O ‘cesarismo’ do governo nas mídias sociais produzirá mais estragos do que o veto a Ilona Szabó, como já foi o coprológico tuíte
A distância que separa a sociedade em que vivemos com relação àquele paradigma civilizatório é abissal. Percorrê-la não será uma linha reta, mas um caminho tortuoso, com avanços e retrocessos experimentais (tentativas e erros), só possíveis num regime democrático sem adjetivos. Este é o único sistema que assegura a transferência do poder em tempo certo e de forma pacífica, componente essencial da “civilização” buscada.
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A história é conduzida por “acidentes aleatórios” e suas consequências. É o nosso cérebro que, para pacificar-se, constrói narrativas que o organizam em relações de “causa” e “efeito”. Alguns cérebros peregrinos acabaram acreditando que o “futuro” está, necessariamente, escondido no passado. Logo, este, suficientemente torturado, o revelaria. Trata-se de uma crença extremamente perigosa: como acreditam ser senhores do futuro, conhecem o que e quem podem “descartar” agora porque não farão falta.
Assim “sabiam” Robespierre, Hitler, Mussolini, Stalin, Mao e outros menores, mas não menos convictos. Quando tiveram o poder, todos propuseram um radical recomeço (um renascer, uma palensigenia), através do qual, depois da necessária punição dos males presentes, a corrupção do passado se transformaria na virtude que traria a “salvação nacional”. Todos falharam miseravelmente. Primeiro, terminaram com a liberdade e geraram o terror pela delação. Depois, separaram-se numa “casta” que os afastou da “igualdade” que impuseram ao cidadão comum. Finalmente, estimularam a produção de canhões em lugar de manteiga para os cidadãos que mandaram morrer na guerra…
Toda essa pobre reflexão histórica é para sugerir que Bolsonaro está longe de ser o “efeito” necessário de uma “causa” eficiente: o desastre Dilma-PT e que, na minha opinião, não representa risco constitucional. É, apenas, mais um evento aleatório com o mesmo propósito de Lula-2003 (lembrem-se do “viemos para mudar tudo o que está aí!”), que terminou muito mal. A grande lição é que a troca de ideologia (PSDB, social-democrata (?) e PT, socialismo (?)) não levou a lugar nenhum. Da mesma forma, multiplicar a “ideologia do PT” por menos um, ao contrário do que propõe o setor mais obscurantista do governo Bolsonaro, não vai levar a lugar nenhum. Pode, entretanto, criar resistências desnecessárias contra o bom programa econômico apresentado pelo ministro Paulo Guedes, que dá ênfase simultânea: o aumento da produtividade microeconômica sustentada por uma boa política macroeconômica (equilíbrio fiscal e controle da inflação).
O governo precisa introjetar que velocidade e precipitação são coisas muito diferentes, que podem gerar muita confusão e consequências antagônicas. Precisa insistir e concentrar-se na sua maior prioridade: a reforma da Previdência necessária, mas não suficiente, para despertar o espírito que alimenta e precede o crescimento econômico. Precisa insistir, como tem feito, no seu absoluto respeito à Constituição de 1988. E, finalmente, abandonar o “cesarismo” das mídias sociais. Este vai produzir mais estragos do que o veto a Ilona Szabó, como já foi o coprológico tuíte que, surpreendentemente, enterrou os “bons costumes”!
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ESCRITO POR DELFIM NETTO
Formado pela USP, é professor de Economia, além de ter sido ministro e deputado federal.
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