COVID-19:
VACINAR OU NÃO VACINAR
Aldemario Araujo Castro
Advogado
Professor
Mestre em Direito
Procurador da Fazenda Nacional
Brasília, 15 de janeiro de 2021
Difteria,
tétano, paralisia infantil, sarampo, caxumba, rubéola, entre outras, são
doenças altamente contagiosas. Já foram tristemente comuns em passado recente.
Atualmente, são muito raras no Brasil.
O que tornou as doenças mencionadas
verdadeiras raridades? Quase todos sabem a resposta para essa indagação.
Trata-se de um avanço técnico-científico conhecido como vacina.
Qualquer
pesquisa despretensiosa identificará que o médico inglês Edward Jenner, no
final do século XVIII, constatou e experimentou a ideia de que provocar uma enfermidade de forma tênue
evitaria que a mesma fosse contraída de maneira mais grave. O veículo de
provocação da doença de forma branda passou a ser chamado de vacina.
Basicamente, ela estimula o sistema imune a produzir elementos de defesa do
organismo (anticorpos). Essa memória imunológica conseguirá acelerar intensamente
a resposta do corpo diante dos verdadeiros agentes patogênicos (a doença em
si).
As vacinas
não estão livres de reações adversas e de contraindicações. Exatamente com
objetivo de minimizar essas ocorrências são desenvolvidos e aperfeiçoados
protocolos de elaboração e testes, inclusive com milhares de voluntários.
As vacinas e
as vacinações se espalharam pelo mundo como a principal forma de prevenção de
inúmeras e perigosas doenças. Observe-se o caso da varíola. Na década de 50 do
século passado, iniciou-se um projeto, patrocinado pela OMS (Organização
Mundial da Saúde), que riscou do globo terrestre a referida doença infecciosa.
A história
das vacinas, aqui resumida ao extremo, e as ideias subjacentes foram amplamente
aceitas no mundo inteiro e incorporadas ao conhecimento médico-científico e aos
ordenamentos jurídicos (para conformar as condutas relacionadas com as mesmas,
notadamente a necessidade de suas utilizações). Em relação a esse último
aspecto, cabe destacar estes elementos na ordem jurídica brasileira:
“Art. 3º Cabe ao Ministério da Saúde a elaboração do Programa Nacional de Imunizações, que definirá as vacinações, inclusive as de caráter obrigatório.
Parágrafo
único. As vacinações obrigatórias serão praticadas de modo sistemático e
gratuito pelos órgãos e entidades públicas, bem como pelas entidades privadas,
subvencionadas pelos Governos Federal, Estaduais e Municipais, em todo o
território nacional” (Lei n. 6.259, de 30 de outubro de 1975).
“Art. 14. O Sistema Único de Saúde promoverá programas de assistência médica e odontológica para a prevenção das enfermidades que ordinariamente afetam a população infantil, e campanhas de educação sanitária para pais, educadores e alunos.
§1o
É obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades
sanitárias” (Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da
Criança e do Adolescente e dá outras providências).
“PORTARIA NORMATIVA Nº 94/GM-MD, DE 4 DE NOVEMBRO
DE 2020. Institui o Calendário de Vacinação Militar.
O
MINISTRO DE ESTADO DA DEFESA, no uso das atribuições que lhe confere o art. 87,
parágrafo único, incisos I e II, da Constituição, e o art. 1º, inciso XIX, do
Anexo I ao Decreto nº 9.570, de 20 de novembro de 2018, tendo em vista o disposto
na Lei nº 6.259, de 30 de outubro de 1975, regulamentada pelo Decreto nº
78.231, de 12 de agosto de 1976, e considerando o que consta do Processo
Administrativo nº 60521.000103/2018-50, resolve:
Art.
1º Fica instituído o Calendário de Vacinação Militar, visando ao controle, à
eliminação e à erradicação das doenças imunopreveníveis e à padronização das
normas de imunização para os militares das Forças Armadas. Parágrafo único. As
vacinas e os períodos estabelecidos no Calendário de Vacinação Militar serão
obrigatórios”.
Neste
momento, em plena pandemia do covid-19, com mais de 200 mil brasileiros
falecidos, mais de 8 milhões infectados (acumulado) e um recrudescimento da
disseminação (“segunda onda”), crescem as “resistências” às vacinas desenvolvidas
para combater a doença, em especial a variante elaborada pelos chineses (coronavac).
É inegável a
existência de inúmeras “objeções” relacionadas com a vacinação para o
enfrentamento ao covid-19. Sem esgotar as ressalvas, podem ser destacados: a)
as disputas políticas, notadamente entre os governos federal e paulista. É no
mínimo estranha a busca desenfreada do Governo Federal por dois milhões de
doses da vacina Oxford-AstraZeneca na Índia quando São Paulo recebeu e tem
armazenadas, segundo várias notícias da imprensa, mais de dez milhões de doses
da coronavac; b) as dúvidas quanto ao surgimento (natural ou artificial) do
vírus e possíveis desdobramentos daí decorrentes; c) os poderosos interesses
econômicos, notadamente dos grandes laboratórios farmacêuticos; d) a utilização
de tecnologias inéditas; e) o desenvolvimento e os testes em prazos muito
exíguos quando comparados aos realizados em relação a outras vacinas no
passado; f) a considerável quantidade de técnicos que, especialmente nas redes
sociais, discordam com veemência das visões majoritárias ou divulgadas pela
grande imprensa (em relação à pandemia, tratamentos, medicamentos, providências
de isolamento social, uso de máscaras, vacinações, etc) e g) a “sensação” de
desorganização e falta de eficiência na administração do combate ao vírus
(observe-se a situação desesperadora de Manaus e a infindável saga logística
envolvendo uma estranha dicotomia entre a produção/estoque de cloroquina e uma
aparente insuficiência de seringas e agulhas). O aprofundamento do debate
acerca desses e outros pontos é fundamental para uma adequada percepção do
(extremamente) complexo contexto vivenciado e os riscos envolvidos nos vários
cenários que podem ser desenhados.
Temos,
entretanto, um problema de fundo de importância capital. Os legítimos e
necessários questionamentos aos mecanismos sociais, políticos e econômicos que
produzem malezas, de todas as ordens e naturezas, não podem, sob pena de uma
volta estarrecedora às cavernas, ao estado de natureza, a lei do mais forte ou
qualquer outra proclamação semelhante, afastar um acordo civilizatório
mínimo que compreende, mas não esgota, conquistas científicas consolidas
com inegáveis frutos colhidos ao longo da história. Nesse sentido, um dos mais
emblemáticos disparates que tive o desprazer de tomar conhecimento foi
proferido, por incrível que pareça, pelo senhor Jair Messias Bolsonaro. Afirmou
o Presidente da República: “Eu tive a melhor vacina, foi o vírus. Sem efeito
colateral” (site folha.uol.com.br).
Em suma, as várias vacinas produzidas contra o covid-19
apresentam dúvidas e riscos (maiores ou menores). Entretanto, nenhum deles
parece, isolada ou conjuntamente, superar os danos em termos de vidas e
sofrimentos provocados pela doença (temos milhões de casos no Brasil e no mundo
como base empírica para essa última afirmação). Assim, só me resta acreditar na
consciência de um mínimo civilizatório dos envolvidos, com suas
complexidades, contradições, defeitos e interesses, no amplo processo de
produção e administração das vacinas. O vírus, esse sim, vive em total estado
de barbárie, por assim dizer. Produz e produzirá o pior resultado que as
condições físico-orgânicas que encontrar permitam.
Recuso-me a conceber, de forma racional ou intuitiva, que milhares e milhares de pessoas, em instituições públicas e privadas (laboratórios, imprensa, governos, organismos internacionais, etc), consumam seus tempos e energias para maltratar e matar, numa espécie de torneio macabro cujo oponente é o vírus.
Nenhum comentário:
Postar um comentário