quinta-feira, 24 de novembro de 2016

"ESPERO QUE A CLASSE TRABALHADORA COMECE A SE MEXER"

"Espero que a classe trabalhadora comece a se mexer"
O site Brasil 247 entrevistou João Pedro Stédile dez dias depois do ataque à Escola Florestan Fernandes, do MST, quando a polícia civil de São Paulo fez um espetáculo típico de um regime de exceção que procura se consolidar, sem exibir mandado judicial e dando tiros para o alto. Aqui você pode ler a primeira parte da entrevista, onde Stédile define a invasão como "uma burrada espetacular da direita do governo Richa com a direita do governo Alckmin" e se define como "otimista. Haverá luta e mobilização. Quando luta, a classe trabalhadora aprende em vinte dias o que deixou de aprender em vinte anos."

247 – É claro que a invasão da Escola Florestan Fernandes não foi o primeiro ataque sofrido pelo MST ao longo de sua história. Tampouco foi o mais violento. Mas como podemos interpretar esse ataque, numa conjuntura atual?

STÉDILE – O ataque da policia civil à Escola Nacional Florestan Fernandes, foi uma burrada espetacular da articulação da direita do governo Richa com a direita do governo Alckmin, e cometeram uma série de atropelos legais, tentando buscar dois militantes do MST do Paraná, que estariam na Escola, sem nenhum mandado judicial.   Mais do que o fato real, do abuso de autoridade, da prepotência das armas empregadas, revela como as forças conservadoras se sentem livres, agora, para cometerem todo tipo de atropelos ilegais, durante o governo golpista, que também é ilegal.

 247 – Vivemos uma conjuntura que pode avançar para a consolidação de um estado de exceção, isto é, uma nova ditadura. Você vê uma saída para evitar isso? Um acordo, uma transição?

STÉDILE – De fato, já vivemos um estado de exceção por várias circunstâncias, que começam na posse de um governo ilegítimo, que impôs um processo de impeachment sem que houvesse crime de responsabilidade.  O acompanhamento do STF e a votação do Senado não dão nenhuma legitimidade.  Ao contrário, eles mesmos não tiveram coragem de tirar os direitos políticos da presidenta. O próprio impostor Michel Temer, revelou aos empresários americanos em Nova York o motivo do golpe, retomar um plano neoliberal para sair da crise econômica. Por outro lado, todos os dias assistimos o estado de exceção nos atos do STF, que rasga a Constituição ao decretar prisão em segunda instância, e ao negar direitos trabalhistas.  Sem falar nas atitudes dos atores da autodenominada “República de Curitiba”, que se comportam assim, como uma republiqueta, acima da Constituição brasileira.  E isso é muito grave.

247 – A ideia de que a recuperação das lutas populares passa por uma frente de esquerda é uma dessas propostas que está na boca de todo mundo. Parece reforma política, reforma tributária: todo mundo acha que sabe o que é, mas ninguém explica como se faz. Qual sua opinião a respeito?

STÉDILE – Como você disse, não é difícil ter propostas, o problema é ter força popular para construí-las.    Do ponto de vista político, só recuperaremos um Estado Democrático com a realização de uma profunda reforma política, que devolva ao cidadão o poder político pelo voto, hoje foi sequestrado pela mídia e pela força do dinheiro.   Como o atual congresso também foi eleito pela força da mídia e do dinheiro, somente a eleição de uma Assembleia Constituinte, soberana e exclusiva poderia corrigir. Por outro lado, precisamos ampliar ao máximo o debate na sociedade da necessidade de um novo programa que consiga enfrentar a crise econômica e social, que resolva os graves problemas da população que viriam, com uma reforma tributária, controle do pagamento dos juros da dívida interna, reforma democrática dos meios de comunicação e a retomada do crescimento com investimentos na indústria nacional e na agricultura familiar. Porém, tudo isso só será possível, se antes  houver uma retomada das lutas de massa, e com isso a classe trabalhadora retomar seu papel na luta de classes,  realizando grandes mobilização de massas, para mudar os rumos do país, como aconteceu na década de 60, e depois na década de  80.

247 – Numa hora difícil como a atual, é sempre bom recordar que a história nunca termina. Você espera uma retomada dessa luta para breve?

STÉDILE – O plano neoliberal do governo golpista é um plano contra a classe trabalhadora, porque os capitalistas querem sair da crise jogando o peso dela apenas nas costas dos trabalhadores.  E para isso estão sendo até didáticos.  Precisam aumentar a exploração dos trabalhadores, diminuir salários, aumentar o desemprego, como forma de derrotar politicamente a classe, e tirar direitos trabalhistas históricos, que estão na CLT e na Constituição.  Por outro lado, precisam se apoderar dos recursos públicos que antes iam para Educação e Saúde.  Está aí a PEC 241 que virou 55 no senado, justamente para isso.  E precisam se apoderar de recursos naturais, para se apropriarem da renda extraordinária que eles geram.  Daí a privatização do pré-sal, o código de mineração, a venda de terras para o capital estrangeiro. E o último ponto do programa deles é realinhamento de nossa economia de forma subordinada aos interesses dos capitalistas estadunidenses. O problema e a contradição deles - e isso nos ajuda - é que esse plano é contra o povo, e portanto vai aumentar os problemas.  E não vai tirar a economia da crise. Assim, espero que a classe trabalhadora comece a se mexer logo.  Acho que algumas categorias mais organizadas, já começam reagir, como os petroleiros, professores etc. É outro sinal positivo, é a mobilização da juventude com o movimento de ocupação das escolas.  Embora, eles não afetem o capital, e os golpistas diretamente, mas nos ajudam a conscientizar a população.  Todos os pais desses jovens estão participando dos debates e precisam autorizar os filhos a ficarem nas escolas.  A juventude, em todos os processos históricos de mudanças, representa o termômetro da sociedade, o indicativo de que haverá luta, haverá mobilização. Sou um otimista. Sigo o filosofo russo, que dizia, que o povo quando luta, apreende em vinte dias o que deixou de apreender em vinte anos.


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