terça-feira, 27 de dezembro de 2016

O SILÊNCIO DAS PANELAS

O silêncio das panelas
Sebastião Costa*

Em todos os tempos, sempre que se pretendeu avaliar o desempenho de qualquer governo, em qualquer país, foi naturalmente inevitável se falar na evolução da economia, no perfil da política externa, e essencialmente no continente latino americano, na performance das políticas sociais.

Mas, no Brasil atual, os cidadãos que bateram muita panela foram induzidos/conduzidos a enxergar durante alguns anos só e somente só, as questões éticas. De repente todo o noticiário político da imprensa tupiniquim concentrou todos os holofotes nos delitos e desvios éticos, promovendo intolerância e sentimentos de rancor e ódio, que anestesiaram sensibilidade social, trucidaram senso de justiça, extirparam a consciência democrática de muitos brasileiros.

De mãos dadas, intolerância e sentimentos tangeram muitos brasileiros inteligentes para as ruas, convictos de que estavam gritando pela ética na política. Das sacadas dos apartamentos chiques, o barulho revoltado das panelas, na consciência de que estavam erradicando a corrupção no país.

E no êxtase da euforia inebriante, não perceberam que os muitos gritos, panelas e buzinas estavam comemorando a queda de uma presidente sem crime de responsabilidade.

Passado o carnaval golpista, veio a ressaca da Quarta-feira de Cinzas, montada numa realidade corruptiva, entranhada nas profundezas de um governo com rumo e diretrizes estabelecidos por interesses, sem qualquer harmonia com as ansiedades e necessidades do povo brasileiro.
Embriagados pelo oba-oba do fervor cívico, os paneleiros nunca se incomodaram com as arbitrariedades criminosas do super-juíz, muito menos com as tendenciosidades sem rédeas do Procurador Geral da República, que investiga vazamentos só de um lado, configurando, sem qualquer inibição, a miopia seletiva da justiça. Não sentiram sequer o odor fétido exalado das delações odebrechtianas, que expuseram os porões infectos de um governo que já nasceu corrupto.

Recentemente, em pronunciamento conjunto com o presidente do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara federal, Rodrigo Maia, o presidente Michel Temer falou com insistência em medidas de combate à corrupção. Os dois parlamentares, como se sabe, carregam nas costas graves denúncias de desvios éticos e o presidente, além de constar nos esgotos da Odebrecht., é auxiliado pelos ministros, “Velhinho” e “Angorá” e apoiado pelos partidos de “Gripado", "Caju" e "Mineirinho".

A grande curiosidade é que, durante todo o pronunciamento, em pleno domingo, não se enxergou nas ruas brasileiras um único resíduo daquele fervor cívico, nem se ouviu um mísero tilintar de panelas.

* Médico pneumologista


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