Kiko Nogueira
Embora Sergio Moro tente, cinicamente,
banalizar o depoimento de Lula, ele é um divisor de águas para a democracia
brasileira.
De imediato, há um componente absurdo e
autoritário no processo, mas emblemático do momento que vivemos: o juiz aparece
como contendor, não no papel que deveria ter num Estado de direito.
Acusado em cinco processos distintos de
receber propina e outras vantagens indevidas de construtoras, Lula chega para
um encontro com o principal agente de seu massacre diuturno, um soldado
aplicado das mesmas forças que deram o golpe.
Nunca foi um julgamento técnico.
O debate foi politizado e em Curitiba
estão em disputa dois projetos distintos para um país profunda e talvez
irremediavelmente dividido.
O Judiciário se tornou um partido e Moro
é seu líder. Dias antes do interrogatório, uma colega dada a compartilhar posts
do MBL e de sites de ultradireita mandou proibir manifestações.
Na terça, dia 9, um juiz que teve pedido
de afastamento por parcialidade na Operação Zelotes mandou fechar o Instituto
Lula, num despacho patético e recheado de erros de português.
Sergio Moro terá seu grande dia para
mostrar serviço para seus patrocinadores. Especialmente a Globo, que o sustenta
realmente — como sustentou, antes deles, o hoje esquecido Joaquim Barbosa, o
“menino pobre” que ia “salvar o Brasil”, na formulação idiota da Veja.
Vai ser sua chance de tentar reverter um
quadro de cansaço com sua cruzada moralista, inclusive nas hostes aliadas.
Gilmar Mendes, preocupado com seus
amigos tucanos, chamou os presos da Lava-Jato de “reféns” e vem denunciando o
apetite insaciável dos procuradores para aparecer.
Janot tentou dar o troco pedindo o
impedimento de Gilmar do caso Eike pelo fato da mulher de Gilmar Mendes advogar
para o empresário.
Acabou desmoralizado com a notícia de
que sua filha advoga para a OAS e chamado publicamente de “sicofanta” e
“irresponsável” pelo sócio de Guiomar Mendes.
(Ah, se a imprensa fizesse o dever de
casa e não fosse monomaníaca com o PT…)
O Estadão de hoje traz um editorial
dizendo que “não é tarefa da Lava-Jato denunciar as instituições ou promover um
movimento de repúdio aos poderes constituídos”.
Continua: “É perniciosa a tentativa de
transformar a Lava-Jato na grande panaceia nacional. Além de não tirar o País
da crise, esse modo de conduzi-la, como se tudo estivesse podre – como se os
poderes constituídos já não tivessem legitimidade para construir soluções –,
inviabiliza a saída da crise”.
Para que seu show continue, Moro
necessita de sua audiência — parte dela açulada no Facebook, com esmero, por
sua mulher Rosângela numa página das mais ridículas da história.
Lula levou sua torcida ao Paraná porque
é o que ele tem para combater um esquema francamente desfavorável num jogo cujo
árbitro quer sua eliminação.
Sequestrado pela fantasia de vingador
mascarado que ele passou a achar que era verdadeira, Moro dependerá de seu
desempenho para dar uma sobrevida ao monstro que inventou com a ajuda dos de
sempre.
Isso inclui, eventualmente, declarar a
prisão de Lula. Jogar o país no caos é um detalhe a mais num esquema que já nos
deixou à deriva.
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