terça-feira, 5 de dezembro de 2017

MENSAGEM DO PAPA FRANCISCO SOBRE O TRABALHO Os golpistas "brasileiros" fazem o oposto das recomendações do Papa

MENSAGEM DO PAPA FRANCISCO SOBRE O TRABALHO

Venerável Irmão
Senhor Cardeal Peter K. A. Turkson
Prefeito do Dicastério para o Desenvolvimento Humano Integral

"Não queremos um sistema de desenvolvimento econômico que fomente gente desempregada, nem sem teto, nem sem terra",

“Espero que este Congresso produza sinergia suficiente para propor linhas de ação concretas do ponto de vista dos trabalhadores, caminhos que nos conduzam a um desenvolvimento humano integral, sustentável e solidário”.

O trabalho condiciona o desenvolvimento não só econômico, mas também cultural e moral, das pessoas, da família, da sociedade.

Nestes dias, os representantes de várias organizações sindicais e movimentos de trabalhadores se reuniram em Roma, convocados pelo Dicastério para o Serviço Humano Integral, para refletir e debater o tema “Da Populorum Progressio à Laudato Si’. O trabalho e o movimento dos trabalhadores no centro do desenvolvimento humano integral, sustentável e solidário”. Agradeço à Sua Eminência e aos colaboradores, e saúdo com carinho todos vocês.
 O beato Paulo VI, em sua encíclica Populorum Progressio, disse que “o desenvolvimento humano não se reduz a um simples crescimento econômico. Para ser autêntico, deve ser integral”, isto é, promover toda a integridade da pessoa, e também todas as pessoas e povos. E como “a pessoa floresce no trabalho”, a Doutrina Social da Igreja enfatizou, repetidas vezes, que esta não é uma questão entre tantas outras, mas a “chave essencial” de toda a questão social. Com efeito, o trabalho “condiciona o desenvolvimento não só econômico, mas também cultural e moral, das pessoas, da família, da sociedade”.

Como base no florescimento humano, o trabalho é chave para o desenvolvimento espiritual. Segundo a tradição cristã, este é mais do que um simples labor; é, acima de tudo, uma missão. Colaboramos com a obra criadora de Deus, quando, por meio de nossas ações, cultivamos e protegemos a criação; participamos, no Espírito de Jesus, de sua missão redentora, quando, mediante a nossa atividade, alimentamos as nossas famílias e atendemos às necessidades do nosso próximo. Jesus, que “dedicou a maior parte de sua vida na terra à atividade manual junto de um banco de carpinteiro” e dedicou seu ministério público a libertar as pessoas da doença, do sofrimento e da própria morte, convida-nos a seguir seus passos através do trabalho. Desta forma, “cada trabalhador é a mão de Cristo que continua a criar e a fazer o bem”.

O trabalho, além de ser essencial para o florescimento da pessoa, também é a chave para o desenvolvimento social. “Trabalhar com os outros e para os outros”, e o fruto deste trabalho “é uma ocasião de intercâmbio, de relações e de encontro”. Todos os dias, milhões de pessoas cooperam para o desenvolvimento através de suas atividades manuais ou intelectuais, em grandes cidades ou em áreas rurais, com tarefas sofisticadas ou simples. Todas são expressão de um amor concreto para a promoção do bem comum, de um amor civil.

O trabalho não pode ser considerado uma mercadoria ou um mero instrumento na cadeia produtiva de bens e serviços, mas que, por ser primordial para o desenvolvimento, tem preferência em relação a qualquer outro fator de produção, incluindo o capital. Daí o imperativo ético de “preservar as fontes de trabalho”, para criar novas à medida que a rentabilidade econômica cresce, bem como para garantir a dignidade do mesmo.

No entanto, como advertiu Paulo VI, não devemos exagerar a mística do trabalho. A pessoa “não é só trabalho”; existem outras necessidades humanas que precisamos cultivar e atender, como a família, os amigos e o descanso. É importante, pois, lembrar que qualquer tarefa deve estar a serviço da pessoa e não a pessoa a serviço desta, o que implica que devemos questionar as estruturas que prejudicam ou exploram pessoas, famílias, sociedades ou a nossa mãe Terra.

O desenvolvimento econômico para ser sustentável, precisa colocar a pessoa e o trabalho no centro do desenvolvimento, mas integrando o problema do trabalho com o ambiental. Tudo está interligado, e devemos responder de forma integral.

Quando o modelo de desenvolvimento econômico se baseia apenas no aspecto material da pessoa, ou quando beneficia apenas alguns, ou quando prejudica o meio ambiente, gera um clamor, tanto dos pobres como da terra, que “reclama de nós outro rumo”. Este rumo, para ser sustentável, precisa colocar a pessoa e o trabalho no centro do desenvolvimento, mas integrando o problema do trabalho com o ambiental. Tudo está interligado, e devemos responder de forma integral.
Uma contribuição válida para esta resposta integral por parte dos trabalhadores é mostrar ao mundo o que vocês bem conhecem: a conexão entre os três “T”: terra, teto e trabalho. Não queremos um sistema de desenvolvimento econômico que fomente gente desempregada, nem sem teto, nem sem terra. Os frutos da terra e do trabalho são para todos, e “eles devem chegar a todos de maneira justa”. Esta questão adquire especial relevância em relação à propriedade da terra, tanto nas áreas rurais como urbanas, e às normas jurídicas que garantem o acesso à mesma. E neste assunto, o critério da justiça por excelência é o destino universal dos bens, cujo “direito universal ao seu uso” é “o princípio fundamental de toda a ordem ético-social”.

É imperativo passar da indústria energética atual para uma mais renovável para cuidar da nossa mãe Terra. Mas é injusto que esta transferência seja paga com o trabalho e o teto dos mais necessitados.

É pertinente recordar isso hoje, quando celebraremos em breve o septuagésimo aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, e também quando os direitos econômicos, sociais e culturais devem ser percebidos com maior força. Mas a promoção e a defesa de tais direitos não podem ser realizadas à custa da Terra e das gerações futuras. A interdependência entre o trabalho e o meio ambiente nos obriga a repensar o tipo de tarefas que queremos promover no futuro e as que precisam ser substituídas ou transferidas, como, por exemplo, as atividades da indústria de combustíveis fósseis poluentes. É imperativo passar da indústria energética atual para uma mais renovável para cuidar da nossa mãe Terra. Mas é injusto que esta transferência seja paga com o trabalho e o teto dos mais necessitados. Ou seja, o custo da extração de energia da terra, um bem comum universal, não pode recair sobre os trabalhadores e suas famílias. Os sindicatos e movimentos, que conhecem a relação entre trabalho, teto e terra, têm a obrigação de contribuir a este respeito.

Outra contribuição importante dos trabalhadores para o desenvolvimento sustentável é destacar outra tríplice ligação, um segundo conjunto de três “T”: desta vez entre trabalho, tempo e tecnologia. Em termos de tempo, sabemos que a “aceleração contínua das mudanças” e a “intensificação de ritmos de vida e de trabalho”, que alguns chamam de “rapidación”, não contribuem para o desenvolvimento sustentável, nem para a qualidade do mesmo. Sabemos também que a tecnologia, da qual recebemos tantos benefícios e oportunidades, pode dificultar o desenvolvimento sustentável quando está associada a um paradigma de poder, dominação e manipulação.

Hoje não é apenas a dignidade do empregado que está em jogo, mas a dignidade do trabalho de todos, e da casa de todos, a nossa mãe Terra.

No contexto atual, conhecido como a Quarta Revolução Industrial, caracterizado por esta “rapidación” e a refinada tecnologia digital, a robótica e a inteligência artificial, o mundo necessita de vozes como a de vocês. São os trabalhadores que, em sua luta por uma jornada de trabalho justa, aprenderam a enfrentar uma mentalidade utilitarista, de curto prazo e manipuladora. Para essa mentalidade, não importa se há degradação social ou ambiental; não importa o que é usado e o que é descartado; não importa se há trabalho forçado de crianças ou se o rio de uma cidade é poluído. Importam apenas os ganhos imediatos. Tudo é justificado em função do deus dinheiro. Dado que muitos de vocês contribuíram para combater esta patologia no passado, encontram-se agora numa posição privilegiada para corrigi-la no futuro. Peço-lhes que abordem este difícil tema e que nos mostrem, a partir de sua missão profética e criadora, que uma cultura do encontro e do cuidado é possível. Hoje não é apenas a dignidade do empregado que está em jogo, mas a dignidade do trabalho de todos, e da casa de todos, a nossa mãe Terra.

Por esta razão, e como afirmei na encíclica Laudato Si, temos necessidade de um diálogo sincero e profundo para redefinir a ideia de trabalho e o rumo do desenvolvimento. Mas não podemos ser ingênuos e pensar que o diálogo se dará naturalmente e sem conflitos. Precisamos de agentes que trabalhem incansavelmente para gerar processos de diálogo em todos os níveis: ao nível da empresa, do sindicato, do movimento; ao nível dos bairros, da cidade, regional, nacional e mundial. Neste diálogo sobre o desenvolvimento, todas as vozes e visões são necessárias, mas especialmente as vozes menos ouvidas, das periferias. Conheço o afã de muitas pessoas para trazer essas vozes à luz nos fóruns onde são tomadas as decisões sobre o trabalho. Peço-lhes que se juntem a esta nobre tarefa.

Uma contribuição importante dos trabalhadores para o desenvolvimento sustentável é destacar outra tríplice ligação, um segundo conjunto de três “T”: desta vez entre trabalho, tempo e tecnologia.

A experiência nos diz que, para que um diálogo seja frutuoso, é necessário partir do que temos em comum. Para dialogar sobre o desenvolvimento, é conveniente recordar o que nos une: nossa origem, pertença e destino. Com base nisso, podemos renovar a solidariedade universal de todos os povos, incluindo a solidariedade com os povos do futuro. Além disso, poderemos encontrar modos de sair de uma economia de mercado e de finanças, que não dá ao trabalho o devido valor e orientá-la para aquela em que a atividade humana é o centro.

Os sindicatos e os movimentos de trabalhadores por vocação devem ser especialistas em solidariedade. Mas para contribuir para o desenvolvimento solidário, peço-lhes que cuidem de três tentações.

A primeira, a do individualismo coletivista, isto é, proteger apenas os interesses de seus representantes, ignorando o resto dos pobres, marginalizados e excluídos do sistema. É necessário investir em uma solidariedade que ultrapasse os muros de suas associações, que proteja os direitos dos trabalhadores, mas, de modo especial, aqueles cujos direitos nem sequer são reconhecidos. Sindicato é uma palavra bonita que vem do grego dikein (fazer justiça) e syn (juntos). Por favor, façam justiça juntos, mas em solidariedade com todos os marginalizados.

Meu segundo pedido é que se cuidem do câncer social da corrupção. Assim como, em determinadas situações, “a política é responsável pelo seu próprio descrédito, graças à corrupção”, o mesmo se aplica aos sindicatos. É terrível essa corrupção daqueles que se dizem “sindicalistas”, que se põem de acordo com os empreendedores e não se interessam pelos trabalhadores, deixando milhares de companheiros sem trabalho; isto é um flagelo que mina as relações e destrói tantas vidas e famílias. Não deixem que os interesses espúrios arruínem a sua missão, tão necessária nos tempos atuais. O mundo e a criação inteira esperam com esperança para serem libertados da corrupção. Sejam fatores de solidariedade e esperança para todos. Não se deixem corromper!

Uma contribuição válida para esta resposta integral por parte dos trabalhadores é mostrar ao mundo o que vocês bem conhecem: a conexão entre os três “T”: terra, teto e trabalho.

O terceiro pedido é que não se esqueçam do seu papel de educar consciências em solidariedade, respeito e cuidado. A consciência da crise do trabalho e da ecologia precisa ser traduzida em novos hábitos e políticas públicas. Para criar tais hábitos e leis, precisamos que instituições como as de vocês cultivem virtudes sociais que facilitem o florescimento de uma nova solidariedade global, que nos permita escapar do individualismo e do consumismo e que nos motivem a questionar os mitos de um progresso material indefinido e de um mercado sem regras justas.

Espero que este Congresso produza sinergia suficiente para propor linhas de ação concretas do ponto de vista dos trabalhadores, caminhos que nos conduzam a um desenvolvimento humano integral, sustentável e solidário.

Agradeço novamente a você, senhor Cardeal, como também àqueles que participaram e contribuíram, e a todos eu dou a minha bênção.

Vaticano, 23 de novembro de 2017.



Papa Francisco

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