quarta-feira, 25 de maio de 2016

New York Times: Governo interino brasileiro sob rajada de críticas

New York Times: Governo interino brasileiro sob rajada de críticas

Em gravação, Jucá diz que tem falado com ministros do STF e que a imprensa iria diminuir a pressão quando Rousseff fosse tirada do cargo.


Associated Press, no NY Times
Marcos Corrêa
RIO DE JANEIRO — O governo interino brasileiro se encontrou sob uma rajada de críticas na segunda-feira por causa da aparição de uma gravação secreta do novo ministro do planejamento discutindo sobre um pacto para fazer avançar o impeachment da presidente Dilma Rousseff para poder impedir uma importante investigação de corrupção que tem devorado grande parte da classe política do país.
 
Mesmo alguns aliados do presidente em exercício Michel Temer pediram a demissão ou renúncia do Ministro do Planejamento Romero Jucá, que também é Senador e está sendo investigado em um esquema multibilionário de propina na companhia de petróleo estatal Petrobras.  
 
Jucá, que parece estar na gravação planejando a remoção de Rousseff, inicialmente disse que continuaria no cargo mas horas depois anunciou que estava se licenciando.
 
Rousseff, a primeira presidente mulher do país, foi suspensa do cargo pelo Senado esse mês por ter, supostamente, usado manobras fiscais para esconder um enorme déficit no orçamento federal para aumentar o apoio ao seu governo. Ela tem dito repetidamente que não fez nada de errado.

 
“Isso mostra a verdadeira razão por trás do golpe contra a nossa democracia e o mandato da presidente Rousseff”, tuitou Ricardo Berzoini, ex-ministro de Relações Institucionais que perdeu seu posto quando Rousseff foi suspensa. “O objetivo deles é trancar a investigação da Petrobras, e varrer as investigações para debaixo do tapete.”
 
Temer, que era o vice-presidente, tomou o posto depois de se distanciar de Dilma e conseguir os votos no Congresso para sua suspensão. Ele continuará no poder enquanto o Senado conduz o julgamento.
 
O dia começou com uma transcrição publicada de uma conversa entre Jucá e Sergio Machado, ex-senador que até recentemente liderava outra companhia de petróleo estatal, a Transpetro.
 
Logo depois da publicação das transcrições pelo jornal Folha de São Paulo, Jucá convocou uma coletiva de imprensa e disse que seus comentários foram tirados de contexto. Ele disse que não estava acelerando o impeachment de Rousseff, mas sim notando que as coisas seriam diferentes com um novo governo, especialmente com a economia difícil do país.
 
Pela tarde, o jornal postou em seu site a conversa gravada em duas partes. Jucá nunca mencionou a economia.
 
A gravação claramente irá aprofundar a crise política no Brasil. Os simpatizantes de Rousseff e a própria presidente vêm dizendo a tempos que sua administração foi vítima de um golpe orquestrado pelos deputados da oposição, em grande parte para diluir a investigação na Petrobras.
 
Nos últimos dois anos, muitos integrantes da elite do país, desde deputados até empresários importantes, foram julgados e condenados à prisão em uma investigação tão grande que chocou até os brasileiros mais habituados com a corrupção na política.
 
A popularidade de Rousseff foi atingida por causa da investigação. Grande parte da dita corrupção aconteceu enquanto seu Partido dos Trabalhadores estava no poder nos últimos 13 anos, mesmo ela mesma nunca tendo sido implicada.
 
Embora ela tenha sido prejudicada politicamente pela investigação, Rousseff se recusou a fazer qualquer coisa que interviesse na investigação que ela disse ser necessária para o Brasil.
 
A gravação vazada foi de uma reunião em março na casa de Jucá, semanas antes de a votação da Câmara dos Deputados mandar o impeachment para o Senado. Como foi feita a gravação ainda não é claro.
 
Jucá reconheceu a conversa mas disse que não sabia que estava sendo gravado, a partir do momento que ele e Machado estavam sozinhos. O jornal não divulgou como a gravação foi obtida.
 
Na conversa, Jucá disse que queria manter o juiz Sergio Moro fora das investigações da Petrobras relacionadas a ele, a outros no círculo interno de Temer e ao presidente do Senado Renan Calheiros. Moro, o principal juíz da investigação, já movimentou-se contra pessoas que não possuem cargos eleitos ou posições de Gabinete. Somente o Supremo Tribunal Federal, a mais alta corte do país, pode decidir denunciar ou julgar deputados federais e membros do Gabinete.
 
Fora do governo, Machado foi visto como vulnerável, e, de acordo com comunicados da imprensa, esteve negociando um acordo de delação.
 
“Temos que resolver isso. Temos que mudar o governo para estancar a sangria”, disse Jucá na gravação, de acordo com o jornal.
 
Machado respondeu: “A solução mais fácil é botar o Michel”, Jucá concordou.
 
Jucá disse que tem falado com ministros do Supremo e ouviu que a imprensa e outras instituições iriam diminuir a pressão quando Rousseff fosse tirada do cargo.
 
Jucá também disse que figuras chaves da oposição à Rousseff, incluindo o candidato presidencial derrotado Aécio Neves e o novo ministro das Relações Exteriores, José Serra, estavam “todos na bandeja para serem comidos” pelas investigações.
 
Na coletiva de imprensa, Jucá disse que a “sangria” a qual ele se referiu tinha a ver com a economia brasileira, que ainda espera uma contração de 4% esse ano depois de um 2015 igualmente alarmante.
 
Juça também negou que estava tentando parar as investigações da Petrobras.
 
“Eu sempre defendi essas investigações”, ele disse, adicionando que não estava com medo de ser investigado. “Eu acho que está mudando a história do país.”
 
Algumas horas depois da coletiva de imprensa, Jucá disse que iria se licenciar.
 
“Eu não quero que essas manipulações prejudiquem essa nova administração”, disse aos repórteres em Brasília. Ele disse que Temer poderia decidir se o traria de volta quando estivesse limpo de irregularidades.
 
Alguns dos aliados de Temer foram rápidos em dizer que Jucá deveria ser demitido somente 12 dias após ter tomado posse.
 
“Com tudo isso, não é bom que ele fique”, disse o deputado Pauderney Avelino, aliado de Temer.
 
O jornal O Globo, crítico de Rousseff, publicou um editorial insistindo que o presidente interino demita Jucá.
 
O Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) de Temer, o maior no Congresso que não tem nenhuma ideologia em particular, esteve envolvido em vários escândalos.
 
“Isso não é uma surpresa porque é o que as pessoas esperam de uma administração comandada por esse partido”, disse Claudio Couto, professor de Ciência Política na Fundação Getúlio Vargas, universidade situada em São Paulo.
 


Créditos da foto: Marcos Corrêa
 
 
Fonte: Carta Maior

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