05/09/2016 11:16 - Copyleft
Eric NepomucenoDia nacional da infâmia
Nem em seus piores pesadelos, o país previu o que passará a viver a partir deste mês de setembro de 2016.
Após outra maratônica sessão no plenário do Senado – com discursos que se prologaram até o último ser proferido às duas da madrugada, completando quinze horas no total –, chegou o momento da votação da destituição de Dilma Rousseff.
No final da tarde daquela terça (30/8), os aliados de Michel Temer diziam ter assegurados os 54 votos necessários para liquidar um mandato obtido graças aos 54 milhões 508 mil votos populares. Com a maioria do Senado a ser favor, e após um juízo político num processo que não comprovou crime de responsabilidade praticado por Dilma Rousseff, o antes vice-presidente Michel Temer assume a presidência de forma definitiva, e passa a ser a principal autoridade do país que abriga 206 milhões de habitantes, dos quais poco mais de 110 milhões são eleitores. Nenhum outro mandatário – exceto os generais da ditadura – alcançou a presidência de maneira tão infame como Michel Temer. Ele assume a cadeira presidencial, onde pretende se manter até o dia 31 de dezembro de 2018, graças a uma traição sedimentada por sua aliança com os derrotados nas quatro últimas eleições democráticas. Uma traição que só deu certo graças à ação imprescindível de um sócio incômodo, o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, símbolo mais luminoso de uma constelação de corruptos que agora gravita ao redor de um presidente que, apesar de ser consagrado pelo Senado, é e continuará sendo moralmente ilegítimo.
Toda a claridade que a era de governos de forte compromisso social está em risco. Transformado em presidente efetivo, Michel Temer pretende implantar uma política de terra arrasada, que levará ao retrocesso em matérias sociais e trabalhistas, o que até há alguns meses seria considerado impossível. Se tiver sucesso em impor metade das medidas já anunciadas – basta com a metade –, fará surgir no Brasil um cenário bastante tenebroso.
Nem em seus piores pesadelos, o país previu o que passará a viver a partir deste mês de setembro de 2016. O último dia do mês anterior será conhecido como o Dia Nacional da Infâmia, o Dia Nacional da alegria dos infames.
O que os brasileiros viram ao largo dos últimos cinco dias foi uma inútil batalha de um punhado de senadores (nem todos do PT de Dilma Rousseff, pois convêm recordar que dois dos mais combativos defensores do mandato da petista são integrante do mesmo PMDB do golpista Michel Temer) admitindo ter dúvidas sobre a existência dos crimes de responsabilidade usados como justificativa para destituir a presidenta, mas que ainda assim optaram por condená-la, por sua, segundo eles, má gestão. No Brasil, se vive – ou ao menos se supõe que se vive – um regime presidencialista. Impor uma medida típica do parlamentarismo não está previsto na Constituição. Isso se chama golpe institucional.
A trama vergonhosa contou ademais com a cumplicidade de funcionários públicos – um fiscal e um auditor do Tribunal de Contas da União – que falsificaram provas contra Dilma (ambos foram denunciados nas cortes superiores). Contou também com o poder de chantagem do então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha. Contou com a interferência ilegítima e ilegal do Ministério Público e com as ações politizadas de membros do Ministério Público, que defenderam ativamente a candidatura derrotada de Aécio Neves em 2014. Também com a obsessão persecutória de Sérgio Moro, um juiz provinciano de primeira instância, contra Lula e contra o PT. E finalmente, parte essencial da trama, contou com a força uníssona dos meios hegemônicos de comunicação.
A lista é imensa e repetitiva. No fundo, como bem recordou a senadora Regina Souza em seu pronunciamento, tudo não passou de uma batalha entre a Bolsa Família e a Bolsa de Valores. Como sempre, o vencedor já estava decidido desde antes.
Todavia, nem tudo serão rosas no caminho de Michel Temer: contra ele tramita, no Tribunal Superior Eleitoral, uma ação judicial que pede a impugnação do seu mandato. Foi proposta pelo PSDB, que agora é um dos seus principais sócios.
Originalmente, os derrotados denunciavam irregularidades nas contas de Dilma Rousseff e do seu candidato a vice. Destituída Dilma, Temer passa a ser o único réu na causa.
O agora presidente pediu que as contas de campanha fossem analisadas em separado. A legislação não permite essa manobra, afinal, ninguém votou somente por Temer.
A causa será decidida no começo de 2017. Juristas dizem que, se forem respeitadas as leis, são ínfimas as chances de que Michel Temer não seja condenado. Alguém acredita que se fará justiça?
Se perder o mandato conquistado através da farsa jurídica, Temer será sucedido por algum dos integrantes do Congresso, que será eleito por seus pares. A julgar pelo nível moral, intelectual e ético da atual legislatura, será como sepultar de uma vez o futuro da nação.
Tradução: Victor Farinelli
No final da tarde daquela terça (30/8), os aliados de Michel Temer diziam ter assegurados os 54 votos necessários para liquidar um mandato obtido graças aos 54 milhões 508 mil votos populares. Com a maioria do Senado a ser favor, e após um juízo político num processo que não comprovou crime de responsabilidade praticado por Dilma Rousseff, o antes vice-presidente Michel Temer assume a presidência de forma definitiva, e passa a ser a principal autoridade do país que abriga 206 milhões de habitantes, dos quais poco mais de 110 milhões são eleitores. Nenhum outro mandatário – exceto os generais da ditadura – alcançou a presidência de maneira tão infame como Michel Temer. Ele assume a cadeira presidencial, onde pretende se manter até o dia 31 de dezembro de 2018, graças a uma traição sedimentada por sua aliança com os derrotados nas quatro últimas eleições democráticas. Uma traição que só deu certo graças à ação imprescindível de um sócio incômodo, o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, símbolo mais luminoso de uma constelação de corruptos que agora gravita ao redor de um presidente que, apesar de ser consagrado pelo Senado, é e continuará sendo moralmente ilegítimo.
Toda a claridade que a era de governos de forte compromisso social está em risco. Transformado em presidente efetivo, Michel Temer pretende implantar uma política de terra arrasada, que levará ao retrocesso em matérias sociais e trabalhistas, o que até há alguns meses seria considerado impossível. Se tiver sucesso em impor metade das medidas já anunciadas – basta com a metade –, fará surgir no Brasil um cenário bastante tenebroso.
Nem em seus piores pesadelos, o país previu o que passará a viver a partir deste mês de setembro de 2016. O último dia do mês anterior será conhecido como o Dia Nacional da Infâmia, o Dia Nacional da alegria dos infames.
O que os brasileiros viram ao largo dos últimos cinco dias foi uma inútil batalha de um punhado de senadores (nem todos do PT de Dilma Rousseff, pois convêm recordar que dois dos mais combativos defensores do mandato da petista são integrante do mesmo PMDB do golpista Michel Temer) admitindo ter dúvidas sobre a existência dos crimes de responsabilidade usados como justificativa para destituir a presidenta, mas que ainda assim optaram por condená-la, por sua, segundo eles, má gestão. No Brasil, se vive – ou ao menos se supõe que se vive – um regime presidencialista. Impor uma medida típica do parlamentarismo não está previsto na Constituição. Isso se chama golpe institucional.
A trama vergonhosa contou ademais com a cumplicidade de funcionários públicos – um fiscal e um auditor do Tribunal de Contas da União – que falsificaram provas contra Dilma (ambos foram denunciados nas cortes superiores). Contou também com o poder de chantagem do então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha. Contou com a interferência ilegítima e ilegal do Ministério Público e com as ações politizadas de membros do Ministério Público, que defenderam ativamente a candidatura derrotada de Aécio Neves em 2014. Também com a obsessão persecutória de Sérgio Moro, um juiz provinciano de primeira instância, contra Lula e contra o PT. E finalmente, parte essencial da trama, contou com a força uníssona dos meios hegemônicos de comunicação.
A lista é imensa e repetitiva. No fundo, como bem recordou a senadora Regina Souza em seu pronunciamento, tudo não passou de uma batalha entre a Bolsa Família e a Bolsa de Valores. Como sempre, o vencedor já estava decidido desde antes.
Todavia, nem tudo serão rosas no caminho de Michel Temer: contra ele tramita, no Tribunal Superior Eleitoral, uma ação judicial que pede a impugnação do seu mandato. Foi proposta pelo PSDB, que agora é um dos seus principais sócios.
Originalmente, os derrotados denunciavam irregularidades nas contas de Dilma Rousseff e do seu candidato a vice. Destituída Dilma, Temer passa a ser o único réu na causa.
O agora presidente pediu que as contas de campanha fossem analisadas em separado. A legislação não permite essa manobra, afinal, ninguém votou somente por Temer.
A causa será decidida no começo de 2017. Juristas dizem que, se forem respeitadas as leis, são ínfimas as chances de que Michel Temer não seja condenado. Alguém acredita que se fará justiça?
Se perder o mandato conquistado através da farsa jurídica, Temer será sucedido por algum dos integrantes do Congresso, que será eleito por seus pares. A julgar pelo nível moral, intelectual e ético da atual legislatura, será como sepultar de uma vez o futuro da nação.
Tradução: Victor Farinelli
Créditos da foto: Valter Campanato / Agência Brasil
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