terça-feira, 29 de novembro de 2016

A revolução por amor à liberdade e à justiça

28/11/2016 10:48 - Copyleft

A revolução por amor à liberdade e à justiça

Tal como o oxigênio é necessário ao nosso organismo vivo, a revolução foi o elemento insuflador da existência humana libertária nos anos 50 e 60.


Edson Teles
reprodução
De pé, ó vítimas da fome
De pé, famélicos da terra
 
Tal como o oxigênio é necessário ao nosso organismo vivo, a revolução foi o elemento insuflador da existência humana libertária nos anos 50 e 60. Para muitos viver sem lutar era o mesmo existir sem respirar. Diante de injustiças, desigualdades, preconceitos, racismos e opressão uma geração se inflou de ares revolucionários e acreditou ser possível, por suas próprias forças, transformar profundamente o mundo.
 
A partir dos anos 70 se assiste à consolidação da crítica aos elementos totalitários, conservadores e opressores na experiência do socialismo de Estado e do partido comunista. Participante desta reflexão surgiram as aberturas para outras formas de relações políticas e práticas sociais. Vivia-se o mundo da pílula anticoncepcional, da construção da nova fase do movimento feminista, da experimentação dos amores fora da heteronormatividade, do deslocamento final das lutas de resistência do campo para a cidade.
 





Se a crítica à revolução como um molde para outra forma de dominação era procedente, destacava-se neste mesmo passo as subjetividades revolucionárias que habitaram naquele mundo complexo: do cotidiano dentro do partido e da experimentação de uma nova sexualidade, da defesa do Estado socialista e do conflito com as castas sindicais, da militância centralizada e das novas possibilidades criativas de ação política.
 
Ao mesmo tempo e já desde os anos 50, o Brasil vivia o otimismo da burguesia, beneficiada pelos investimentos das grandes empresas e países capitalistas, bem como o aumento da presença social da classe operária e de suas demandas por direitos e o crescimento das lutas pela reforma agrária. 
 
Ocorria, neste contexto, o surgimento das Ligas Camponesas, em Pernambuco, o fortalecimento e a presença institucional do Partido Comunista, especialmente no governo do presidente João Goulart, e uma organização política cada vez mais elaborada.
 
Em 1964, com o apoio explícito do governo norte-americano e dos setores conservadores, como os partidos de direita e parte significativa da Igreja Católica, os militares deram um golpe de estado derrubando João Goulart. Encerrava-se os breves 19 anos de democracia (1945-1964). A força da ideia de revolução era tamanha que mesmo o movimento golpista se auto denominou “revolucionário”. 
 
À época já era clara a contradição entre os programas políticos dos partidos alinhados a Moscou, de cunho reformista e aderente aos projetos das burguesias nacionais, e a prática dos militantes, envoltos na atmosfera revolucionária. Somava-se a isto o choque da ação política democrática com o centralismo das direções partidárias. No Brasil, surgem novos agrupamentos políticos, de origem marxista e outros nacionalistas, porém influenciados pelos novos ares e pela possibilidade de mudarem o mundo através da luta revolucionária. Diante do regime de exceção ganhava força a proposta de luta armada contra a ditadura.
 
Em 1966, o revolucionário comunista Carlos Marighella publica sua carta de rompimento com o PCB e dá o tom da opção pela luta armada:
 
Falta o impulso revolucionário, a consciência revolucionária, que é gerada pela luta. A saída do Brasil – a experiência atual está mostrando – só pode ser a luta armada, o caminho revolucionário, a preparação da insurreição armada do povo, com todas as consequências e implicações que daí resultarem.
 
Somado ao contexto histórico e político que levou as organizações de esquerda e nacionalistas a resistirem com armas à ditadura militar havia a construção da subjetividade revolucionária, cujas figuras mais universais foram a de Che Guevara e de Fidel Castro. Para este sujeito, existente no mundo pela forma do conflito, melhor seria morrer lutando do que viver sob a opressão de um regime autoritário ou diante de injustiças sociais.
 
O que os fazia agir? Por que aderir à “loucura” da luta armada, ou à revolução?
 
Uma geração de jovens acreditou com todas as forças de sua sensibilidade em um mundo igualitário e se dispôs, “com todas as consequências e implicações que daí resultaram”, a doarem suas vidas por este imaginário. Se os partidos objetivavam a tomada do Estado e a construção de um outro regime político e o discurso socialista ainda apresentava o líder como sendo macho, hetero e, de preferência, branco, os indivíduos revolucionários pareciam não aceitar o papel que o mundo capitalista a eles tinha reservado, tanto quanto tinham a certeza de criarem, pela luta, outras formas de relações humanas.
 
Neste momento da morte de Fidel Castro e em admiração aos revolucionários do século XX, aos seus amores à liberdade e à justiça e à coragem para fazerem a revolução, gostaria de homenagear dois lutadores brasileiros, simbolizando as centenas dos que fizeram de seus afetos uma vida dedicada à derrubada da ditadura e em defesa da liberdade:
 
Helenira Resende de Souza Nazareth, mulher negra, líder estudantil, valente combatente das forças guerrilheiras do Araguaia. Lembro seu nome porque a história, escrita e contada, insiste em invisibilizar negros e mulheres. Foi presa, após ser baleada em combate, no dia 28 de setembro de 1972. Testemunhos dão conta de que foi torturada, assassinada e teve seu corpo desaparecido pelo Exército. Até hoje seus familiares não puderam lhe dar um enterro digno.
 
Carlos Nicolau Danielli, assassinado aos 43 anos de idade, em 30 de dezembro de 1972. Comunista desde a adolescência quando era operário na construção naval, em São Gonçalo (RJ). Esteve em meados de 1962 em Cuba, nas ações de solidariedade ao povo cubano diante do ataque norte-americano conhecido como “Crise dos Mísseis”. Lembro dele, a quem chamávamos de “Tio Sig”, pois junto ao seu sequestro pelo DOI-CODI do II Exército, em São Paulo, fomos presos eu e minha irmã Janaína, tínhamos 4 e 5 anos de idade respectivamente, bem como minha mãe (Amelinha), meu pai (César) e minha tia (Criméia), os quais testemunharam seu assassinato.


Créditos da foto: reprodução




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