domingo, 9 de março de 2014

A responsabilidade do voto


Pense bem no voto que você, eleitor, depositará na urna

26/2/2014 13:57
Por Gilberto de Souza - do Rio de Janeiro

Tropa de Choque, em São Paulo, cerca manifestantes em uma espécie de arrastão
Tropa de Choque, em São Paulo, cerca manifestantes em uma espécie de arrastão
Vamos pensar juntos. Se os manifestantes ganham as ruas para exigir mudanças na vida do país (uns pela esquerda, outros pela direita, com os black bloc no final para quebrar tudo), quem prefere ficar em casa, lendo um livro ou simplesmente fazendo outra atividade qualquer, e protestar a cada eleição com o voto na urna, este brasileiro tem o direito de opinar com a mesma severidade com que aquela massa humana demonstra a sua indignação quanto aos preços e a qualidade do transporte público, ao drama nos hospitais, à corrupção, à falta de amor aos bichos ou ao que mais quiser.
Mas fica a pergunta: como conseguir que, diante do voto – expressão máxima da democracia –, as pessoas escolhidas a dedo para representar os anseios de um país mais justo e igualitário, parem de agir contra o desejo da maioria dos brasileiros? Será preciso, então, ir às ruas e, com o apoio dos encapuzados, incendiar um fusca? Certamente que não.
Antes disso, melhor compreender que há uma imensa maioria de brasileiros que, simplesmente, não conhece o lado teórico da realidade e segue, nesta existência, preocupada com os afazeres diários, a vida simples de um domingo de futebol, se muito com um almoço em família, quando há família, mas às vésperas de uma semana inteira de luta para manter as contas pagas no fim do mês. E nem sempre consegue.
A exemplo da nova tática da polícia paulista, de promover uma pesca de arrastão a manifestantes, cercando-os com brutamontes, a maioria dos brasileiros tranquilos é engolfada diariamente pela telinha sonora da TV. Que ninguém se iluda, esta é tão ou mais eficiente para calar a voz das ruas do que os recrutas marombados da PM, a soldo do aparato repressor. Mais ilusória do que mascarado com raiva de ‘orelhão’. Aqueles apenas trocaram as balas de borracha pelas artes marciais, embora o resultado seja idêntico. Já os outros, estes continuam mesmo é quebrando entrada de banco, para alegria dos vidraceiros locais. Mas o pacato cidadão, que se dispôs a ficar na fila com o título de eleitor, preparado para se expressar na urna, este tem sua consciência roubada todos os dias e pouco se fala a respeito.
Basta assistir às notícias transmitidas na hora do jantar. Na telinha, eles dizem que os nazistas naquele frágil poder ocupado na Ucrânia são tão legítimos quanto os meninos que não querem a Copa do Mundo de Futebol. Apenas mais exaltados, ilude o casal televisivo.
Quem nasceu há poucas gerações e não se lembra do catiço em que esse país se transformou, ao longo de duas décadas de ditadura, e para quem a II Guerra Mundial é hoje apenas matéria do colégio ou enredo de filme norte-americano, esses brasileiros não veem nada demais se a mesma orientação nazista que se abateu sobre os ucranianos seja reproduzida aqui ao lado, na Venezuela. Os fascistas que querem derrubar um governo democrático no Caribe recebem ajuda dos mesmos aliados que, hoje, juntam os cascos e estendem o braço acima do ombro, com a mão direita espalmada igual nos tempos do Hitler. Mas isso passa batido. Deixa apenas a mensagem subliminar.
Em seguida, entram com cara de drama, ainda bem que em um número menor de lares a cada dia, para dizer que o governo escorregadio da Dilma Rousseff conseguiu agora a proeza de bater novo recorde na arrecadação de impostos e contribuições, em plena crise mundial. O que qualquer país comemoraria, pois os programas sociais e o desenvolvimento estão garantidos, para os urubus disfarçados de apresentadores isso é motivo de lástima. Quase um drama.
Entre um bloco e outro de notícias, porém, anúncios das empresas governamentais ou dos programas do governo federal recheiam os caixas das empresas reacionárias que choram de saudades dos coturnos, em velocidade semelhante à do passado, quando os generais determinavam o quão bilionários seriam os donos das concessões públicas de rádios e TVs dispostos a encobrir a tortura, os assassinatos em série, o horror. Tanto parece – quanto é, de fato – uma chancela à mentirada toda que, para justificar o engodo, chamam isso de ‘mídia técnica’.
Ora, mas o casal da televisão diz que o governo é sem-vergonha, mequetrefe e seus principais líderes estão presos, com tantas regalias no xadrez que poderão até ser transferidos para uma cana mais dura. Em seguida, um anúncio do programa Minha Casa, Minha Vida atesta a seriedade da emissora que acaba de perseguir aqueles homens encarcerados. Mas, para a militância do partido no governo, estes ícones da esquerda são tão inocentes que receberam mais de R$ 2 milhões em doações para quitar as multas impostas; além da cadeia. Então, das duas, uma: ou o governo é mesmo mequetrefe e sem-vergonha e o canal de TV tem toda razão; ou os militantes do partido no governo estão certos e a emissora é golpista, apoiou a ditadura. E ainda apoia. Mais uma vez, com as bençãos e verbas do governo.
Diante desse enigma, como fazer com que o voto, esse mesmo que os brasileiros maiores de 16 anos destinarão aos próximos deputados, senadores, governadores e presidenta, ou presidente, da República, seja tão forte quanto a ‘tropa ninja’, eletrizante feito inzoneiro com tênis de grife, mais convincente do que âncora de jornal noturno e vendedor de carro usado, mas digno o suficiente para mudar os destinos desse país? Aí é que os convidei a pensar juntos. O jeito é ir às ruas em bloco, com ou sem quebra-quebra no final, ou usar o controle remoto, segundo a sugestão simplista da Dilma para não se queimar com o império, e apagar a telinha da TV?
Entre partir para a ignorância contra os guardas do ‘choque’ ou desligar o aparelho de tevê, fique aqui, na internet. Leia O Cafezinho, do jornalista Miguel do Rosário. Não perca, no Megacidadania, os próximos capítulos da fuga de Henrique Pizzolato para desmascarar a trama do ‘mentirão’, como já apelidaram o julgamento que a mídia conservadora chama de ‘mensalão’. Leia os textos brilhantes do Paulo Nogueira, no Diário do Centro do Mundo. E não deixe de conhecer o Conexão Jornalismo, do sempre atento editor Fábio Lau. Visite os sites produzidos pela sociedade civil organizada. Converse com os amigos na rede social de sua preferência e comente sobre as matérias que o jornal Correio do Brasil publica em suas edições diárias, digital e online. Dê mais valor à credibilidade.
Viva em seu país, com gente que ama esse país. Não o deixe, jamais. Se achar que tem razão e ninguém o está ouvindo, procure seus direitos e exerça-os. Não foi o suficiente? Vá, sim, para as ruas e proteste, como se protesta em situação de plenitude democrática. Diga não à violência. E, no final, vote. Para fazer valer a sua opinião, vote de forma simples e objetiva. Vote consciente.
Para ser respeitado e mudar o Brasil não é preciso matar, ou morrer. Tanto aqui quanto em qualquer outra democracia séria, no mundo, é preciso votar para que ela exista e seja mais forte do que qualquer brucutu fardado ou disfarçado.
Pense nisso. E vote.
Gilberto de Souza é jornalista, editor-chefe do jornal Correio do Brasil.

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