PEC 55 É UM ABSURDO LÓGICO, DIZ MIGUEL
NICOLELIS
Cida de Oliveira
Neurocientista
brasileiro fez duras críticas à aprovação, pelo Congresso, da PEC que congela
por 20 anos os gastos públicos; "Um absurdo lógico e aritmético. Nem
precisa ser contador para saber o que significa passar 20 anos sem investir na
minha empresa, só pagando juros", disse Nicolelis, durante lançamento de
seu novo livro Made in Macaíba; "O pico de investimento em ciência e
tecnologia, em 2016, foi de 1,16% do PIB. Esse valor será congelado por 20
anos. E teremos mais de 47% do PIB para pagar juros. Isso ninguém
comenta", disse.
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O conservadorismo das políticas do
governo de Michel Temer (PMDB) - que avançam contra os direitos constitucionais
com o sinal verde do Congresso, aprovou a Emenda constitucional que congela por
20 anos investimentos federais em saúde, educação, ciência e tecnologia - foi
criticado pelo neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis. Em lançamento de seu
novo livro Made in Macaíba (Editora Planeta), na noite da segunda-feira (12),
ele afirmou que o país está "dando um tiro no pé coletivamente".
"Eu espero, sinceramente, que as pessoas despertem antes que seja tarde. E
já é quase tarde", alertou.
Um dos maiores cientistas da atualidade
em todo o mundo, Nicolelis é professor de Neurobiologia e Engenharia Biomédica
da Universidade Duke, na Carolina do Norte, Estados Unidos, há mais de 20 anos.
Fundador do Instituto Internacional de Neurociência de Natal Edmund e Lily
Safra. Graças às suas pesquisas com a interface cérebro-máquina, pessoas com
paralisia, incluídas no projeto Andar de
Novo, têm conseguido avanços. Dois anos após a demonstração do exoesqueleto
na abertura da Copa do Mundo do Brasil, no Itaquerão (Estádio do Corinthians,
em São Paulo), eles vão recuperando aos poucos os movimentos e a sensibilidade.
Falando para uma plateia que lotou o
auditório do Instituto Sedes Sapientiae, no bairro de Perdizes, na capital
paulista, ele não poupou ironias e críticas à PEC 55. "Um absurdo lógico e
aritmético. Nem precisa ser contador para saber o que significa passar 20 anos
sem investir na minha empresa, só pagando juros", disse, comparando a
situação do país a partir da emenda constitucional aprovada no Senado. "O
pico de investimento em ciência e tecnologia, em 2016, foi de 1,16% do PIB.
Esse valor será congelado por 20 anos. E teremos mais de 47% do PIB para pagar
juros. Isso ninguém comenta", disse.
Países avançados como a Suécia,
Finlândia e Noruega, conforme destacou, nunca deixaram de investir em setores
básicos em uma sociedade moderna.
"O celular, por exemplo, não surgiu
por acaso. É fruto de oito décadas de pesquisas, com investimentos estatais dos
Estados Unidos a partir da década de 1940, que geraram a Ciência da Computação.
Foram 80 anos investindo mais de 5% do PIB em pesquisa. E empresas como, a
Intel, a Apple, não existiriam. É assim que se fazem as descobertas."
Nicolelis criticou também as intenções
do governo de Michel Temer de alterar o marco regulatório que dá à Petrobras
exclusividade na operação de exploração do pré-sal previsto no Projeto de Lei
4.567, de José Serra (PSDB), e a venda, no final de julho, de mais da metade do
campo de Carcará para a estatal norueguesa Statoil.
"Ouço muita provocação nos Estados
Unidos de outros cientistas, que dizem: 'Vocês estão brincando que vão dar o
pré-sal pra gente'. Não é possível". Pelos seus cálculos, os poços já
descobertos pela Petrobras têm, no mínimo, 100 bilhões de barris. "A US$
70 o barril, são US$ 7 trilhões. Quem aqui que achasse um jardinzinho valendo
US$ 7 trilhões diria aos americanos: 'você quer?'. Isso por baixo, porque agora
o petróleo tende a subir, passando de US$ 100. Serão US$ 10 trilhões",
disse.
Ele conta que quando foi trabalhar nos
Estados Unidos, há mais de 20 anos, não era comum a presença de estudantes por
lá e o Brasil era piada. "Me perguntavam em que parte da Califórnia ficava
a Universidade de São Paulo que estudei", conta. "Há pouco tempo, o Ciência sem Fronteiras (programa criado
por Dilma Rousseff e praticamente extinto por Temer) mandava estudantes para
estudar no exterior. Dei muita aula na Harvard para 200 alunos, 39 deles
bolsistas brasileiros do Ciência sem
Fronteiras, uma das maiores emoções da minha vida", afirmou Nicolelis,
seguido por um ruidoso "Fora Temer" da plateia.
Apaixonado pelo Brasil, ele diz que só
foi conhecer seu próprio país nos Estados Unidos e pelo mundo afora. "Fui
descobrir depois de 20 anos de exílio. Depois que senti falta do feijão da
minha mãe, da música brasileira, dos meus familiares, do sol, e ao ouvir de
outros cientistas que eu venho de um lugar onde as pessoas acreditam no ser
humano, onde choram por um time de futebol. Num fórum em Berlim, um ganhador de
Prêmio Nobel já me disse: 'Miguel, o Brasil é a minha esperança. É o último
lugar do mundo onde há esperança de que a humanidade se salve, lá se sabe qual
o verdadeiro significado da vida'. Já ouvi isso, ou semelhante a isso, por
muitos anos, em muitos lugares, onde eu chegava e dizia ser brasileiro, eu era
tratado diferente."
Em Made
in Macaíba, Nicolelis conta a história da criação do Instituto Nacional de
Interfaces Cérebro-Máquina, o projeto Andar de Novo, o programa Cientistas do
Futuro e o Instituto de Ensino e Pesquisa Alberto Santos Dumont. Tudo isso no
âmbito do Campus do Cérebro do Instituto Internacional de Neurociências de
Natal Edmund e Lily Safra, no qual pretende usar a ciência de ponta como agente
de transformação social.
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