Investida contra a máfia da gasolina e a implementação de novos programas sociais marcam até agora a gestão de López Obrador
Em geral, três meses é o prazo de misericórdia durante o qual os chefes de Estado costumam receber boas cotações da opinião pública. A essa altura, no entanto, os antecessores de Obrador já haviam deixado suas marcas. O conservador Felipe Calderón (2006-2012) declarou guerra ao narcotráfico; Enrique Peña Nieto (2012-2018), do Partido Revolucionário Institucional (PRI), alcançou, juntamente com a oposição, reformas constitucionais como a abertura do setor petrolífero e uma reforma do ensino.
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López Obrador, por sua vez, brilha sobretudo na comunicação, comenta a jornalista Ivonne Melgar. “Ele é eloquente e tem um aparato de propaganda potente, que faz uso das redes sociais. López Obrador desvaloriza tudo o que aconteceu no México nos últimos 30 anos, e essa visão preto-ou-branco funciona com a base eleitoral dele.”
Em sua coletiva de imprensa matinal, o presidente determina a ordem do dia. Quando o leitor abre o jornal e lê a análise da véspera, López Obrador já estabeleceu novos pontos de destaque. Uma temática sucede a outra: o afluxo de migrantes na ilha Yucatán é suplantado por um debate sobre os abrigos para mulheres, seguido pela nova configuração do Supremo Tribunal.
O que fica para o povo são quesitos simbólicos, como o fim da aposentadoria dos ex-presidentes ou programas sociais – bolsas de estudo para estagiários, seguro social a empregados domésticos ou a aposentadoria mínima universal de cerca de 60 euros a partir dos 68 anos deixam a base aplacada.
Máfia da gasolina
Muitos também admiram o vigor com que o chefe de Estado investe contra a máfia da gasolina, o que lhe custou a primeira ameaça de morte. Para combater a organização que controla mais de um terço da produção da Pemex, demitiu funcionários corruptos e colocou as instalações da petrolífera estatal sob proteção militar, poupando, alega, até 2,5 bilhões de dólares.
O que passa praticamente ao largo da opinião pública, entretanto, é que agora o petróleo não é mais transportado em gasodutos através do México, mas sim em caminhões-tanques, causando gargalos de abastecimento no início de 2019, e que esses contratos são distribuídos diretamente, em vez de por edital.
É justamente isso que deixa os especialistas apreensivos. Um estudo da ONG México Evalúa mostrou que do novo orçamento foram cortados 31 programas sociais para grupos étnicos ameaçados, sendo substituídos por 20 outros diretamente subordinados a López Obrador, dos quais 19 funcionam sem regras definidas, compondo-se basicamente de subsídios diretos.
“Isso serve à prosperidade ou simplesmente cria uma nova clientela política?”, pergunta a diretora da ONG, Edna Jaime, no jornal El Financiero. O Centro Mexicano de Direito Ambiental (Cemda), por sua vez, lamenta os cortes orçamentários de 32% no Ministério do Meio Ambiente.
Política de segurança
Homicídios e violência seguem na ordem do dia do combate à máfia das drogas. Desde a posse do novo presidente, foram assassinados cinco jornalistas. Pouco se vê da prometida política de segurança, critica Catalina Pérez Correa, do think tank mexicano Cide.
A recém-criada Guarda Nacional para combater a criminalidade realmente não está subordinada aos militares, como originalmente planejado, “mas ainda assim o comando cabe às Forças Armadas, que seguem monitorando as comunicações e podem investigar os crimes”, aponta Pérez Correa. “Isso é dar carta branca para um Exército que há cinco anos deixou de prestar conta pelos civis que assassinou.”
Ela também assinala retrocessos em relação ao Estado de direito: “nem os candidatos ao a ser preenchido posto no Supremo Tribunal, nem o novo procurador geral são independentes, e sim próximos a López Obrador”. Desse modo, a luta que a sociedade civil há anos trava por mais transparência e independência constitucional está perdida, no momento, e o presidente declarou guerra à sociedade civil.
A jornalista Melgar detecta uma estratégia política por traz do controle da Justiça: “Num sistema tão corrupto como o do México, na verdade quase todo mundo é passível de chantagem. Assim, a impunidade serve como incentivo para políticos e empresários se submeterem à vontade do presidente.”
Insegurança e nervosismo
Em relação à dinâmica econômica, se, por um lado, segundo as enquetes, há muito tempo os mexicanos não se mostravam tão confiantes, por outro os empresários e agências de classificação de risco estão bastante céticos. Dos 4% de crescimento prometidos pelo presidente Obrador, menos de 2% são realistas, segundo as instituições bancárias.
“Eu vejo, acima de tudo, insegurança e nervosismo”, diz Gabriela Siller, economista-chefe do grupo financeiro Banco Base. Por um lado isso de deve à falta de clareza sobre como se desenvolverá o protecionismo do principal parceiro comercial do México, os Estados Unidos, mas também ao próprio presidente.
“Ele quer construir refinarias, embora isso faça bem menos sentido econômico do que investir em produção e exploração, onde a margem de lucro é maior”, critica Siller. “Não está claro de que se compõe o modelo econômico dele, e por isso os investidores se retraem.”
O economista Luis Rubio atribui a motivos psicológicos o fato de diferirem tanto as avaliações do eleitorado e dos economistas. “Um laço quase religioso liga os eleitores ao presidente, enquanto os especialistas tentam interpretar o irracional de forma racional”, escreve no jornal Reforma.
Por um certo tempo será possível manipular as expectativas sociais, por exemplo, inventando bodes expiatórios, “mas no fim das contas o que conta é se o padrão de vida vai melhorar”, ressalva Rubio. “Subvenções podem mascarar isso durante um tempo, mas no longo prazo elas não são solução, pois para tal simplesmente não há dinheiro suficiente.”
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ESCRITO POR DEUTSCHE WELLE
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