trata de aprovar as missões encomendadas pelo grande poder econômico. O fracasso da contra-reforma política revela: não há nenhum projeto comum de futuro. A quadrilha já não se entende. São todos contra todos, na disputa pelo butim do golpe.
PUBLICIDADE
,
PUBLICIDADE
Neste contexto de fracasso, uma parte dos golpistas, busca livrar-se de suas responsabilidades por meio de um clássico: a fuga para frente. Se o remédio agravou a doença, diz o “médico” charlatão, é porque o paciente precisa de uma dose a mais. Por que este expediente primitivo parece funcionar?
Provavelmente porque a população desiludida não encontra, à esquerda, nada que dialogue com seu desamparo. Tente encontrar, no discurso de pré-candidatos como Lula e Ciro Gomes, alguma resposta à agenda de horrores que assombra a Brasil. Os serviços públicos estão sendo devastados. O Pré-Sal pode ser entregue às petroleiras internacionais. O governo ameaça devastar até os santuários da Amazônia. Lula caravaneia pelo Nordeste, seu reduto eleitoral, onde encontra-se com o povo pobre mas evita posicionar-se sobre tudo o que aflige a maioria. Ciro tenta construir um discurso ambíguo de “competência”– no qual caberiam, ele mesmo assegura, personagens como Kassab. Ambos evitam o essencial: como lidarão, se eleitos, com a herança maldita do golpe? Terão coragem de convocar a sociedade para revogar, via referendos, medidas como o congelamento dos gastos sociais por vinte anos, a doação da riqueza petrolífera e o ataque aos direitos indígenas e quilombolas?
Em certas condições, dizem a política e a psicanálise, destruir pode ser uma força positiva. A cólera contra o opressor foi o impulso que construiu as revoluções dos três séculos passados e que moldou, em oposição a um mundo limitado por Deus eu pelos senhores, a ideia de que somos responsáveis por nosso futuro social.
Mas o que a esquerda institucional oferece hoje a quem nutre, com razão, ódio à desigualdade, aos falsos “representantes”, vendidos ao poder econômico, ou aos privilégios? Um discurso surdo e insensível, em defesa de uma democracia que já não existe? O ataque cego à Operação Lava Jato? O delírio de que um dia todas as ondas moralistas cessarão, graças a um acordo por cima? A aposta em que, por uma espécie de milagre laico, Lula ou Ciro poderão ser candidatos, vencerão e nos reconduzirão a um passado virtuoso?
Este estranho sebastianismo, pós-moderno e bizarro, só conduz à paralisia. É graças a ele, a seu saudosismo melancólico e impotente, que se despreza a cólera das maiorias; que se defende a volta de um lulismo conciliatório com as elites – portanto fora de tempo e de lugar; que se abre espaço ao general Mourão e a seu parceiro Bolsonaro.
Claro que há alternativa. Significa impedir que a ultradireita aproprie-se do discurso anti-establishment. Implica uma autocrítica não retórica nem passadista – mas prática e voltada para frente.
Dificimente os partidos sustentarão este projeto. Eles estão capturados demais por uma lógica que os convida a mergulhar nas instituições e no poder sobre. A questão é: aqueles que enxergamos esta debilidade nos atreveremos a ir adiante? Seremos capazes, por exemplo, de propor os referendos revogatórios e de criar um movimento que leve os candidatos à esquerda a defendê-los?
Ou nos limitaremos, em meio à crise, a criticar aqueles que, como sabemos, não darão um passo adiante?
Ou nos limitaremos, em meio à crise, a criticar aqueles que, como sabemos, não darão um passo adiante?
Artigos Relacionados
Privatizações de Temer seguem a mesma cartilha de FHC
OPINIÃO "É a mesma fórmula antiga, ultrapassada e entreguista, com leilão de empresas públicas...
Quem nos salvará dos impérios decadentes?
AMEAÇA Golpes de Estado. Sabotagem de novos polos de poder, como os BRICS. Estímulo às...
Villas Boas manobra para não fazer de Mourão “mártir” de intervencionistas
OPINIÃO "Ele não fala pelo Alto Comando, quem fala pelo Alto Comando sou eu", disse o general...
Fonte: Caros Amigos
Nenhum comentário:
Postar um comentário