quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Com investidores em NY, Michel Temer 'volta ao passado para rifar o futuro', diz especialista

Com investidores em NY, Michel Temer 'volta ao passado para rifar o futuro', diz especialista


Para Alessandra Cardoso, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos, assim como na China, presidente foi aos EUA 'vender o Brasil'
Em discurso proferido nesta quarta-feira (21/09), em Nova York, em evento promovido pela Câmara Americana de Comércio no Brasil (Amcham Brasil), em colaboração com a Council of the Americas (COA), o presidente Michel Temer enumerou as reformas neoliberais e privatizantes que seu governo está implementando no país como argumento para convencer o mercado a investir no Brasil.
A uma plateia formada por executivos, Temer afirmou “esperar que os senhores possam participar com o Brasil de uma nova visão que o Brasil tem hoje do mundo”. “A iniciativa privada participar junto com o poder público do desenvolvimento do país é fruto da nossa Constituição”, disse. Ele também se reuniu com o vice-presidente dos Estados Unidos, Joe Biden.
Aos investidores, Temer citou como exemplos de que o Brasil está preparado a receber investimentos a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241 (que congela investimentos em educação e saúde durante 20 anos), a quebra do regime de partilha do pré-sal, as reformas da Previdência e trabalhista e o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), que entrou em vigor na semana passada, que vai abrir o mercado para concessões a multinacionais de obras de infraestrutura, petróleo e gás.
“O que estamos fazendo aqui é falar da infraestrutura brasileira, que é exata e precisamente onde os senhores empresários poderão ter um interesse maior.” “No Brasil hoje temos uma estabilidade política extraordinária, por causa da relação adequada entre Executivo e Legislativo”, disse, acrescentando que isso garante a segurança jurídica que permitirá que os contratos sejam cumpridos. Citou pesquisas que revelam que a confiança está voltando rapidamente ao país.
Beto Barata / PR

Joe Biden, vice-presidente dos EUA, em encontro com Michel Temer e José Serra em NY
“Estamos voltando ao passado para rifar o futuro”, diz Alessandra Cardoso, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). "Temer foi vender o Brasil, assim como foi vender para a China na reunião do G20 (no início do mês), dizendo que a parceria de investimentos vai abrir mão inclusive da legislação ambiental, que vai exigir licenças aceleradas para garantir investimento em infraestrutura. Está tentando vender o Brasil tanto para os Estados Unidos quanto para onde vislumbre capitais disponíveis e dispostos a apostar nesse pacote neoliberal”, disse.
Para o deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS), a afirmação de que o país voltou à normalidade política é “risível”. “Dizer que o Brasil vive uma estabilidade política extraordinária é tão risível que ele se descredencia como interlocutor com razoável credibilidade. Sabe-se no mundo inteiro que ele não pode sair na rua, que é uma figura execrada, não pode participar de um evento público”, diz. “Num mundo globalizado, com internet, ele passa por uma figura ridícula. Isso leva a um descrédito de qualquer afirmação sobre estabilidade econômica e cenário para investimentos.”
Apesar da impopularidade, Temer garantiu aos investidores que vai aprovar as reformas, o que parece provável do ponto de vista do Congresso hoje. Ressaltando sua “interlocução muito fácil com o Legislativo”, disse ter “convicção” de que a PEC 241 será aprovada. “Está sendo processada com muita rapidez no Congresso”, explicou aos executivos.
Para Paulo Pimenta, porém, o governo tem imensas dificuldades quanto à aprovação da PEC 241. Ele acredita que haverá reação na sociedade, já que inviabiliza o país do ponto de vista de suas políticas públicas.
"Temer está tentando retomar um pacote ultraneoliberal que foi tentado nas décadas de 1980 e 90, e foi interrompido porque é um caldeirão de tensões e de ofensiva a direitos, de flexibilização de legislação, de ofensiva à Constituição e de privatização que não vai resolver o problema estrutural de crescimento do país”, diz Alessandra Cardoso.
 

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O pacote de reforma trabalhista, previdenciária e de privatização que Temer apresentou a investidores também não vai resolver o problema estrutural do país do ponto de vista da retomada do crescimento, avalia a analista. “O que vamos fazer é aprofundar as desigualdades, a incapacidade do país de construir uma saída a longo prazo para o problema da crise que está posta e que tem um fator político muito evidente.”
À RBA, o professor Giorgio Romano Schutte, da Universidade Federal do ABC, disse na semana passada, a respeito das PPIs, que o capital demonstrava não ter interesse em investir no Brasil devido a regras jurídico-econômicas que alegava serem restritas, além de, segundo o mercado, haver muita intervenção do governo. Além disso, os investidores internacionais consideravam o governo Dilma Rousseff resistente quanto às licitações.
Regime de partilha
No discurso em Nova York, Temer mencionou a recém-aprovada lei das PPIs como garantia de bons negócios aos investidores. “Estamos abrindo 34 oportunidades de concessões na área de portos, aeroportos, energia, ferrovia, óleo e gás.”
Nesse momento, aproveitou o gancho para falar da quebra do regime de partilha do pré-sal, dizendo que “em brevíssimo tempo nós vamos aprovar um projeto do senador (licenciado) José Serra que acabou com aquela obrigação de a Petrobras participar necessariamente de 30% dos investimentos nessa área”. A intenção, disse, é  “abrir e universalizar o mercado brasileiro, na convicção de que, para combater o desemprego, você precisa incentivar a indústria, o comércio, os serviços, o agronegócio e restabelecer a confiança”.
“Ele foi para lá se colocar como um vendilhão que não disfarça que o papel dele, que é entregar o que nós temos de melhor pra tentar atrair o capital estrangeiro. É evidente que vamos trabalhar para barrar isso. É uma vergonha”, disse Paulo Pimenta.
Temer também enfatizou a “inovação e readequação da legislação tributária”, para falar da intenção de reformar radicalmente a legislação trabalhista e a CLT.  Ele disse que a intenção é “permitir que as convenções façam prevalecer o acordado entre trabalhadores e empregadores” e que a medida tem o objetivo de manter o emprego. “Até mesmo horário de trabalho pode ser acordado”, explicou aos norte-americanos.

*Publicado originalmente no site da Rede Brasil Atual.

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