quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Petrobras satisfaz o paladar francês

16/11/2016 09:54 - Copyleft

Petrobras satisfaz o paladar francês

O pré-sal brasileiro despertou o apetite das majors internacionais como a francesa Total.


Leneide Duarte-Plon, de Paris*
reprodução
« Enquanto nossa maior empresa vai sendo desmontada, esquartejada, descaracterizada estrategicamente, as mentiras sobre ela vão se acumulando », escreveu recentemente o jornalista Mauro Santayana.
 
É curioso ver como a abertura da exploração do petróleo às empresas estrangeiras, que entrega parte do patrimônio da nação às multinacionais é noticiada pela imprensa francesa como quase uma evidência. 
 
Nenhuma consideração sobre a exploração midiática e judiciária por meses do « escândalo da Petrobras » para fazer o povo brasileiro engolir a pílula amarga da desnacionalização do setor do petróleo.
 
O fim da reportagem de página inteira do « Le Monde » de 12 de novembro intitulada « O doloroso renascimento da Petrobras » acompanha o tom geral do texto : 





 
« A desgraça da Petrobras, provocada pelo escândalo de corrupção e pela queda brutal do preço do barril obriga hoje o Brasil a atenuar seu « nacionalismo petrolífero ».
 
O « Le Monde » pensa que o Brasil foi « obrigado » a jogar na lixeira a proteção das empresas nacionais que, a rigor, pertencem ao povo brasileiro ? Qual país sensato diante de uma crise de corrupção vende as « jóias da coroa » ?
 
Como uma concessão ao bom jornalismo, a correspondente do jornal francês de referência, Claire Gatinois, ouviu José Maria Rangel, membro do Sindicato da Federação Única dos Trabalhadores do Petróleo « que sonha ver a Petrobras como a grande empresa que conheceu ». O sindicalista pensa que « essa história de corrupção serve apenas para satisfazer uma política neoliberal de abertura do petróleo brasileiro aos capitais estrangeiros ». 
 
O subtítulo da mesma matéria dava o tom de júbilo que a França - como outros países interessados no petróleo do pré-sal - não consegue esconder. « Sob os efeitos de uma profunda reestruturação, a ação ganhou 150% desde janeiro. »
 
Essa informação, que mostra que as ações sobem desde o início do ano, vem ecoar um trecho do mesmo artigo de Santayana :
 
« Uma estratégia deliberada de sabotagem da credibilidade da empresa, para derrubar o governo anterior e levar as suas ações ao chão, para que grandes investidores privilegiados, como George Soros, por exemplo, e acionistas estrangeiros que nunca acreditaram em sua quebra e no catastrofismo fascista fizessem extraordinárias fortunas, em poucos meses, como aconteceu este ano, enquanto otários tupiniquins pseudoconservadores e midiotizados se desfaziam de suas ações, metendo o pau na empresa, nas redes sociais, a R$ 5, quando elas estão valendo hoje quase R$ 20 ».
 
Les Échos
 
O jornal de economia « Les Échos » - que pertence ao bilionário Bernard Arnauld – noticiou há alguns dias com indisfarçável júbilo a abertura do mercado brasileiro de petróleo às companhias estrangeiras.  Ele explicava que a lei recém-votada já não exige uma participação mínima de 30% da Petrobras na exploração dos poços do pré-sal.
 
A decisão foi definida pelo « Les Échos » como « histórica ». O especialista em energia Denis Florin, criador da consultora Lavoisier Conseil, estima que essa lei « marca uma verdadeira ruptura, uma derrota para os defensores do nacionalismo na exploração do petróleo ».
 
O jornal de economia informa que a nova lei foi objeto de grande debate e de oposição. « Recusando-se a deixar que recursos vitais do país passem sob controle estrangeiro, deputados do Partido dos Trabalhadores se opuseram vigorosamente. A lei adotada pelo presidente Lula em 2010 determinava que a empresa Petrobras deveria possuir pelo menos 30% das reservas do pré-sal e ser ela mesma a exploradora. Mas a situação econômica do país, submerso por seu déficit orçamentário falou mais alto ». 
 
De novo, a entrega do petróleo brasileiro é mostrada como uma fatalidade. 
 
Nenhuma palavra sobre a luta política e o contexto de tomada de poder por grupos políticos que defendem interesses das seis irmãs que exploram majoritariamente o petróleo do planeta. 
 
A empresa francesa de petróleo Total faz parte das seis maiores do setor _ com ExxonMobil, Shell, Chevron, BP e ConocoPhillips. Obviamente, o capitalismo francês está exultante. Total detém 20% do campo gigante de Libra e informou seu investidores que a produtividade dos primeiros poços explorados na região era « excelente ».
 
Em matéria de 24 de novembro do « Les Echos » intitulava : « Os dois gigantes, o brasileiro e o francês, querem acentuar a cooperação ». A associação foi saudada como uma « aliança estratégica » pelo presidente da Total, Patrick Pouyanné.  
 
Total e Petrobras já são associadas em 15 consórcios, 9 no Brasil e 6 no resto do mundo, no golfo do México, Nigéria e Bolívia. 
 
Milton Costa, secretário-geral do lobby Brazilian Petroleum Institute, deu ao jornal francês uma informação contestada por alguns analistas brasileiros: « De nenhuma forma, a Petrobras tem os meios de satisfazer sozinha as necessidades do pré-sal ».
 
Descoberto em 2007, o pré-sal representa cerca de 100 bilhões de barris. « As majors internacionais trarão sua capacidade de gerar grandes projetos complexos », diz o consultor francês Denis Florin.
 
E trarão, sobretudo, muito apetite nos monumentais lucros que o pré-sal brasileiro representa.
 
Os dois jornais franceses que mais deram espaço ao interesse da Total no petróleo brasileiro ficaram devendo aos leitores argumentos menos parciais. 
 
No « Le Monde », Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura atribuía ao PT a « destruição da Petrobras ». 
 
No « Les Échos », o mesmo Pires dizia que o acordo entre Total e Petrobras iria ajudar a empresa brasileira a se reerguer. E acrescentava : « Sob o governo anterior, havia uma espécie de nacionalismo exacerbado e a empresa naufragou. Agora as coisas são diferentes ». 
 
E como. 
 
O Brasil perde em todos os campos. Em soberania e em riqueza. O petróleo deixou de ser nosso.
 
* Leneide Duarte-Plon é autora de « A tortura como arma de guerra-Da Argélia ao Brasil : Como os militares franceses exportaram os esquadrões da morte e o terrorismo de Estado » (Editora Civilização Brasileira, 2016)
 


Créditos da foto: reprodução

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