O Brasil entre
eleição direta ou um governo biônico do PSDB
Jeferson Miola
Os métodos para a perpetração dos golpes
de Estado de 1964 e de 2016 foram diferentes: em 1964, quartelada, tanques de
guerra e fuzis; em 2016, STF, PF, MP, mídia, Lava-Jato e Congresso – o golpe
jurídico-midiático-parlamentar.
Apesar dessa diferença de origem, a
evolução dos regimes de exceção nascidos de cada um desses golpes de Estado
assemelha-se notavelmente. É cada vez maior a similitude entre o regime de
exceção atual e o instaurado pela ditadura civil-militar que se adotou do país
por 21 anos, de 1964 a 1985.
O fascismo, por exemplo, é um componente
presente nos dois processos. O aparelhamento ideológico do Estado por
policiais, promotores, procuradores e juízes para a perseguição e aniquilamento
de adversários políticos, é prática verificável tanto na ditadura como hoje.
A corrupção é pretexto falso para
destruir Lula, a simbologia e o legado da maior liderança popular da história
do Brasil, da mesma maneira que em 1964 a corrupção foi um pretexto da
oligarquia canalha para incendiar o ambiente político e interromper o programa
de reformas populares do governo Jango.
A burguesia é atavicamente golpista;
conspira sempre que sente seus interesses ameaçados. Nesta que é a maior crise
do capitalismo mundial, tal como em 1964, não hesitou em perpetrar o golpe de
Estado com o impeachment fraudulento, para interromper a trajetória de
distribuição de renda e, à custa disso, salvaguardar privilégios e a taxa de
expansão do capital.
No dia 13 de dezembro de 1968, o ditador
Costa e Silva decretou, através do Ato Institucional nº 5, um estado de sítio
que durou 10 anos. O golpista Temer, tal como o general-ditador, e também em 13
de dezembro, com a aprovação da PEC 55 instaura o estado de sítio rentista,
programado para durar 20 anos.
A ditadura se empenhou em retardar ao
máximo a redemocratização do país. Na exata proporção em que perdia
popularidade e legitimidade, intervinha nos sindicatos e proibia partidos
políticos para esmagar a oposição ao regime. Ao mesmo tempo, com poder
ditatorial, nomeava prefeitos, governadores e, inclusive, senadores biônicos
[segundo o dicionário Houaiss, biônico é "aquele que recebe um mandato por
nomeação, sem ter sido eleito"].
A ditadura conseguiu esticar de 4 para 6
anos o mandato do último usurpador da Presidência da República, o general João
Figueiredo. E, finalmente, com apoio da Rede Globo, derrotou a campanha das Diretas
Já! e converteu o Congresso em colégio eleitoral para a eleição
indireta e ilegítima do primeiro sucessor civil depois de 21 anos de ditadura.
Iniciou-se, assim, a transição conservadora muito lenta, muito gradual e não só
segura, mas sobretudo controlada.
O bloco golpista atual enfrenta uma
grave crise para a continuidade do regime de exceção vigente. A primeira das 77
delações premiadas da Odebrecht teve um efeito arrasador para o governo
golpista; fez Temer derreter. O caos afeta não só o governo, mas toda a cúpula
golpista no Congresso.
É unânime na crônica política a
percepção de que Temer está inviabilizado; chegou ao fim da linha de
sobrevivência. Ele ainda se arrasta, porque está entregando às finanças
internacionais a PEC 55, a reforma da previdência e outros favores. Quando
terminar sua utilidade, será descartado. O PSDB, o principal representante do
rentismo no país, controla os aparelhos que suprem o oxigênio dum moribundo
Temer.
A oligarquia golpista, em vista disso,
está num tremendo impasse. A sucessão do Temer por eleição direta é um requisito
para evitar que o país caia no precipício. Mas esta alternativa representa um
risco para o regime, porque Lula, apesar da caçada desferida contra ele pelo
condomínio jurídico-midiático-policial, conserva chances reais de vencer o
pleito e interromper o golpe. Sintomaticamente, nos últimos dias os delegados
da polícia federal, procuradores e Moro passaram a fabricar novas acusações
delirantes contra ele.
Mesmo reconhecendo a ilegitimidade de um
Congresso que tem mais de 400 dos 594 parlamentares envolvidos em delitos e
crimes diversos, inclusive de tentativa de homicídio, a oligarquia golpista
poderá repetir a ditadura e eleger um presidente biônico para não colocar em
risco a continuidade do golpe.
O rechaço a qualquer fórmula que coloque
em risco o empreendimento golpista é o fator que unifica a classe dominante e
seus atores que intervém na arena política – MP, judiciário, polícia federal,
partidos da direita e mídia, em especial a Rede Globo.
A oligarquia golpista, sob a liderança
do PSDB, FHC, Aécio, Moro, Janot, Gilmar Mendes e bandalha, poderá tentar
eleger indiretamente um presidente biônico no Congresso para aprofundar o golpe
de Estado.
O Brasil se verá, portanto, confrontado
entre a democracia e a impostura; entre a nomeação ilegítima de um preposto do
PSDB ou a eleição de um presidente eleito pelo voto popular; entre um governo
legítimo e um governo biônico do PSDB; entre a escalada autoritária e a
restauração do Estado de Direito.
Somente um presidente eleito terá a
força moral, a legitimidade política e o apoio social indispensável para
retirar o Brasil da depressão econômica e evitar que o país caia no precipício.
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